Na Câmara de Vitória, mãe de ciclista atropelada denuncia falta de apoio do poder público
“Em nenhum momento, eu fui chamada por ninguém, nem pelo Detran [Departamento Estadual de Trânsito]. Ninguém me perguntou se eu precisava de alguma coisa, se eu precisava de um atendimento psicológico. Nós, familiares, ficamos desamparados, desorientados”. A fala é da professora Adriani da Silva, mãe da ciclista Luisa Lopes, morta após ser atropelada na avenida Dante Michelini, em Vitória, no dia 15 de abril.
Adriani foi uma das participantes da audiência pública realizada nessa segunda-feira (30), na Câmara de Vitória, para debater o trânsito na Capital. Ela criticou a falta de apoio do poder público. “Eu ainda consigo pagar o plano de saúde, deixo algumas coisas por serem feitas e consigo ir no psicólogo, no psiquiatra, mas ninguém me procurou”, reiterou.
Após 45 dias da morte da filha, Adriani pediu justiça e questionou a assistência dada em casos de vítimas que ficam com sequelas após acidentes. A mãe também critica a morosidade na apuração do caso de Luisa. “Já não chega o ente querido, que foi minha filha, que eu perdi, e ainda tem esse processo que está na mão da Justiça. E que justiça é essa? Eu espero que seja feita a justiça”, cobrou.
Durante a sessão, Adriani lembrou que Luisa faria 25 anos em junho, enfatizando que a jovem era cheia de sonhos. “A última frase dela, me ligou e disse: ‘quando eu voltar, a gente termina a conversa” e essa conversa não foi terminada, porque houve um assassinato, porque aquilo que aconteceu ali na Dante Michelini não foi um acidente, foi um crime”, denunciou. Luisa foi atropela no dia 15 de abril, pela motorista Adriana Felisberto Pereira, que em vídeo após o ocorrido, apresentava sinais de embriaguez.
Hudson Ribeiro, integrante do Coletivo Pedalamente, denunciou as tentativas de culpabilização da própria Luisa pelo atropelamento. “Eu acho que o trabalho que a Prefeitura Municipal fez foi criminoso, de botar na mídia um vídeo completamente desestruturado, que você não consegue entender nada. Tiveram o trabalho de emitir um parecer técnico para praticamente falar isso: que a Luisa foi responsável pela própria morte”, declarou.
Ausência de políticas
A audiência foi promovida pela vereadora Camila Valadão (Psol) e também contou com a participação do presidente do Detran-ES, Harlen da Silva; da representante do Fórum de Famílias Vítimas do Trânsito, Patricia Rufino; da integrante do Coletivo Pedalamente, Yasmin Rodrighes; e do assessor Nelson Soares, representando o senador Fabiano Contarato (PT).
Patrícia Rufino defendeu a busca ativa das famílias de vítimas do trânsito, além de criticar a desatualização dos dados sobre os índices de acidentes no trânsito. “Os dados não estão atualizados por quê? Única e exclusivamente para que se apague a memória, porque política pública só se faz em cima de dados. Então, se você não tem a memória, você não sabe qual é o alcance do que precisa implementar”, declarou.
A mobilizadora também destacou a necessidade de uma rede de educação sobre o trânsito em Vitória. “Nós precisamos pensar o que queremos para educar a cidade. Quando a gente fala de mobilidade urbana, estamos falando de educação, um currículo mínimo para que se tenha a competência do que fazer, tanto pedestres quanto ciclistas e pessoas motorizadas”, aponta.
Ao longo da audiência, algumas demandas foram apresentadas pela vereadora Camila Valadão (Psol), como a instalação de redutores de velocidade e a necessidade de ampliação do projeto Bike Vitória, destinado ao compartilhamento de bicicletas. Ela também citou a desmobilização do comitê intergestor do projeto Vida no Trânsito, voltado para a redução dos números de acidentes, além da falta de informações sobre o Plano Municipal de Mobilidade Urbana.
“Nós fizemos um requerimento de informação para a prefeitura e a resposta foi que em maio do ano passado eles tiveram uma reunião e estavam reformulando o termo de referência para contratação de empresa especializada para elaboração do plano de mobilidade. Então, pelo que consta na nossa assessoria, nós não vimos nada no Diário Oficial”, disse a vereadora.
O presidente do Detran, Harlen da Silva, criticou o atraso na elaboração do plano em Vitória. “A cidade, para ser organizada, parte do seu Plano Diretor Municipal (PDM). O Plano de Mobilidade Urbana complementa o PDM. Então é necessário que se tenha prioridade, que tracem os objetivos, para onde essa cidade quer ir, em termos de mobilidade”, declarou.
Sobre o apoio às famílias das vítimas, Harlen afirmou que o Detran até tem o serviço de atendimento psicológico, mas o programa é mal divulgado. O presidente falou também sobre o programa Madrugada Viva, que faz a fiscalização nas vias, e ele pretende retomar. “Infelizmente, muitos ainda só aprendem pela coerção, pela fiscalização. Não deveria ser assim (…) Hoje ainda não temos uma educação para o trânsito integrada”, declarou.
Também integrante do Coletivo Pedalamente, Yasmin Rodrighes relatou o nome das vítimas do trânsito de Vitória nos últimos anos, denunciando a falta de políticas públicas eficientes e democráticas.
“A pergunta que fica é: para quem é feita a mobilidade urbana da nossa cidade? O que a gente vê é que nada tem sido feito, as pessoas continuam morrendo, os nossos continuam perdendo a vida, são assassinados no trânsito. Infelizmente, se a gente não está na briga, na luta, vira estatística e nada muda”, enfatizou.