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A minuta do golpe

“Para referendar o dia do caçador, Anderson Torres está preso”

A minuta do golpe que foi encontrada no apartamento do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Anderson Torres, do governo de Jair Bolsonaro, agora ex-presidente da República, é mais um fato que vem se somar à miríade de tentativas tanto de contestar o resultado das eleições presidenciais de 2022, como de servir para um balão de ensaio de golpe e anulação deste resultado.

A sanha golpista do que representou o governo de Jair Bolsonaro e de uma parte intervencionista do espectro do bolsonarismo, e que culminou na conspirata da depredação dos Três Poderes no fatídico 8 de janeiro de 2023 em Brasília, tem nesta minuta mais uma prova de que foram ensaiadas diversas saídas para negar a derrota eleitoral e virar a mesa.

E na dinâmica do dia da caça e do caçador, esta caçada insana por uma saída inconstitucional foi pega em flagrante. A minuta era um rascunho para um decreto de golpe, indo de encontro ao Artigo 2 º da Constituição Federal sobre a independência dos poderes. A redação da minuta seguia todos os quesitos de um texto jurídico e fundamentado, porém, na forma, pois o conteúdo era escandaloso, e obviamente inconstitucional. O documento, portanto, foi elaborado por juristas, mas com intenções de burlar a Carta Magna.

A independência entre os Três Poderes foi algo referendado desde a obra de Montesquieu, um dos pilares do Iluminismo, na Teoria da Separação dos Poderes, que é o Sistema de Freios e Contrapesos, na obra O Espírito das Leis, que se seguiu a elaborações embrionárias com fontes na Política de Aristóteles e no Segundo Tratado do Governo Civil, de John Locke. O Espírito das Leis, por sua vez, circulou primeiramente no período da Revolução Francesa.

A minuta do decreto, golpista, visava a instauração do estado de defesa na sede do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), com o objetivo de mudar o resultado das eleições de 2022. O estado de defesa, previsto no artigo 136 da Constituição Federal, é um mecanismo de restabelecimento da ordem pública em casos de calamidades naturais e de instabilidade institucional, o que na minuta não demonstra fundamentação, portanto, está no terreno da inconstitucionalidade. Para ficar mais claro, a pretensão da minuta, em seu conteúdo, era uma tentativa de imputar abuso de poder, suspeição e medidas ilegais ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na condução das últimas eleições no Brasil.

Agora os investigadores da Polícia Federal recebem informações de que a minuta do decreto circulou por mensagens de celular entre assessores do então presidente Jair Bolsonaro, já com o fito de uma intervenção na Justiça Eleitoral, e também circulou entre membros do comitê da reeleição. Tal informação é importante para entender a atuação do ex-secretário da Segurança Pública do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública no final do governo de Jair Bolsonaro, Anderson Torres.

A tentativa da Polícia Federal agora é de acessar dados do celular de Anderson Torres que estejam disponíveis em nuvens de plataformas digitais. Anderson Torres não trouxe o seu celular para o Brasil, numa conversa mole de quem tem muito o que explicar na Justiça, pois está tudo à luz do dia.

Por sua vez, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Polícia Federal remetesse uma cópia da minuta do decreto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O material agora é anexado a uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral que tramita contra Bolsonaro na Corte por sua inelegibilidade, já desde o episódio fatídico de seu convescote com embaixadores em julho de 2022, também um pretexto apócrifo e desconjuntado de questionar as urnas eletrônicas. Uma piada diplomática.

O ministro Benedito Gonçalves, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), portanto, determinou a inclusão da minuta do decreto nesta ação de investigação. Tal anexação da minuta a esta ação foi atendendo a um pedido do PDT, e que pode tornar Jair Bolsonaro inelegível. Agora a trama do golpismo está entrelaçada, pois as ações estão sendo unificadas, juridicamente, como se fosse a melhor documentação da cantilena bolsonarista, o dia da caça se batendo com o dia do caçador.

Para referendar o dia do caçador, Anderson Torres está preso, e se encontra encalacrado com as consequências de sua ausência do Distrito Federal durante o episódio de vandalismo e tentativa de golpe que ocorreu em 8 de janeiro deste ano, uma obra prima da ignorância, o opus da cantilena bolsonarista que cultua a burrice em todas as suas formas possíveis e impossíveis. Agora à sua via crúcis se adiciona este achado, este artefato, que é a minuta do golpe, que estava em seu apartamento.

Por fim, Benedito Gonçalves, ministro-corregedor da Justiça Eleitoral, recebe uma petição de Bolsonaro que contém uma alegação farsesca tentando a desconsideração da minuta do decreto, a minuta do golpe. O argumento feito para temperamentos ou inteligências do reino mineral não convence, pois mistura a ideia de documento apócrifo, de que a minuta não deixou a residência de Anderson Torres, de que não foi publicado, e de que o rascunho não foi transposto à realidade. Ou seja, argumentos capazes de deixar corada uma rúcula, como vemos. Mas, vai que cola, só que não. A minuta era um balão de ensaio de golpe, e para variar, morreu na praia.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Blog : http://poesiaeconhecimento.blogspot.com

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