Epidemiologia orienta adiamento dos não vacinados. Assopaes pede opção de híbrido e Sedu reafirma presencial
A uma semana da data definida pelo governo de Renato Casagrande (PSB) para abertura do ano letivo de 2022 no Espírito Santo, a polêmica sobre como e quando deve se dar o retorno às salas de aula cresce entre as famílias de estudantes e a comunidade escolar como um todo.
Em sua primeira assembleia estadual do ano, a Associação dos Pais de Alunos do Espírito Santo (Assopaes) decidiu reivindicar “autonomia das famílias para optarem por aula presencial ou virtual, até que tenha segurança sanitária e com a vacinação da população em idade escolar”.
O posicionamento será enviado às secretarias municipais de Educação e às promotorias regionais do Ministério Público Estadual (MPES), por meio de ofício dos núcleos municipais da entidade. A Secretaria de Estado da Educação (Sedu) e o Centro de Apoio Operacional de Implementação das Políticas de Educação (Caope) do órgão ministerial serão oficiados pela direção estadual da Assopaes.
A posição da Associação de famílias de estudantes é semelhante à manifestada pelo O Vicariato para Ação Social da Arquidiocese de Vitória, por meio da Comissão de Promoção da Dignidade Humana (CPDH). No Manifesto em Defesa das Vidas no Estado do Espírito Santo, a CPDH defende o adiamento do retorno presencial às aulas por pelo menos quatro semanas ou até quando se atinja pelo menos 70% da população infantojuvenil imunizada com a primeira dose.
Ambas estão alinhadas com orientação feita pela doutora em Epidemiologia e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel, que também é pesquisadora da Escola de Saúde Pública de Harvard e da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos. “UTI´s pediátricas com aumento de internação em quase todo Brasil. O ideal seria o retorno das turmas acima de 12 anos já completamente vacinados e aguardar até meados de fevereiro para avaliar a diminuição das infecções pela ômicron, antes do retorno das crianças não vacinadas. E ampliar a testagem”, afirmou, em suas redes sociais na noite desta quarta-feira (26).
Em paralelo, prosseguiu, é necessário “acelerar a vacinação das crianças com campanhas educativas e exigir o comprovante de vacinação para estar nos ambientes comuns”. A cientista é taxativa: “Ou seja, a não ser que você estude isolado em seu quarto, você deve estar vacinado para frequentar a escola, um ambiente coletivo”.
Na contramão dos apelos da ciência e da sociedade civil, o secretário de Estado de Educação e presidente do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais (Consed), Vitor de Angelo, disparou em suas redes sociais a reafirmação do início do ano letivo em três de fevereiro, totalmente presencial e obrigatório.
“O governo do Estado não estuda suspender aulas presenciais nem restabelecer revezamento de alunos. O ano letivo na rede estadual está confirmado para começar dia 03/02. Porém, diariamente analisamos dados, avaliamos possíveis medidas e discutimos cenários futuros. Neste momento, o mais importante é reforçar os cuidados já conhecidos e, principalmente, vacinar-se. Os adolescentes devem completar seu esquema vacinal com a D2, e as crianças devem tomar a D1 o mais breve possível”, postou o gestor da Sedu.
O médico e neurocientista Miguel Nicolelis, considerado um dos 100 brasileiros mais influentes do mundo, também tem batido na mesma tecla desde o início da subida das curvas de casos e internações pela nova variante de preocupação no Brasil. “Como nós vamos abrir as escolas com as crianças não vacinadas? Não faz o menor sentido. Porque o número de casos vai ser tão gigantesco que infelizmente nós vamos ter professores, funcionários, pais, crianças”, alertou.
A Ômicron, lembrou, “foi identificada em 27 de novembro na África do Sul. Em menos de dois meses ela tomou conta do mundo”, alertou, em entrevista para o Brasil de Fato, destacando que a Organização Mundial de Saúde (OMS) já comparou a Ômicron com o sarampo, que é um dos vírus mais transmissíveis conhecidos pela ciência mundial.
Mencionando os recordes de internações hospitalares de crianças nos Estados Unidos e no Reino Unido e o grande crescimento também no Brasil, Nicolelis criticou fortemente o atraso para liberação da vacinação infantil contra Covid-19 por parte do Ministério da Saúde, apesar da autorização dada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Nós perdemos um mês! Poderíamos ter vacinado essas crianças antes dessa explosão da Ômicron. Esse é outro crime!”. E complementou: “Não se vence pandemia com leitos de UTI”, referindo-se ao investimento prioritário dos governos em ampliação da rede hospitalar ao invés de prevenção.
“Mas na realidade as nossas vidas têm muito pouco valor no processo decisório de se manter ou não aberta uma economia, de se fazer ou não lockdown, se vacinar ou não. Esse é o desafio da humanidade nesse momento”, ponderou. “Como nós não tivemos uma governança global pra combater a pandemia, nós temos segundo eles 31 países com menos de 10% de vacinados com a primeira dose. E esses países evidentemente vão sofrer dramaticamente e vão ser reservatórios de variantes pro resto do mundo. Nós não vamos sair dessa crise a não ser que a gente tenha o mínimo de ação coletiva. Porque nós estamos combatendo um organismo coletivo”, orientou.
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