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Associações repudiam desrespeito de escola de samba com o Ticumbi

Ticumbi de Conceição da Barra viajou até Vitória, mas foi destratado pela Imperatriz do Forte e não desfilou

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Três associações de folclore capixaba manifestaram publicamente sua indignação contra o tratamento desrespeitoso dispendido na última sexta-feira (10) pela escola de samba Imperatriz do Forte ao Baile de Congo São Benedito de Conceição da Barra, ou Ticumbi de São Benedito, um dos mais marcantes elementos da identidade cultural capixaba.

Apesar do samba-enredo da escola, que abriu o carnaval de Vitória deste ano, tratar da cultura quilombola, por meio da história de Benedito Meia Légua, e da abertura do desfile da Imperatriz homenagear os festejos do Ticumbi, o Baile de Congo foi destratado pela escola, não tendo sido devidamente recepcionado pelos integrantes, o que impossibilitou até que o grupo entrasse na avenida e participasse do desfile. “Nem água deram para a gente”, declarou na ocasião o Rei de Congo Jonas Balbino.

Uma das notas de repúdio veio do próprio Baile de Congo de São Benedito de Conceição da Barra, nesta terça-feira (14), que condenou “as ações e inações do Grêmio Recreativo Escola de Samba Imperatriz do Forte e da Liga Espírito-Santense das Escolas de Samba (Lieses), que vêm tentando calar a voz do povo preto do Sapê do Norte”.

Além de todo o constrangimento no dia do não-desfile, o Ticumbi repudia o fato de que, até o momento, os diretores da escola “se recusam a ouvir o clamor do grupo por um pedido formal de desculpas e blindam a escola impedindo as manifestações dos aviltados em suas redes sociais”.

O grupo afirma que “a Imperatriz do Forte usurpou a Cultura Capixaba”, pois levou para a avenida “um enredo fictício”, desconhecido pelos carnavalescos e diretoria da agremiação. “Com a desculpa de homenagear o revolucionário negro Benedito Meia-Légua, estamparam São Benedito em seu estandarte, incluíram Santo Bino das Piabas em seu enredo e conclamaram os presentes no Sambão do Povo a abrir a praça para ver o Ticumbi mas, do alto de sua arrogância, sentiram-se maiores que a Tradição e abandonaram o grupo na concentração do desfile, sem água, sem comida e nem boas-vindas, depois de sete horas de viagem”.

A nota destaca a postura do presidente da escola, Artur Kadratz, que “lavou as mãos”, sublinha o Baile de Congo, pois “simplesmente não respondeu mais às mensagens do grupo, que aguardava com fome na avenida”. Conforme noticiado em Século Diário, na fatídica noite, apenas o carnavalesco Vitor dos Santos, após longo tempo de espera, foi conversar com o grupo, mas também não assumiu responsabilidade e “falou em ‘acordos escusos’ da diretoria que teriam impedido a escola de fornecer comida aos membros do Ticumbi, que atravessaram o Estado para ajudar a escola a contar uma história que é a história deles”.

Com o ônibus cedido pela Prefeitura de Conceição da Barra e a promessa de voltar imediatamente após o desfile, sem necessidade de pernoite, caberia à escola apenas alimentação na chegada e para a viagem de volta e a entrega de 15 fantasias para familiares dos brincantes, mas nada disso foi cumprido.

A nota pontua aspectos da tradição quilombola que foram usurpados pela escola, descrevendo personagens representados no desfile, sem conexão com a realidade. “Santo Bino das Piabas, representado por um ator no carro abre-alas da Imperatriz do Forte, é festejado todo ano pelo Baile de Congo de São Benedito de Conceição da Barra, pelo Jongo das Barreiras, que guarda a imagem que pertenceu a Benedito Meia-Légua há séculos, e por todo o povo preto do Sapê do Norte. Festa de Benedito Santo é festa de fartura. Todos que participam do Ensaio-Geral do Ticumbi comem até saciar a fome, porque Benedito é santo cozinheiro e matou a fome de muita gente quando andou pelo mundo! Mas disso a Imperatriz do Forte não entende. Para o carnavalesco, os Beneditos deste enredo ‘Mas será o Benedito?’ são apenas figurações que rendem um bom samba e belas cenas na avenida que viram pontos dos jurados”.

