Os empreendimentos portuários previstos para o município de Itapemirim, sul do Estado, não são as únicas ameaças à Área de Proteção Ambiental (APA) Guanandy, unidade de conservação que abriga o Monte Aghá. O governo do Estado pretende autorizar a extração de rochas em lavra da Villa Rica Mineração em um maciço rochoso ao lado do bem natural tombado. A atividade atenderá à demanda da Base de Apoio Logístico Offshore Ltda (C-Port Brasil), do Itaoca Offshore e do Projeto de Terminal Pesqueiro e Restauração Litorânea na Praia de Itaipava.
Os processos de licenças prévia e de instalação à mineradora estão em análise no Conselho Estadual de Cultura (CEC). Por considerar que atividade irá afetar diretamente a unidade paisagística que sustenta a composição estética do Monte Aghá, a Câmara de Patrimônio Ecológico, Natural e Paisagístico do Conselho emitiu parecer técnico científico contrário à concessão da licença, assinado pelos conselheiros Alessandro Montenegro Bayer, Marco Ortiz e Thalismar Matias Gonçalves.
Eles ressaltam que as medidas mitigadoras e de controle ambiental apresentadas não abrangem os prejuízos que a atividade poderá causar na percepção cultural e paisagística da população em relação ao bem tombado, considerado uma forma de valorização da cultura local e de celebração das significações simbólicas.
A área onde a Vila Rica pretende extrair rocha faz parte do conjunto paisagístico onde se insere o Monte Aghá, que por possuir características similares, é denominado Monte Aghá Pequeno. Aponta o parecer técnico que essa Unidade Paisagística estabelece toda a composição estética do bem tombado, “sendo a vizinhança do mesmo tão importante, ou em certos casos até mais importante que o elemento topográfico tombado”. Portanto, qualquer ruptura na morfologia e topografia, seja no entorno ou vizinhança, significará a total descaracterização estética do Monte Aghá.
Também endossa a argumentação dos conselheiros o risco da atividade à APA Guanandy, com sua relevância ecológica, paisagística e cultural. A unidade está enquadrada na classificação Alta Prioridade para conservação e integra o Corredor Ecológico Guanandy, criado em 2010 como uma importante estratégia para preservar os remanescentes da mata atlântica no Estado.
O parecer apresentado ao CEC foi elaborado após visita técnica ao local, quando foi identificada ainda a presença de uma nascente em nível avançado de degradação. Lembram os conselheiros que a mesma atividade de mineração já foi realizada pelo Consórcio Construtor Itaipava, para obras de enrocamento do terminal de pesca de Itaipava, e “nenhum projeto de restauração ambiental foi executado pela empresa que realizou a extração, e nem pelo Iema [Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos], transformando-se em área degradada, com um significativo impacto ambiental, ecológico e paisagístico”.
Acatando a fundamentação da Câmara Técnica, o Conselho Estadual de Cultura se posicionou contra a liberação da atividade de mineração, por unanimidade. Como a decisão ameaça as pretensões do governo do Estado para a área portuária, houve reação da conselheira Luciana Merçon Vieira, que é subprocuradora geral para Assuntos Administrativos da Procuradoria Geral do Estado (PGE). Em outro parecer, ela questiona a competência do CEC em tratar a questão, numa tentativa de deixar a cargo apenas do Iema a decisão sobre as licenças ambientais. Este debate deverá nortear a próxima reunião do Conselho, que será realizada ainda este mês.
Em dezembro de 2012, o governo federal anunciou investimentos da ordem de R$ 13,3 bilhões em portos no Espírito Santo, até 2017. Os recursos fazem parte do “Programa de Investimentos em Logística: Portos” e englobam nove plataformas portuárias, oito com investimentos exclusivamente particulares, a partir de licitação, e o Porto de Águas Profundas (Super-porto), que deve ser construído em Vila Velha, a partir de uma parceria público-privada (PPP).
Entidades ambientalistas calculam, porém, que as nove plataformas são apenas o “carro-chefe” das pretensões do governo do Estado. Com os projetos previstos, serão ao todo 30 portos, entre empreendimentos já em operação, em licenciamento ou apenas previstos. Nenhum deles debatido com a sociedade, apesar dos impactos sociais e ambientais, muitos não passíveis de compensação.
Gaveta
Outro movimento contrário do governo do Estado é protelar a publicação do ato de criação da Comissão Cultural de Análise de Portos do Espírito Santo, iniciativa apresentada pela Câmara de Patrimônio Ecológico, Natural e Paisagístico e aprovada, também por unanimidade, pelo Conselho Estadual de Cultura, no dia sete de março deste ano.
A proposta prevê a realização de estudos sobre impactos portuários; solicitação de informações aos órgãos competentes; análise de todas as possíveis propostas de criação e implantação de portos ou super-portos; parcerias técnicas; elaboração de parecer técnico, e indicação das medidas cabíveis em cada situação.
Além dos conselheiros que propõem a Comissão, integrariam o grupo o ex-conselheiro do CEC Felipe Ramaldes e um representante do Ministério Público do Estado (MPES).
A iniciativa tem respaldo no artigo 39 do Regimento Interno do CEC, que autoriza a formação de comissões provisórias para “desenvolver estudos, projetos, examinar matérias não afetas às áreas de atuação das câmaras ou acompanhar a execução das políticas públicas para a área da cultura e realizar audiências públicas”. O prazo definido para conclusão dos trabalhos e apresentação dos resultados seria nove de maio.