Gajupoc vai defender a luta de movimentos sociais e populações marginalizadas, ressalta Josilene Santos
O Espírito Santo está vendo nascer a sua primeira iniciativa de assessoramento jurídico voltado aos movimentos sociais e populações marginalizadas. A exemplo de iniciativas semelhantes em outros estados e em âmbito nacional, o Grupo de Assessoria Jurídica Popular Capixaba (Gajupoc) surge em meio a um contexto de lutas coletivas, onde o acesso digno à Justiça é uma lacuna por onde direitos fundamentais – humanos, sociais, ambientais etc. – escoam pela ação predatória de grupos econômicos poderosos e também do próprio Estado.
O Gajupoc já realizou duas plenárias presenciais, a última neste sábado (23), na sede do Sindicato dos Petroleiros (Sindipetro/ES), onde mais de uma dezena de entidades e organizações sociais se reuniram e apontaram as possíveis comissões temáticas e ações prioritárias a serem empreendidas pelo Grupo.
Além do Sindipetro/ES, também já foram seladas parcerias com a Paróquia Santa Teresa de Calcutá, Associação dos Defensores Públicos do Espírito Santo (Adepes), Federação dos Órgãos para Assistência Social e Jurídica (Fase), Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), Movimento Negro Unificado (MNU), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Círculo Palmarino, Frente Estadual pelo Desencarceramento do Espírito Santo (Desencarcera ES), Comissão Quilombola do Sapê do Norte, Associação Brasileira dos Juristas pela Democracia (ABJD) e Rede Nacional de Advogados Populares (Renap).
“A Defensoria e o Ministério Público não conseguem contemplar todos os coletivos e movimentos sociais, devido ao número reduzido de defensores, promotores e procuradores. É nesse sentido que a assessoria popular vem dar apoio e suporte, auxiliando esse trabalho. Temos defensores públicos como parceiros, atuando na educação jurídica popular”, expõe a advogada popular quilombola Josilene Souza dos Santos, responsável pela Coordenação de Assistência Jurídica do Gajupoc.
Entre as comissões temáticas já alinhavadas, estão as de Comunidades tradicionais e povos originários; Criminal; Moradia; Povos do Campo; e Direito Ambiental. “Estamos abertos para que outros movimentos se manifestem e nos procurem”, ressalta Josilene, citando diálogos já iniciados com organizações como o Mães Eficientes Somos Nós (MESN) e o Programa de Extensão Formação em Dança da Universidade Federal do Espírito Santo (Fordan/Ufes).
“Entre iguais”
Liderança do MNU e presidenta do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Cepir-ES), Fátima Tolentino da Silva comemora a iniciativa pioneira no Espírito Santo. “Esse grupo jurídico popular tem uma Importância muito grande. Temos que divulgar a existência dele para a população e trabalhar com resultados”, conclama.
Assistente social com especialização em igualdade racial, ex-conselheira tutelar e ex-educadora social, Fátima explica que há uma falta generalizada de políticas públicas para o povo pobre e periférico. “Educação, saúde, moradia … é o poder público que mais viola esses direitos, é uma falta de assistência muito grande. Por isso a gente se emociona quando vê um projeto que pode possibilitar, na verdade, que vai possibilitar, porque eu acredito nisso, que vai possibilitar dias melhores para a nossa população pobre, explana”.
Hoje, afirma, “a gente não tem a quem procurar”. Ecoando a percepção de Josilene Santos, Fátima Tolentino lamenta que a Defensoria e o Ministério Público não deem conta de defender os mais pobres e oprimidos e ressalta um pleito feito ao governador Renato Casagrande (PSB) pelo MNU, de criação de uma Ouvidoria Estadual para receber as denúncias de violações múltiplas de direitos.
“Quando tomba um jovem preto, todas as mães pretas e pobres sofrem juntas e elas têm medo de continuar os processos de investigação sobre os culpados, principalmente quando a bala é da polícia. Elas têm medo. Dos casos de morte de jovens negros já registrados, veja lá quantos processos estão em andamento, quantos foram solucionados? Quase nada. ‘Ah, matou um menino ali’, se é preto, é pobre, a sociedade logo fala que era criminoso, bandido. Porém aquele corpo tem uma mãe, tem um pai, tem uma família, tem um filho, tem esposa … Por isso é importante uma assessoria jurídica popular, porque quando a gente diz ‘popular’ a gente está fala em segurança, porque estamos ‘entre iguais’, como se diz. Sabemos que podemos confiar, que a defesa dos nossos direitos vai ser levada a sério. Isso é muito importante”.