Sindicato capixaba integra mobilização nacional contra o PL, que tramita no Senado, após aprovação na Câmara
O Espírito Santo integra a mobilização nacional contra o Projeto de Lei nº 1.293/2021, que dispõe sobre a inspeção e fiscalização de frigoríferos no Brasil. A campanha envolve sindicatos e ONGs em defesa do bem-estar animal, com objetivo de não permitir que o projeto seja sancionado da forma como está, sob o risco de fragilizar ainda mais a atividade, já bastante comprometida pela vacância de servidores públicos, incorrendo em riscos à saúde dos consumidores e no aprofundamento de técnicas contrárias ao bem-estar animal.
“Todos os estados estão mobilizados, porque se aprovar o PL nacional, cria jurisprudência para aprovar nos estados também”, alerta Isidorio Nascimento Simões, presidente do Sindicato dos Fiscais Estaduais Agropecuários do Espírito Santo (Sinfagres), destacando que a proposta ataca a fiscalização da carne consumida internamente, sem alterar a legislação que rege o controle da carne exportada. “O PL ataca diretamente as atribuições da defesa agropecuária, retirando a responsabilidade da defesa agropecuária, que é do setor público, e a transferindo para o privado”.
Isidorio menciona uma metáfora feita por colegas fiscais de outros estados com o trânsito, para explicar o absurdo da proposta: “É como se você, ao furar o sinal vermelho, sabendo que está errado, parasse o carro para chamar um guarda e pedir para ser multado”.
Um dos sindicatos mais atuantes na mobilização é o do Maranhão, que publicou nessa quinta-feira (21) um artigo assinado pelo diretor de comunicação e relações públicas do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical), Antonio Araujo Andrade Junior.
No texto, o autor afirma que, apesar de conhecido como “PL do Autocontrole”, o projeto “em verdade pouco traz sobre autocontrole”, e “quase todo trata de redução de mecanismos de fiscalização do Estado e da ampliação desmedida das atribuições da inciativa privada em defesa agropecuária”.
“O autocontrole, restrito àquela pequena fração do conteúdo do Projeto de Lei, e por sinal a menos polêmica, assim como a participação da iniciativa privada nas ações de defesa agropecuária, são bem-vindas e já estão em regulamentos e na rotina da defesa agropecuária. No PL, o autocontrole foi usado como pretexto, somente para dar passagem a uma boiada”, expõe.
Em Nota Técnica publicada em maio, o Anffa Sindical propõe emendas para corrigir as falhas. “O sindicato nacional não é contra o projeto, mas contra os gatilhos que ele tem para disparar a fragilização da atividade de fiscalização e inspeção”, explica o presidente do Sinfagres.
Déficit de profissionais
Já a Organização Não Governamental (ONG) Animal Equality defende a extinção do PL e lançou uma petição online nesse sentido. Uma investigação feita em matadouros brasileiros pela entidade e publicado pela Anffa Sindical mostrou que existem hoje pouco mais de 2,5 mil fiscais federais agropecuários na ativa no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), uma redução de 37,3% se comparado com o ano 2000. No mesmo período, as exportações de carne bovina aumentaram 462%. A estimativa da ONG é que haja um déficit de 1.620 fiscais federais no país.
O estudo exemplifica o norte do Paraná, onde há apenas um profissional do Ministério da Agricultura para fiscalizar 60 municípios. Ainda segundo o estudo, mesmo em abatedouros que possuem algum tipo de inspeção, diversos não respeitam o bem-estar animal e as condições sanitárias estabelecidas pelo Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (Riispoa).
Sem dados consolidados, a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) estima que o abate clandestino chegue a 50% em algumas regiões do país, devido à falta de fiscalização. Na denúncia, a Animal Equality afirma que “se dependesse exclusivamente dele [setor privado], nem fiscalização teria.
O PL já foi aprovado na Câmara dos Deputados. No Senado, está com uma consulta pública online ativa, mas segundo o presidente do sindicato capixaba, teve tramitação suspensa quando a consulta pública passou a apresentar balanço negativo para a aprovação. “O ‘sim’ começou ganhando, mas quando os estados entraram na mobilização, o ‘não’ ultrapassou em disparada. Daí suspenderam a previsão de votação, dizendo que é preciso fazer mais discussões antes de votar”, conta.
Vitória estadual
Uma lei semelhante à que tramita no Congresso chegou a ser aprovada no Espírito Santo em 2017, no governo de Paulo Hartung. Na época, o governo federal, ao contrário do capixaba, acabava de assinar um novo Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (Rispoa), atendendo a pedidos da categoria e em resposta à Operação Carne Fraca, deflagrada pela Polícia Federal em 2017, que encontrou provas de corrupção que permitia adulteração da carne vendida em gigantes do setor, como a JBS e a BRF.
O Sinfagres judicializou o caso e, em dezembro de 2018, o Pleno do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES) decidiu em favor da categoria, julgando procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) – n° 0022483-35.2017.8.08.0000 – movida pelo Ministério Público Estadual (MPES) contra a lei de terceirização da inspeção animal (Lei n° 10.541, de 17/06/2016).
Relatada pelo desembargador Namyr Carlos de Souza Filho, a decisão unânime do colegiado declarou ser inconstitucional a prática em que o serviço de inspeção animal é feito por profissionais contratados no mercado diretamente pelos frigoríficos inspecionados.
Em 2021, Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) promoveu concurso público para o cargo e, há cerca de dois meses, 15 médicos -veterinários aprovados no certame passaram a assumir seus postos em diversas regiões do Estado.