Pintura foi feita no muro da comunidade católica do bairro Padre Gabriel, em Cariacica, por moradores da região
Parte da história do padre francês Gabriel Maire foi resgatada em um muro de 110 m², na comunidade católica São João Batista, situada no bairro que leva o nome do sacerdote, em Cariacica. O território, anteriormente chamado de Barbados, era onde diversas famílias, apoiadas pelo padre, lutavam por moradia. O memorial urbano, feito com grafite, com a participação de moradores da região, principalmente jovens, busca resgatar a trajetória do padre francês no Espírito Santo, notadamente no município, onde atuou até ser assassinado, em dezembro de 1989.
A iniciativa foi idealizada pela historiadora Thays Ferreira, moradora da comunidade, e possibilitada por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Cariacica João Bananeira. Para fazer o memorial urbano, foram realizadas, gratuitamente, oficinas de desenho e grafite. O projeto não se limitou à parte técnica, pois houve também roda de conversa sobre a história do bairro e a do sacerdote francês, além de discussões sobre o grafite como instrumento de potencialização dos territórios.
O desenho retrata como o bairro, que era uma grande fazenda, foi ganhando aspecto mais urbano, a partir das ocupações de moradia, muitas delas apoiadas por padre Gabriel. Com o passar do tempo, as pessoas passaram de fato a conquistar a posse dos imóveis pelos quais tanto lutaram. Thays Ferreira conta que moradores da região relataram, no decorrer do projeto, que as ruas e lotes foram divididos, já na década de 90, em frente a uma árvore.
Essa árvore, que vive ainda hoje, encontra-se em frente à praça da comunidade, e é retratada no memorial com uma copa que tem diversas mãos no lugar das folhas, simbolizando que o bairro foi construído coletivamente. Outros desenhos que constam no muro são o fusca de padre Gabriel, muito recordado pelos moradores, que fizeram questão de desenhar o veículo, e uma asa de anjo, onde as pessoas podem tirar foto, e que simboliza que o sacerdote ainda vive.
Padre Gabriel, também conhecido como Gaby, foi assassinado em 23 de dezembro de 1989. Chegou ao Brasil em 1980, e sua atuação no Espírito Santo, principalmente no município de Cariacica, foi marcada pela intensa participação nas Comunidades Eclesiais de Base (Cebs) da Igreja Católica. Gabriel incentivava a organização popular como forma de mobilização para garantia de direitos, dignidade e qualidade de vida. Incentivou a criação de movimentos de mulheres, culminando na atual Associação de Mulheres de Cariacica Buscando Libertação (Amucabuli). Foi essencial nos movimentos de moradia e em meio aos grupos de juventude, como a Juventude Operária Católica (JOC).
Ainda sobre a classe trabalhadora, atuou na Pastoral Operária, onde coordenou um jornal chamado Ferramenta, feito por operários para operários, que buscava informar os trabalhadores sobre questões como as lutas populares no Espírito Santo, no Brasil e, em menor escala, no mundo, além de ter como outro objetivo a educação para a cidadania. O crime que resultou e sua morte prescreveu em 2017, sem que os mandantes fossem identificados e punidos.