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Com apoio de professores, adolescente autista torna-se campeão de atletismo

Maurício sofria bullying. Professor de Educação Especial só foi conquistado com ação da Defensoria Pública

Arquivo pessoal

Um adolescente autista, desacreditado pelos professores, que já não tinha mais ânimo para frequentar a escola, recupera a alegria de estudar e torna-se campeão de atletismo. Uma frase que resume a trajetória escolar recente de Maurício da Silva Rocha Filho, estudante do oitavo ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Divinópolis Pastor Oliveira de Araújo, em Divinópolis, na Serra. 

“Até o início do ano ele não queria ir para escola, sofria bullying, alguns profissionais diziam que era falta de vergonha na cara, mesmo com laudo”, relata, com pesar, a mãe de Maurício, Rosenilda de Jesus Souza. 

A transformação, ressalta, aconteceu com a entrada de uma equipe pedagógica completa, que lhe é de direito, e um projeto de atletismo realizado por um professor dedicado a incentivar os alunos que demonstram interesse no esporte. “Esse ano é que entraram esses professores maravilhosos, que foi o de Educação Especial, que conseguimos na Defensoria Pública, e o de Educação Física, que olharam para ele com outros olhos”, celebra. 

Rosenilda conta que, mesmo com laudo médico, ela não conseguia um professor especializado para seu filho. Foi somente com a ação da Defensoria Pública que o profissional foi contratado, isso um pouco antes da pandemia de Covid-19. Em 2020 e 2021, o ensino tornou-se remoto para ele e, reconhece a mãe, foi bem difícil. Este ano, mesmo com a garantia do professor de EE, Maurício estava desanimado, com receio de sofrer as mesmas violências que sempre o acompanharam na escola. “Ele estava muito arredio, sem uma pessoa para acompanhar na escola, ele não conseguiria”. 

O professor de EE, Vanderson Antônio dos Santos, foi designado para atender exclusivamente ao Maurício e conta que nutre expectativas elevadas para o adolescente, junto com o colega da Educação Física, Sérgio Luiz Pozzatti Junior. “Através do nosso trabalho, verificamos que ele adora o atletismo. Ele não tinha tido contato com o esporte ainda e já é campeão. Temos planos de torna-lo um verdadeiro campeão”.

Arquivo pessoal

Aprendizado mútuo

Nesses meses de convivência, Vanderson observa que Maurício “é bem assistido pela família”, o que é fundamental para o trabalho que se dedica a realizar. “É um trabalho bonito que eu estou realizando. Ele é um menino atencioso, carinhoso, que está fazendo diferença na minha vida também. É uma troca, é mútuo. Eu também adquiro uma nova visão do mundo através do Maurício”, declara. 

“O autista é geralmente muito reservado, mas o Maurício é bem comunicativo. Falo com ele: ‘pede licença antes de entrar na sala’, e ele fala. Na saída da escola, a mesma coisa. Aprendi a perceber quando ele muda de humor, fica mais arredio, e eu tenho que saber como contornar a situação. Quando ele está bravo, deixo ele andando, fico observando de longe, sem ele perceber”, ensina. 

“Para além dos muros da escola”

Responsável pelo treinamento de Maurício no atletismo, Sergio conta que, na EMEF Divinópolis, sua aposta foi em adaptar uma iniciativa que ele já havia realizado em outros municípios, chamada “Para além dos muros da escola, com atletismo”, para o formato de disciplina eletiva disponibilizada pelo turno integral da escola serrana. 

A procura foi grande e foi preciso fazer uma seletiva dos alunos interessados, já com algumas provas da modalidade atletismo. O entusiasmo e bom desempenho rápido de Maurício levaram o professor a retribui, com dedicação especial. “Devido ao curto prazo de tempo e para dar maior possibilidade dele se classificar para o Brasileiro, eu abri mão de alguns dos meus planejamentos para treiná-lo. Sempre tive uma conversa franca com ele sobre as regras do esporte e do campeonato e sobre como ele poderia treinar comigo”, conta. 

O resultado impressionou: quatro medalhas nos Jogos Paralímpicos do Espírito Santo – um ouro no Salto em Distância, duas pratas no Arremesso de Peso, e um bronze em Salto em Distância; além também um 4° Lugar na corrida de 80 metros – e a conquista de uma vaga para a Regional III dos Jogos Escolares Paralímpicos, que ocorrerá em São Paulo nos dias cinco a dez de setembro, havendo também a possibilidade de competir na etapa nacional, no Rio de Janeiro, entre 29 de outubro e cinco de novembro.

Para a EMEF Divinópolis, o projeto de Sérgio rendeu ainda o título de campeã municipal geral de atletismo, com 132 pontos.

Arquivo pessoal

Mais apoio

Em suas redes sociais, o Coletivo Mães Eficientes Somos Nós, do qual Rosenilda faz parte, comemorou a virada positiva na vida de Mauricio, cobrando mais atenção do poder público para as crianças e adolescentes com deficiência. “Ele nunca havia tido contato com esse tipo de esporte e a escola não tem sequer um local adequado para os estudantes treinarem, e ele conseguiu essa proeza. Imaginem se este estudante tivesse um suporte adequado?”, reivindica o Coletivo. 

Mais apoio do Estado para a educação de crianças e adolescentes com deficiência também é demandado por Sérgio. “Eu estou muito satisfeito com o desempenho de todos os meus alunos, com a confiança dos pais para com o meu trabalho e com a gestão escolar, pelo apoio. Mas ainda precisa ser revista a disponibilidade de carga horária de trabalho, com intuito de treinar os alunos em futuras competições”, pondera. 

Vaga para acompanhante

Apoio é necessário também para garantir um acompanhante para Maurício, no campeonato do Rio de Janeiro. A mãe do adolescente diz que está fazendo tudo o que é possível para que o filho possa continuar competindo e se desenvolvendo no esporte, mas sabe que, “sozinho, ele não vai conseguir”. Diante da falta de vaga, ela lamenta. “Eu conheço, sei as crises que ele tem. Se ele ficar nervoso, der um ataque, não vão saber lidar com ele”. 

A disponibilidade inicial oferecida pela Confederação Brasileiro de Desportos para Deficientes Intelectuais (CBDI), explica o professor Sergio não inclui o acompanhante de Maurício. A equipe máxima é de sete pessoas e foram priorizados atletas que precisam de ajuda para necessidades fisiológicas, como caminhar e alimentar. “Eu já solicitei um acompanhante para o Maurício também e aguardo caso haja alguma desistência. Porém só saberemos no dia 30 de junho”, diz, citando ainda a Secretaria Estadual de Estado de Esportes e Lazer (Sesport) como fonte de informações e possíveis pedidos de apoio.

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