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Professor diz que economia não pode ser guiada por visão única do empresariado

Análise de Arlindo Vilaschi foi feita no momento em que o empresariado se reunia com candidatos ao governo

Divulgação

O economista Arlindo Vilaschi, professor aposentado da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), afirmou ser “lamentável que os governos estaduais, desde a época da primeira gestão de Paulo Hartung, tenham se deixado cooptar por essa visão única”. O comentário foi feito a Século Diário nesta quinta-feira (15), no mesmo horário em que a ONG Espírito Santo em Ação realizava evento para debater o programa “Diretrizes – Encontro com candidatos ao Governo do Espírito Santo”.

Apesar da crítica, Vilaschi destaca ser “absolutamente legítima qualquer associação de interesse, isso não há como questionar, porque faz parte do jogo democrático”, acentuando, porém: “Se você observar, todos os chamados planos de governo, como foram o Espírito Santo 2025 e depois 2035, tanto sob Paulo Hartung quanto Renato Casagrande, ao longo desses mais de 20 anos que eles estão se revezando no poder, foram ditado pela ES em Ação e seguido como se fora projeto para o Estado”. 

Para o presidente da ES em Ação, Fernando Saliba, o encontro com os candidatos, em Vitória, foi de “extrema importância para o desenvolvimento do Espírito Santo”. Ele acrescenta que “o empresariado capixaba teve a oportunidade de dialogar com os candidatos às eleições sobre temas prioritários, propostas e indicadores que impactam no crescimento do Estado”. Participaram do evento os quatro primeiros colocados nas pesquisas eleitorais, nesta ordem, Casagrande, Carlos Manato (PL), Audifax Barcelos (Rede) e Guerino Zanon (PSD).

Arlindo Vilaschi diz que um projeto para o Estado “é óbvio que deve contemplar interesses diversos, inclusive de grandes empresas, nada contra”. No entanto, ressalta, a questão toda é quando a visão dessas grandes empresas eventualmente coopta uma entidade empresarial. “Aí, os grandes projetos contribuem com a economia capixaba, e isso deve ser levado em consideração, mas também causam diversos impactos, as chamadas externalidades negativas, geradas pela Vale, ArcelorMittal, Aracruz Celulose, agora Suzano, e Samarco”.

“Na democracia e busca de modelo de crescimento para o Espírito Santo, é preciso levar em consideração os efeitos positivos, que existem, mas é preciso também não se esquecer dos negativos que essas empresas vem gerando no Estado há mais de 50 anos”, acentua o professor.

Para ele, “o governo estadual tem que levar em conta mais do que uma visão. Não pode ser só uma visão empresarial, como se a sociedade pudesse ser gerida por ela. Seria de todo conveniente – e deveria ter sido levado em consideração ao longo desses mais de 20 anos de hegemonia de alternância Paulo Hartung/Casagrande – outras visões de sociedade. E a sociedade civil organizada tem outras visões sobre o funcionamento da economia – no campo e na cidade – e que não estão contempladas por nada que é proposto pela Espírito Santo em Ação”.

Arquivo SD

No entendimento de Vilaschi, a questão não é a legitimidade da ES em Ação. “O que me parece inadequado é, obviamente, e absolutamente inapropriado, é o governo do Estado se deixar sequestrar por essa visão única. Numa democracia há que se ouvir os outros lados, inclusive daqueles que sofrem prejuízos diretos, como é o caso, por exemplo, do afetados pelo crime ambiental da Vale, lá em Mariana, que atingiu todo Rio Doce e a nossa costa. Essas pessoas não foram ouvidas, não tem interlocução. É preciso ouvir a sociedade acerca dos malefícios provocados pela poluição do ar, da mesma forma como os efeitos negativos provocados pela exploração do gás e do petróleo”.

O economista aponta a concentração de terras majoritariamente ligadas à silvicultura que, para ele, é “uma coisa que a gente precisaria repensar no Espírito Santo. O uso da costa quase que exclusivamente para atividades portuárias à exportação de commodities com baixíssimo nível de agregação econômica também é uma questão negativa; a questão como o encadeamento produtivo é encarado, muitas vezes desconsiderado”.

Ele acentua: “É preciso que o Espírito Santo se coloque para além do que essas grandes empresas veem. A ArcelorMittal vê o Espírito Sano apenas como uma unidade produtiva; poderíamos imaginar que é a mesma coisa com a Suzano, a Vale, da mesma forma que as petroleiras que estão atuando aqui”.

O professor reforça que “é preciso lançar um olhar para além da visão dessas empresas”. Uma visão, complementa, “voltada para a economia e interesses da sociedade, da formação socioeconômica capixaba. Muitos trabalhos que já publicamos a esse respeito mostram como essas empresas poderiam contribuir, por exemplo, para a gente discutir de forma mais clara e ampla como a competência tecnológica delas poderiam servir para alavancar outros segmentos da economia capixaba. Como é que a participação delas pode gerar alguns benefícios fiscais para o Espírito Santo”.

Vilaschi cita ainda como as grandes empresas podem contribuir mais efetivamente, com recursos, para a construção de políticas públicas e não fazer maquiagem, como está cada vez mais frequente. “Tem um relatório de impacto ambiental e eles vêm com compensações ambientais, na maioria das vezes muito mais utilizadas para o marketing das próprias empresas do que para, minimamente, compensar os danos que causam”.

Ele chama a atenção para o “momento em que essas empresas devam sentar-se em torno de uma mesa, junto com representações da sociedade civil, que é muito mais ampla, e pesquisadores, pensando de forma autônoma e não dependentes exclusivamente de seus próprios interesses”. 

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