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Mobilização popular em Santa Teresa reivindica área verde doada ao Sesc

Doação, feita por Paulo Hartung, extinguiu Parque Temático Augusto Ruschi. Assembleia debate assunto nesta quinta

Um parque ecoturístico público, para lazer da população, ou um hotel privado, que não gera tributos e pode provocar danos ambientais e econômicos ao município? A pergunta é feita pelo “Movimento Salve o Parque”, mobilização popular na cidade de Santa Teresa, região serrana do Estado, e será o centro de um debate que acontece nesta quinta-feira (12) na Assembleia Legislativa, organizado pelo deputado Fabrício Gandini (Cidadania). 

O objetivo é anular a doação feita ao Sistema S pelo ex-governador Paulo Hartung em dezembro de 2010, de uma área verde de 100 mil m², onde funcionava o Parque Temático Augusto Ruschi, também conhecido como Parque Ecoturístico de Santa Teresa, para a construção de um hotel.

“Movimento Salve o Parque”

Na internet, o movimento mantém um abaixo-assinado virtual, um site de notícias e uma página no Facebook , com objetivo de levar informações à população, que, conforme alerta a coordenadora do grupo, Carmem Barcellos, tem sido bombardeada com informações a favor do hotel, mas que não correspondem à realidade. 

“A gente sente falta de uma pesquisa de impacto, porque são vários, ambientais, social e econômico. A população precisa conhecer esses impactos, para decidir com segurança”, pontua Carmem Barcellos. O “Salve o Parque” tem ambientalistas, juristas, jornalistas e professores na equipe. 

As informações até o momento, alerta, têm sido massificadas pelo Sesc, mas de forma distorcida, sem corresponder à realidade. A falta de leitos para hospedagem turística, dita pelo Sesc, ocorre apenas durante grandes eventos pontais ao longo do ano, explica Carmem. “Fora isso, os leitos existentes ficam ociosos”. O argumento de geração de postos de trabalho “também é bem relativo”, contrapõe. 

Por outro lado, a presença de um empreendimento deste porte causa problemas à estrutura já instalada na cidade, onera os serviços públicos e não gera tributos. “Não se pode esquecer que o Sesc é um empreendimento privado que não recolhe imposto, então o município não vai receber renda, mas vai ter que gastar com o lixo e o esgoto que o Sesc vai produzir. Vai sair tudo do cofre da cidade, sem a contrapartida do empreendedor. Além disso, o que a gente observa em lugares como Guarapari e Aracruz, que têm um Sesc perto da cidade, é que ele canibaliza os outros hotéis da região. Muito provavelmente vai ter uma quebradeira dos nossos empresários, restaurantes e hoteleiros, que vão deixar de gerar tributos e empregos também”, expõe a coordenadora. 

Na Justiça 

Esses e outros argumentos constam em uma ação popular impetrada em 2013 (processo nº 0002238-07.2013.8.08.0044) pelos ambientalistas Mário Camillo de Oliveira Neto, Iraci de Oliveira Lopes, Márcia Maria Ferreira de Araujo e André Ruschi, filho do cientista e Patrono da Ecologia do Brasil, Augusto Ruschi, nascido na cidade. 

A primeira decisão judicial ocorreu em no ano seguinte. Em seu despacho, o juiz da Vara Única do município, Alcemir dos Santos Pimentel, acolheu em parte os pedidos da ação, permitindo a construção do hotel, mas desde que o Sesc garantisse o acesso da população ao parque e sendo responsável por sua manutenção. O Sesc recorreu e nenhuma outra decisão foi tomada desde então. 

“O hotel não foi construído, porque faltam documentos, como Licença de Instalação e registro de transferência. Tampouco a população pode entrar no local. Eu tentei uma vez e o caseiro ameaçou chamar a polícia para me retirar dali”, conta Carmem Barcellos. 

Antidemocrática 

O movimento destaca ainda, com base em documentação levantadas ao longo dos anos, que a doação da área verde se deu no apagar das luzes do primeiro governo de Paulo Hartung, no período de festas de Natal, quando todos os poderes estão de recesso, sem qualquer discussão na Câmara de Vereadores ou Assembleia Legislativa que envolvesse os legisladores e a sociedade civil. 

Na época, ainda vigorava a doação feita em 2005 pelo governo do Estado ao município, para a implementação do Parque Temático, projeto que foi financiado pela União e prefeitura, num total de R$ 1 milhão. As obras foram feitas, mas hoje estão abandonadas, restando apenas o anfiteatro de madeira de lei. As demais foram se degradando, desde a portaria, incluindo as estufas para mudas da Mata Atlântica até a casa de inverno do governador, imóvel construído na década de 1960.

“Movimento Salve o Parque”

Não foi feita, porém, nem audiência pública nem licitação para a doação de volta para o Estado. Somente em 2018, a Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Espírito Santo (OAB-ES) organizou uma audiência pública na Câmara de Santa Teresa, da qual participaram cerca de 100 pessoas. Ao final, a entidade se comprometeu a produzir um parecer técnico para que as autoridades acompanhem e fiscalizem a construção do hotel, observando a legislação ambiental. 

Em 2010, no entanto, conta Carmem, “o que aconteceu é que Paulo Hartung chamou os vereadores para uma reunião e eles foram achando que seria uma confraternização de fim de ano e de governo, mas foram pressionados a assinar documento devolvendo a área. O vereador Dequinha Degaspari [PSB] participou dessa reunião e conta que não assinou, alegando o dinheiro federal e municipal investido”, relata Carmem. 

“Eu fui até a Câmara pedir os documentos que comprovassem alguma sessão em que a doação foi assinada. Não existe”, indigna-se. “É no mínimo uma atitude antidemocrática, a população não foi ouvida”, reforça.

A coordenadora acrescenta ainda que, pouco antes da fatídica reunião com os vereadores, em outubro de 2010, foi anunciada a conclusão das obras do parque, mas ele só seria inaugurado em 2012. “Acho que forjaram essa inauguração só para prestar contas do investimento federal. Mas o parque praticamente não foi utilizado. Houve algumas visitas de escola, nada mais”, lamenta. 

No abaixo-assinado, os populares ressaltam que a cidade não possui um parque natural urbano público para seu lazer, prática de exercícios e realização de eventos, uma carência importante dos munícipes. 

“O Parque Ecoturístico não poderia ter sido tirado do povo e doado para um sistema tão rico para construção de um hotel sem audiência pública (…) Existem áreas mais afastadas do centro urbano que podem atender perfeitamente ao hotel e poupar o município de impactos sociais, estruturais e econômicos que um hotel como o Senac pode causar, indiretamente, ao desenvolvimento do cidadão e manutenção de tantos outros pequenos empreendimentos do setor hoteleiro que investiram décadas no município”, argumenta a petição online.

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