Símbolo de sustentabilidade, fruto da Juçara é mais nutritivo que o açaí e tem grande mercado em potencial
Um movimento que já é bem estabelecido na região do Vale do Ribeira, no sul do estado de São Paulo, começa a se fortalecer também no Espírito Santo: a exploração sustentável dos frutos da palmeira juçara (Euterpe edulis). Endêmica da Mata Atlântica (só ocorre neste bioma), a espécie é parente do açaí amazônico (Euterpe oleracea) e tem um potencial imenso de geração de renda simultaneamente à proteção da biodiversidade da floresta.
Para dar mais visibilidade a essa riqueza de possibilidades sustentáveis de uso, acontece a 1ª Festa da Juçara, de 12 a 15 de maio, por meio de uma parceria entre os institutos capixabas de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) e de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) e a Prefeitura Municipal de Rio Novo do Sul.
O município, no sul do Estado, é considerado a capital capixaba da Juçara, por ter abrigado as primeiras empresas dedicadas a produzir a polpa do fruto da palmeira. A oficialização do título tramita na Assembleia Legislativa, por meio do Projeto de Lei nº 103/2021, de autoria do deputado Emilio Mameri (PSDB).
“Queremos mostrar o que pode ser feito com o fruto e que aproveitá-lo é mais vantajoso do que cortar o palmito. Podemos desenvolver muito mais a cadeia produtiva que já existe para que a polpa da juçara se torne um produto competitivo, com valor justo e sem perder o viés da sustentabilidade”, expõe a extensionista local do Incaper, Hanny Slany Pereira.
Várias iniciativas individuais e coletivas de comercialização do fruto da juçara já ocorrem no Espírito Santo há mais de uma década, o que motivou a publicação de uma Instrução Normativa do Idaf em 2013 (IN 3/2013) estabelecendo o regramento legal para a atividade, que consiste, basicamente, no preenchimento de um formulário e na realização de um plano de manejo para a atividade, ambos, com apoio do Incaper.
Mesmo ainda classificada como ameaçada de extinção, a juçara pode ter seu fruto explorado, pois esta é a forma mais eficiente de protege-la e retirá-la da lista vermelha de espécie sob risco de desaparecer. Por enquanto, no entanto, há apenas um produtor totalmente legalizado para a coleta e comercialização, em Santa Teresa, na região serrana do Estado. Foi em 2019 que Emerson Araújo de Miranda, com seu projeto Yçara Extrativista, obteve a regularização oficial.
“Precisamos tornar esse potencial mais visível para as pessoas. Tem muito produtor rural que tem juçara na sua mata e muitas vezes nem sabe que é um produto riquíssimo, um alimento puro, sem agrotóxico e muito nutritivo. Mostrar que ele pode obter renda e ainda ajudar a proteger a espécie e a floresta como um todo”, complementa Hanny.
Na capital capixaba da Juçara, por exemplo, o prefeito, Jocenei Castelari (Progressistas), já manifestou interesse em incluir o alimento na merenda escolar. “Uma empresa de Rio Novo do Sul tem produzido polpas mistas de juçara com outras frutas, como cupuaçu e morango, que têm agradado bastante”, pontua a extensionistas juçareira.
No livro “Palmeira Juçara – Patrimônio Natural da Mata Atlântica no Espírito Santo”, lançado pelo Incaper em 2017, além de informações preciosas sobre a palmeira, sua biologia, aspectos legais e econômicos, há diversas receitas de doces, geleias, pães, barras de cereal, bolos, tortas e muitas outras iguarias feitas com base no fruto da juçara.
No Festival de Rio Novo, haverá degustação de algumas dessas receitas, além de passeio ecológico, plantios, shows musicais, aulas de culinária e concurso de beleza Garota Juçara.
Rede Juçara
Precedendo o festival pioneiro, o Incaper realizou, no final de março, o 1º Seminário da Palmeira Juçara, com a participação de cerca de 120 produtores de 17 municípios, quando foi implantada a Rede Juçara-ES, sob coordenação também do Instituto.
“Pretendemos cadastrar todos os produtores e extrativistas que tenham interesse nesse tipo de atividade. A partir da legalização das áreas de coleta, podemos criar uma identidade exclusiva desse produto da polpa de juçara e colocar no mercado um produto nativo da Mata Atlântica, com preço justo e com o viés da sustentabilidade”, enfatizou a bióloga e coordenadora de Recursos Naturais do Incaper, Fabiana Gomes Ruas.
Hanny Slany Pereira ressalta que, a partir das diretrizes traçadas da Rede Juçara-ES, a polpa da juçara pode ser inserida em mercados institucionais como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Compra Direta de Alimentos (CDA).
Valor nutricional
Conforme destaca o livro do Incaper, “as similaridades entre as polpas de juçara e açaí são evidentes, apesar de o consumo do açaí ter se difundido mais rapidamente”. Calcula-se um consumo anual de 10 mil toneladas de polpa de açaí no Brasil e mais mil em países como Japão, Estados Unidos, Holanda e Itália, para onde o produto é exportado.
Estudos mostram que, assim como o primo famoso da Amazônia, os frutos da juçara também possuem rica composição de minerais, ácidos graxos e antocianinas, estes, pigmentos naturais pressentes também na uva que agem contra os radicais livres, melhorando a circulação sanguínea, protegendo o organismo contra o acúmulo de placas de gordura e retardando os sinais do envelhecimento, como perdas de memória, da coordenação motora e da visão, e ainda diminuem os efeitos do mal de Alzheimer.
“Sob alguns aspectos, o valor nutricional da juçara chega a superar o do açaí. A juçara é mais rica em alguns nutrientes minerais, como potássio, ferro e zinco. O que chama mais atenção é o teor de antocianinas que, na polpa da juçara, é cerca de quatro vezes maior do que na polpa de açaí”, destaca a publicação.