Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022 mostram que os casos de lesão corporal dolosa lideram as violências sofridas pela comunidade LGBT no Espírito Santo. Em 2020, foram registradas 150 ocorrências desse tipo no Estado. Esse número aumentou para 181 no ano seguinte. Já os de homicídio doloso ocorridos em 2020 correspondem a seis, tendo redução de 50% em 2021. Os casos de estupro em 2020 foram 12 e, em 2021, 11.
O presidente do Conselho Estadual LGBT, João Lucas de Sousa, acredita que os dados podem estar subestimados. Nos casos de estupro, ele destaca o sentimento de vergonha, que faz com que as vítimas não denunciem, bem como situações inibidoras, como o comportamento do Judiciário, que muitas vezes “é punitivista com a vítima”. Quanto aos homicídios dolosos, João Lucas aponta que, em diversos casos, as investigações são conduzidas no sentido de tratar o crime sem que ele esteja ligado às questões de gênero e sexualidade.
Conforme consta no Anuário, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o Espírito Santo perde somente para uma unidade federativa em casos de lesão corporal dolosa. Esse estado é Pernambuco, com 604 casos. Em 2021, ficou em terceiro lugar, atrás de Pernambuco (652) e Goiás (368). Entretanto, é preciso levar em consideração que muitos estados não disponibilizaram seus dados referentes aos dois anos. São eles: Acre, Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo. Ceará e Paraíba disponibilizaram informações somente de 2021.
No quesito homicídio doloso, o Espírito Santo, em 2020, ficou em nono lugar, atrás de Pernambuco (47), Ceará (27), Alagoas (18), Paraíba (14), Pará (9), Paraná (9), Mato Grosso (8) e Rio Grande do Norte (7). Em 2021, em 13º, perdendo para Bahia (33), Pernambuco (28), Goiás (19), Alagoas (16), Amazonas (14), Paraná (14), Rio Grande do Norte (10), Maranhão (8), Mato Grosso do Sul (6), Paraíba (6), Sergipe (6) e Pará (5). Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Roraima e São Paulo não disponibilizaram os dados de 2020 e 2021.
Nas ocorrências de estupro, em 2020 o Espírito Santo ficou atrás de Pernambuco, que teve 49 casos registrados. Em 2021, atrás de Pernambuco (55), Goiás (27), Ceará (25) e Paraná (15). Os estados do Acre, Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo não disponibilizaram os dados de 2020 e 2021. Ceará e Paraíba, os de 2020. Roraima não disponibilizou os de 2021.
Diante do grande número de unidades federativas que não divulgaram os dados, o Anuário constata que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) “de reconhecer homofobia e transfobia como parte das hipóteses punidas pelo crime de racismo não gerou ainda os devidos impactos no que diz respeito à produção, à sistematização e à publicização de dados”.
O Anuário aponta que “há pouco interesse político-institucional de produzir dados, tendo em vista que a produção de dados é um dos primeiros passos para o enfrentamento de um problema social qualquer, de enfrentar violências simbólicas, discursivas e físicas contra LGBTQI+ por parte das polícias”.
O documento salienta que “o descaso com a produção de dados referentes às populações LGBTQI+ reflete a historicidade das relações entre elas e as polícias no passado, marcadas pela percepção conservadora das identidades dissidentes da cisheteronorma enquanto desestabilizadoras da ordem estabelecida em torno da ‘família tradicional’, da ‘moral e dos bons costumes'”.
O Anuário prossegue destacando que “também explicita a deslegitimação da promoção dos direitos dessa população enquanto parte integrante do trabalho da polícia, que implica também na imposição de barreiras que vão desde o atendimento às vítimas, ao registro (ambos marcados muitas das vezes, por revitimização, violência simbólica e psicológica) e à investigação de casos de violência LGBTfóbica” .