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Código de Defesa do Contribuinte facilita lavagem de dinheiro, diz auditor fiscal

Projeto apresentado por Felipe Rigoni (foto) gerou polêmica entre os auditores fiscais da Receita Federal

O auditor fiscal da Receita Federal José Henrique Mauri, presidente da Delegacia do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) no Espírito Santo, classificou como um elemento “coberto com pele de cordeiro em um corpo de lobo” o Projeto de Lei Complementar (PLP) 17/22, apresentado pelo deputado Felipe Rigoni (União), que institui um Código de Defesa dos Contribuintes, em tramitação na Câmara dos Deputados, em regime de urgência. 

Luis Macedo/Ag.Câmara

Se aprovado, diz o auditor, a Receita perderá força, enquanto o contrabando de armas, o tráfico de drogas e a lavagem de dinheiro ganharão maior facilitação. A proposta, que conta com o apoio de 31 parlamentares, pretende reduzir a disparidade existente entre os contribuintes e o Fisco, estabelecendo regras gerais sobre os direitos e garantias do contribuinte e deveres da Fazenda Pública.

O assunto é objeto de ações do Sindifisco, tanto em nível nacional como nos estados. No Espírito Santo, os auditores fiscais pretendem debater o tema com os deputados federais, conforme ficou acertado nesta terça-feira (31), em data ainda a ser definida.

Mauri afirma que “o problema é que o projeto insere objetivos escusos, que podem levar à descaracterização da própria Receita, assim como ocorreu, recentemente, na Polícia Federal e na magistratura”.

Ele explica que há tempos foram feitas pelos próprios auditores várias tentativas de reavaliar pontos crítico da legislação, mas os projetos não receberam o apoio necessário. “Nós tivemos várias tentativas lá atrás de um projeto desse nível, focado em pontos críticos que estão por trás desse projeto. Não seguiu para frente nem teve o aval e corpo que esse tem, porque exatamente ele traz um perigo para a estrutura de estado”.

Mauri lembra a frase do deputado federal Arthur Lyra (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, “Nós precisamos coibir e acaba com abusos”, ao destacar que esse contexto gerou um clima positivo para a aprovação do projeto. “Eu enxergo que isso não é por acaso. É um trabalho de longa data em que se conseguiu construir algo interessante que houvesse um apelo social que engajasse inclusive parlamentares como o próprio Rigoni, por exemplo, que achou interessante para ser o autor, e também uma variedade de trinta e poucos parlamentares que permitiu essa visão. O problema é que há objetivos escusos por trás”.

Para o auditor, o projeto é parte de um problema fiscal e traz no foco a descaracterização da própria Receita. “Sim, nós estamos trabalhando em nosso sindicato para que sejam eliminados eventuais abusos. Ocorrendo, os abusos têm que ser atacados e eliminados, e se precisar mexer em legislação, isso tem que ser feito; o abuso é uma exceção e não pode ser combatido com uma regra geral”.

O que esse projeto traz para combater os eventuais abusos são regras que têm que ser eliminadas, mas isso não pode ser resolvido “atacando o corpo; eu não posso tratar um dedo ferido cortando o braço”, comenta. E complementa: “Eu queria fazer um histórico do trabalho da Receita porque é de suma importância enquanto estado e eu não estou falando da Receita como corporação, mas como estado. Nos últimos 15 a 20 anos, com a abertura do comércio exterior, principalmente, tivemos uma demanda crescente e a Receita tem papel fundamental nesse controle”.

Ressalta Mauri que esse crescimento e a globalização geraram, também, um crescimento do tráfico internacional, seja de drogas ou de armas, e por trás disso tudo, há uma demanda maior de lavagem de dinheiro. “Nos últimos 15 anos depois dessa abertura, começou um problema mundial e organismos internacionais cobraram do segmento ações e legislações que combatessem lavagem de dinheiro e o tráfico, e o Brasil começou a formar legislações e, indiscutivelmente, boa parte dessas legislações acabam nas atividades da Receita”.

O auditor afirma que a lavagem de dinheiro é uma consequência de dois fatos: o contrabando e a sonegação, ou seja, a “pessoa exporta ou importa pagando mais ou menos, e de outro lado, trata-se de armas e drogas. Esses dois elementos têm por trás outra demanda, que é a lavagem do dinheiro que foi gerada ali. A Receita foi aparelhada pela legislação no decorrer dos anos exatamente para atacar esses pontos”.

Hoje, afirma Mauri, a Receita tem o controle da entrada e saída de todas as mercadorias para que não entre as ilícitas e, ao mesmo tempo, sabe a movimentação potencial financeira. “Receita foi aparelhada então nos últimos 10 anos para combater a lavagem de dinheiro e o resultado foi muito superior ao esperado, porque ela já tem o acesso às origens que geram a demanda. Já tinha o controle da mercadoria e agora passou a ter também da parte financeira”.

Essa estrutura impede os chamados crimes de colarinho branco e Mauri explica, por exemplo, que a “Receita tem apreensões de cocaína mais do que todos os outros órgãos”, porque possui a forma de pegar a turma de bandidos de colarinho branco, pelo dinheiro”.

O modelo da Requisição de Movimentação Financeira (RMF), pelo qual a receita vai ao banco de uma pessoa ou empresa em procedimento investigatório, levanta informações daqueles que se recusam a fornecê-las voluntariamente, o que impede a proliferação de ilícitos. Para ele, ao buscar eliminar regras, o projeto deveria ser chamado de “código de defesa do sonegador”. Os “abusos”, segundo ele, devem ser apurados com rigor, com a punição dos culpados sem, no entanto, favorecer a prática de crimes.

O projeto deixa claro que a lógica do sistema tributário brasileiro é privilegiar o Estado em detrimento do contribuinte, que é quem o sustenta. “O que se pretende não é inverter essa lógica, apenas repará-la, com vistas à coibição de abusos e retoques e inserções pontuais em nossas normas”, defende Felipe Rigoni, autor da proposta.

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