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‘Vale, Samarco e BHP não têm responsabilidade social e ambiental’

Governos e órgãos de Justiça afirmam impossibilidade de acordo com empresas. Em Londres, BHP perde recurso na Corte

Karini Berg

“A postura das empresas evidenciou, até o presente momento, descompromisso com práticas de responsabilidade social e ambiental”. A afirmação se refere à Samarco, Vale e BHP Billiton e é feita em comunicado conjunto assinado por representantes legais dos governos do Espírito Santo e Minas Gerais e pelos órgãos de Justiça que atuam na defesa dos atingidos pelo crime cometido pelas mineradoras contra o Rio Doce há quase sete anos: os Ministérios Públicos Federal e estaduais (MPF, MPES e MPMG) e as Defensorias Públicas da União e dos dois estados (DPU, DPES e DPMG).

No documento, os entes signatários oficializam a impossibilidade de continuar com os esforços de repactuação, conduzidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde junho de 2021, devido à irredutibilidade das empresas em concordar com prazos e valores de compensação e reparação minimamente dignos em vista dos danos provocados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG.

“A assunção, pelo Poder Público, da execução de medidas reparatórias e compensatórias restou totalmente inviabilizada em face dos dilatados prazos de desembolso, uma vez que a aceitação de tais prazos significaria transferir o ônus da mora àqueles que mais necessitam das medidas. É evidente, portanto, que houve o desvirtuamento, por parte das poluidoras, das premissas de celeridade e de definitividade, firmadas na Carta de Premissas de 22 de junho de 2021”.

A decisão, afirmam, é tomada apenas 14 meses de tratativas, que somaram nove rodadas de negociação e mais de 250 reuniões em busca da repactuação. O defensor público estadual Rafael Portella reforçou que a impossibilidade de aceitar a proposta das empresas se firma na convicção de que “é absolutamente inegociável o reconhecimento integral dos danos ocasionados no Estado do Espírito Santo e o efetivo endereçamento do processo indenizatório das comunidades atingidas”.

No início de agosto, em evento organizado por pescadores atingidos capixabas e mineiros, o deputado Helder Salomão (PT), relator da Comissão Externa da Câmara Federal dedicada a acompanhar a renegociação liderada pelo CNJ, já havia informado a postura intransigente das empresas criminosas e afirmado que “está fora de cogitação aceitar menos de R$ 100 bilhões” e que “o parâmetro ‘para começar a conversa’ é R$ 150 bilhões, [mas] as empresas até agora ofereceram a metade”. Já naquele momento, a judicialização se mostrava como possibilidade concreta. “Elas terão que pagar por bem ou por mal. Queremos que o valor represente uma reparação justa. Estamos diante do maior crime ambiental da história da humanidade, o valor tem que ser proporcional”.

No último dia 25 de agosto, essa posição já havia sido anunciada pelo governador Renato Casagrande (PSB) , quando afirmou que, “diante da insensibilidade com os atingidos, caberá à Justiça cumprir com total rigor o seu papel”.

Danos socioambientais persistem

Considerado o maior crime ambiental do país e da mineração mundial, o desastre lançou cerca de 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração sobre mais de 600 km do leito do Rio Doce, o que destruiu centenas de comunidades e contaminou de forma crônica todo a bacia hidrográfica, estuário e litoral capixaba.

Na véspera da declaração do governador capixaba, Século Diário divulgou em primeira mão o primeiro relatório oficial a respeito da segurança do consumo de pescado na bacia do Rio Doce, em sua foz e no litoral capixaba, concluiu que o nível de contaminação é grave, havendo provas de nexo de causalidade com o rompimento da Barragem.

Quem assina e quem não assina

Assinam o comunicado: o Procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva, pelo MPF; o Procurador Geral de Justiça Jarbas Soares Júnior, pelo MPMG; a Promotora de Justiça Elaine Costa de Lima, pelo MPES; o Advogado Geral do Estado Sérgio Pessoa de Paula Castro, pelo Governo do Estado de Minas Gerais; o Procurador Geral do Estado Jasson Hibner Amaral, pelo Governo do Estado do Espírito Santo; a Defensora Pública Geral Raquel da Costa Dias, pela DPMG; o Defensor Público Rafael Mello Portella Campos, pela DPES; e o Defensor Público Geral Federal Daniel de Macedo Alves Pereira, pela DPU.

Chama atenção a ausência de representante da União no documento, mas ainda não é possível prescrutar no que isso pode resultar, em relação à luta por valores e prazos de indenização à altura dos danos sofridos pelas famílias, comunidades, municípios e estados atingidos.

BHP perde novamente na Inglaterra

A confirmação da judicialização do caso pelo poder público no Brasil acontece dias após a BHP sofrer uma nova derrota na justiça britânica. No dia 31 de agosto, a Corte de Apelação do Reino Unido rejeitou o recurso feito pela mineradora para recorrer à Suprema Corte contra a permissão dada para que ela seja julgada por sua responsabilidade na tragédia.

O processo é movido pelo escritório Pogust Goodhead em favor de mais de 200 mil vítimas no Espírito Santo e Minas Gerais. Impetrada em 2018 com o valor de cinco bilhões de libras esterlinas – atualizados hoje para cerca de 31 bilhões de reais – a ação chegou a ser negado pela Justiça do Reino Unido, mas, após nova análise, foi aceita no dia oito de julho passado. Na ocasião, Tom Goodhead, sócio-administrativo do escritório, declarou sua expectativa de que, diante do aceite da Justiça, a empresa propusesse um acordo em no máximo 90 dias.

Diante da recusa dos argumentos, anunciada no final de agosto, o advogado inglês se pronunciou de forma semelhante aos entes brasileiros neste início de setembro, em relação à alardeada responsabilidade social e ambiental da mineradora. “Apesar do alegado compromisso da BHP com a responsabilidade social corporativa, a mineradora atrasou o acesso à justiça para as vítimas do rompimento da barragem por três anos ao tentar erroneamente impedir um julgamento do caso na Inglaterra. É hora de a BHP fazer a coisa certa, viver de acordo com os valores que declara e parar de adiar o inevitável”.

A Corte de Apelação ainda determinou que a BHP apresente sua defesa sobre o mérito do caso. A mineradora, porém, ainda tem direito a uma segunda tentativa de recorrer à Suprema Corte.

Indígenas paralisam ferrovia

Em meio à batalha judicial e extrajudicial, aldeias Tupinikim continuam mobilizadas em busca de uma revisão do acordo firmado com a Fundação Renova há um ano, em busca de valores de indenizações mais justos para as famílias indígenas atingidas. O bloqueio dos trilhos da Vale que cortam a Terra Indígena Comboios teve início no dia primeiro de setembro e, segundo as lideranças, só será suspenso mediante diálogo diretamente com representantes das mantenedoras da Renova, as três mineradoras Vale, Samarco e BHP.


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https://www.seculodiario.com.br/meio-ambiente/e-o-fim-da-pesca-no-rio-doce-e-no-litoral-capixaba

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