Camponeses comemoram retorno do Programa de Aquisição de Alimentos, mas cobram revisão da metodologia de precificação
Combate à fome, diversificação alimentar, mais renda para as famílias agricultoras. O tripé de benefícios socioecômicos resume a importância do retorno do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), anunciado para esta quarta-feira (22) pelo presidente Lula (PT). No Espírito Santo, é alta a expectativa entre os agricultores familiares.
“Estamos contando os minutos”, metaforiza o camponês Dorizete Cosme, membro da coordenação estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) no Espírito Santo. “Diminui a dependência das famílias camponesas em relação aos monocultivos, fortalece as associações e cooperativas”, elenca o coordenador, complementando a lista de impactos positivos da política pública federal.
No passado, conta o coordenador, enquanto funcionou em sua primeira fase, durante os governos Lula e Dilma Roussef, o programa envolveu milhares de famílias no Espírito Santo. “As famílias estão numa expectativa muito grande, porque possibilitou de se libertarem do monocultivo do café e pimenta-do-reino aqui no norte do Estado. Elas já sabiam que poderiam produzir frutas, verduras e legumes, na certeza de que teriam mercado garantido e com preço garantido. Com isso, elas conseguiam planejar sua produção e outros tipos de investimentos. Gera um ciclo de desenvolvimento bem significativo”, explica.
Outro aspecto importante é a certeza de colaborar com a retirada do país, mais uma vez, do mapa da fome. “As famílias vão ter uma participação direta no combate à fome e desnutrição, que é um aspecto social que traz uma satisfação muito grande”.
Nessa nova fase, no entanto, os camponeses cobram que sejam feitas algumas atualizações no funcionamento do programa. “Um controle maior dos investimentos públicos, com maior aferimento dos quantitativos contratados e entregues, das entidades que irão participar, que sejam de fato entidades da agricultura familiar, e que seja garantido que as famílias mais vulneráveis recebam os alimentos. Também precisa garantir a qualidade dos alimentos”, pontua.
Uma outra revisão fundamental, destaca Dorizete, é a forma de precificação dos alimentos adquiridos pelo governo federal. “No nosso entendimento, a metodologia atual não atende às necessidades dos agricultores. Propomos que ela seja baseada nos valores praticados nas feiras locais e em supermercados regionais e não na Ceasa [Centrais de Abastecimento do Espírito Santo], porque lá os preços médios estão fora da realidade”, expõe, tocando em aspecto que ficou ainda mais crítico após o impeachmet da ex-presidente, quando as verbas para políticas públicas semelhantes ao PAA foram decrescendo gravemente, incluindo o também federal Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e o estadual Compra Direta de Alimentos (CDA).
Conforme observado em agosto de 2021 pelo MPA, naquele ano, o orçamento do PAA em São Mateus, no norte do Estado, foi de R$ 95 mil, enquanto que em 2013, somente uma entidade de agricultura familiar do município foi de R$ 1 milhão.
Um ano depois, o Movimento comparou novamente os números, mostrando a continuidade do enfraquecimento do programa, com uma redução de 96% no número de famílias beneficiada, em relação a 2011, com 20 e 500, respectivamente.
Início há vinte anos
O PAA foi criado no início do primeiro governo Lula, em 2003, estimulando os órgãos públicos a comprarem alimentos da agricultura familiar para entrega às famílias em situação de insegurança alimentar e nutricional. A prática também tende a contribuir para a formação de estoques públicos, ajudando a evitar a disparada dos preços dos principais alimentos, além de incentivar hábitos alimentares saudáveis.
“Vamos comprar a preço de mercado os alimentos que vocês produzem e colocá-los na mesa do povo. Os restaurantes universitários, o Exército [Forças Armadas], todos terão que comprar da agricultura familiar”, declarou na última sexta-feira (17) o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, durante sua participação na 20ª Festa da Colheita do Arroz Agroecológico, realizada no Rio Grande do Sul pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o maior produtor de arroz orgânico da América Latina.
Também presente ao evento, o indicado para assumir a presidência da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o ex-deputado estadual pelo PT Edegar Pretto, reforçou: “A prioridade número um é garantir a assentados, agricultores familiares, índios, quilombolas, ribeirinhos, pescadores, enfim, a todos os que optarem por produzir comida [para a população brasileira], que o governo, a Conab, serão seus maiores clientes, [adquirindo a] produção que vocês colherem”.
Durante relançamento do PAA, também serão feitas a reinstalação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf) e criado o Programa de Organização Produtiva e Econômica de Mulheres Rurais.