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​’Refugiados venezuelanos precisam de abrigo e alimentação adequada’

Militantes dos direitos humanos acompanham situação do grupo, que foi encaminhado para o Centro Pop de Vitória

Vanessa Darmani

Vinte e cinco venezuelanos da etnia Warao, que foram abandonados pela prefeitura de Teixeira de Freitas (BA) na rodoviária de Vitória, nessa terça-feira (16), estão no Centro Pop. Entretanto, militantes dos direitos humanos alertam que o local não é o ideal para o grupo, uma vez que não é um espaço de abrigamento, mas sim para atividades da população em situação de rua durante o dia. Outro problema, destacam, é a má alimentação, uma vez que são oferecidos alimentos que os Warao não têm hábito de comer.

O advogado e militante de direitos humanos, André Moreira, que tem acompanhado a situação junto com Brunela Vicenzi, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e representante da Organização das Nações Unidas (ONU) para refugiados no Estado, informa que eles têm se alimentado com pão com mortadela. Porém, na cultura dos Warao, não se come carne vermelha, por isso, devido ao fato de não terem o hábito de comer esse tipo de alimento, eles estão passando mal, inclusive as crianças.

Leonardo Sá

André defende que os Warao sejam encaminhados para um abrigo ou para o aluguel social, em um espaço no qual possam ficar juntos, para que não haja separação. Ele alerta que o grupo é de responsabilidade não somente da Prefeitura de Vitória, mas também dos governos do Estado e Federal, uma vez que o Brasil assinou tratados internacionais sobre o acolhimento aos refugiados. André acrescenta que eles não são ilegais, uma vez que já solicitaram o pedido de refúgio à Polícia Federal, aguardando o visto de permanência.

O advogado salienta, ainda, que o encaminhamento ao Centro Pop foi feito após pressão popular. O Vicariato para Ação Social, Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória, por meio da Pastoral do Migrante, também buscou diálogo com a gestão de Lorenzo Pazolini (Republicanos) para que alguma providência fosse tomada.


A Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES), por meio do Núcleo de Direitos Humanos, recomendou, nessa terça-feira (16), que a prefeitura providenciasse abrigo, alimentação e atendimento médico. Também pediu que apresentasse, com urgência, um plano de atuação que contemple o cadastramento das pessoas, assistência social e médica, vacinação, alimentação, vestuário e abrigo, além de garantir a integridade física das famílias por meio da atuação da Guarda Municipal. A recomendação levou em consideração, entre outros fatos, a possibilidade de chegada de mais cerca de 21 refugiados venezuelanos da Bahia na próxima sexta-feira (19), e a previsão de frente fria.
 

Reprodução/Redes Sociais

Não é a primeira vez que um grupo de indígenas Warao chega ao Espírito Santo. Em 2021, um grupo de 40 deles se fixou na Serra após terem saído da Venezuela em 2019, passando por vários estados brasileiros, tendo se fixado em João Pessoa (PB) por um tempo e passado por Guarapari. Ao todo, eram sete famílias, com 14 adultos, incluindo uma grávida, e um grande grupo de 26 crianças. Eles chegaram a ser acolhidos no Centro de Convivência do Idoso, em Serra Sede, em junho, e foram embora em outubro.

O povo Warao é composto por quase 50 mil pessoas originárias da região do delta do Rio Orinoco, no nordeste da Venezuela, onde habitam há pelo menos oito mil anos. São a segunda etnia mais populosa do país. Tendo como principal ponto de entrada a cidade fronteiriça de Pacaraima (RR), grupos Warao que haviam se estabelecido pela região Norte têm feito longos deslocamentos pelo Brasil, estando hoje presentes em dezenas de municípios nas cinco regiões do país.

Apesar disso, não são grupos tradicionalmente nômades, como muitas vezes se supõe por parte de brasileiros. Na verdade, seus deslocamentos se dão na busca de melhores condições de vida diante dos impactos causados por atores externos em seus territórios tradicionais.

Warao significa “povo da canoa” e sua cultura está fortemente ligada às águas. Habitam originariamente áreas rurais nas margens do rio e moram em pequenas comunidades onde se deslocam e pescam em canoas. Além de exímios pescadores, tradicionalmente também se sustentam da agricultura, caça e coleta, e possuem língua e medicina tradicional.

Os projetos desenvolvimentistas na Venezuela, porém, levam a tensões que provocaram expulsão e fuga dos territórios tradicionais. O primeiro grande fluxo migratório se deu a partir da década de 1960, com a implantação de projetos agrícolas de não-indígenas na região, conhecida pela grande fertilidade do solo e biodiversidade. Naquele momento, os Warao migram sobretudo para as grandes cidades venezuelanas. Atualmente, diante da difícil condição interna em todo o Brasil, país vizinhos têm sido uma das principais alternativas na busca de um novo local.

A onda mais recente tem entre suas causas as tensões provocadas por diversos projetos privados e estatais em torno do petróleo e da mineração. Um grande plano de mineração chamado Arco Mineiro do Orinoco, que cobre uma extensa região de vários estados venezuelanos no entorno do rio para exploração de diversos minerais como ouro, bauxita, diamantes e coltan, foi anunciado em 2011 e implantado a partir de 2016.

Além da mineração ilegal, à margem do controle e regulação do Estado, empresas nacionais e internacionais exploram minérios com legislação mais flexível. Ao delta do rio, fonte de vida para os Waraos, chega a poluição e contaminação lançada por esses projetos, afetando as condições de sobrevivência, agravadas ainda pela crise de desabastecimento de produtos básicos nos últimos anos. 

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