“Deus e uma mulher fizeram Jesus, os homens não têm nada a ver com Ele”
Baila no ar um cheirinho de baunilha e fim de ano – novembro está mais pra lá do que pra cá, mas não acabou ainda. Inverno aqui, verão aí, as diferenças nos unem, disse o otimista. A gente divide o guarda-roupa – leva as roupas de verão, traz as de inverno. Em junho o mundo se renova: leva as roupas de inverno, traz as de verão. Economia no bolso e no espaço dos armários.
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Assim, sem mais nem menos, homenageio as mulheres de novembro – nascidas ou morridas. O abraço ilimitado da Internet se estica a todas elas, aqui representadas por três que se destacaram no vasto panteão dos feitos humanos. As diferenças nos confundem, disse o pessimista. Quantas praças e ruas temos com nomes de mulheres? Quantas estátuas de mulheres foram erguidas em Vitória? Que me lembre, só Maria Ortiz e a Virgem Maria.
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A bela – Nascida em Viena em 9/11/1914, Hedwig Eva Maria Kiesler Lamarr já foi considerada a mulher mais bonita do mundo. Tinha que ser também uma das mais inteligentes? Durante a Segunda Guerra Mundial, ela inventou o sistema que serviu de base para os modernos telefones celulares, criando um sofisticado aparelho de interferência em rádio para despistar os radares nazistas. Em 1940 ela patenteou o aparelho, mas sua contribuição para a tecnologia moderna só agora tem sido reconhecida.
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Famosa mundialmente como Hedy Lamarr, a bela fez muitos filmes e contracenou com os maiores nomes de Hollywood. Alguém a viu em Sansão e Dalila? Dizem, não sei se é verdade ou boato, que após ser coroado imperador dos USA, Kennedy partiu para Hollywood: queria dormir com Hedy antes que ela ficasse velha. Infelizmente, a atriz matou a cientista – não lhe davam crédito por ser bonita demais. Hedy teve outras invenções no currículo, rejeitadas por serem muito avançadas para a época. Ela disse: Qualquer mulher pode ser glamorosa. Basta ficar parada, com cara de idiota.
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A iletrada. Isabella Baumfree não teve registro de nascimento, por isso seu dia é comemorado em 26 de novembro, quando faleceu. Negra, escrava, iletrada, abolicionista, ativista, feminista, brilhante oradora – sem ter frequentado escola. Isabella mudou seu nome para Sojourner Truth – tradução livre: Verdade Andarilha – e saiu pregando suas ideias nas segregadas cidades americanas. O povo viajava longas distâncias para ouvi-la, entre eles o presidente Lincoln – que não a convidou para ir à Casa Branca: foi onde ela estava. Dizem, não sei se é verdade ou boato, que levantou a blusa e mostrou os seios no famoso discurso: Não sou uma mulher? Ela disse: Deus e uma mulher fizeram Jesus, os homens não têm nada a ver com Ele.
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A cientista – Maria Salomea Skłodowska, também de Novembro, foi uma cientista polonesa naturalizada francesa e ficou conhecida com o nome do marido: Madame Curie. A primeira mulher a ganhar o Nobel, a primeira pessoa e a única mulher a ganhar o prêmio duas vezes, e a única pessoa a ganhar o prêmio com dois trabalhos científicos. O marido foi parceiro no primeiro prêmio, e eles se tornaram o primeiro casal a compartilhar a honraria – somando cinco estatuetas. Em 1906, Maria Salomea foi a primeira mulher professora da Universidade de Paris. Lindo filme no Netflix sobre sua tumultuada vida. Ela disse: Você não pode esperar construir um mundo melhor sem melhorar as pessoas. Cada um de nós deve trabalhar para o nosso próprio aprimoramento.
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Assim vamos fechando as portas de um ano triste, contando os minutos para que acabe logo. O povo aqui está pulando a tradicional decoração do Thanksgiving e espalhando às pressas nas portas e janelas as luzinhas pisca-pisca e os bonecos infláveis. Sinal inequívoco de que todos têm pressa de chegar em 2022, na esperança de que seja melhor que os dois anteriores. Millôr Fernandes: Em ciência leia sempre os livros mais novos. Em literatura, os mais velhos.