O grupo critica também “o silêncio retumbante dos representantes da Cultura Capixaba e das autoridades”. Exceções, elencam, foram a deputada Iriny Lopes (PT), a Associação de Folclore de Conceição da Barra e a Comissão Espírito-Santense de Folclore.

As duas responsáveis pelo desrespeito ao Ticumbi, a Lieses e a Imperatriz do Forte, ainda “impedem que comentem em suas postagens sobre o desfile da escola e, ao invés de soltarem uma nota pública pedindo desculpas à Cultura que desrespeitaram e agrediram, agora começam a esparramar mentiras sobre o grupo nas redes e para a imprensa”, assinala o Baile de Congo. “Querem fazer parecer que quem pediu para participar do desfile foi o Ticumbi quando, na verdade, o grupo aceitou o convite, apesar do pouco que a escola se propôs a oferecer”, reforça.

A nota finaliza invocando personalidades quilombolas e cobrando uma manifestação pública da escola e da Lieses. “Mas São Benedito sabe de todas as coisas e, lá do céu, Mestre Tertolino Babino, Coxi, Ascendino e tantos outros homens honrados e devotos que dedicaram a vida para preservar esta tradição cultural estão vendo a trama articulada e o sofrimento imposto por gente inescrupulosa ao povo preto do Sapê do Norte. O Ticumbi de São Benedito respeita o Carnaval de Vitória, a tradição do samba e as comunidades pretas da Capital. Tudo o que o grupo exige é ter de volta o mesmo respeito. Esperamos um pedido formal e público de desculpas da Imperatriz do Forte”.

Repúdio veemente

A Associação de Folclore de Conceição da Barra afirmou, em suas redes sociais, que repudia “com veemência” o fato e também destacou duas incoerências gritantes em relação a São Benedito e ao Ticumbi.

“Benedito é santo cozinheiro e suas festas são de fartura e boa comida. Em nada combina com a mesquinhez de negar água e alimento a quem viajou sete horas apenas para ajudar a contar, na avenida, uma história que o Ticumbi mantém viva há vários séculos”, expõe. “Os foliões da Imperatriz cantavam alto na avenida o samba enredo que dizia ‘Então abre a praça pra ver Ticumbi’, enquanto a diretoria, destratava e humilhava os integrantes do grupo na zona de concentração do desfile”, complementa.

O recado final também é por um posicionamento dos responsáveis. “Alô Imperatriz do Forte! Com dignidade queremos uma retratação digna, não se brinca com a cultura popular”.

‘Astúcia do povo’

A Comissão Espírito-Santense de Folclore publicou uma “nota de orientação’ à escola e à Liga e de solidariedade ao Mestre Berto e todos os integrantes do Baile de Congo.

“O Baile de Congos de São Benedito de Conceição da Barra existe há 300 anos e seu enredo narra a chegada da cristandade na África negra, a resistência histórica à escravidão e ao racismo no Brasil e traduz com grande simbolismo a identidade cultural dos territórios dos antigos quilombos no norte do E. Santo. O Ticumbi de São Benedito é um precioso ícone do povo preto capixaba e um inestimável bem cultural do patrimônio imaterial brasileiro que deve ser conhecido, respeitado e tratado com muita dignidade!”, explica a Comissão.

A nota também “roga às autoridades públicas responsáveis pelo cumprimento e fiscalização de políticas de reconhecimento, proteção, fomento e valorização das comunidades tradicionais e que estejam atentas às investidas de pessoas, entidades e organizações que praticam o descaso, o abandono e a coerção das tradições e a exploração das manifestações folclóricas capixabas em detrimento da dignidade de seus legítimos donos!! Percebemos um verdadeiro desrespeito à cultura popular nesse caso e como conceituava o Mestre Armojo sobre Folclore ‘É uma astúcia do povo’ e merece respeito total”.

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