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Somos todos ilhas

Vista especial para o porto de minério, onde o pó negro flutua, arrastado pela brisa amena

Enquanto a população da Terra continua crescendo desordenadamente, o planeta é o mesmo, não temos como esticá-lo. Muito pelo contrário, e segundo os pessimistas, a área apropriada para o uso humano está encolhendo, com a superfície sólida invadida pela massa líquida que nos rodeia. Já disse o poeta, somos todos ilhas. Os especialistas têm se debruçado sobre o problema, pois de acordo com os matemáticos, todo problema tem uma solução. O desafio é encontrá-la.

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Até agora, as soluções apresentadas não solucionaram nada. Travar o crescimento populacional seria uma delas, todos sabem, mas o número de nascidos continua crescendo, e quanto mais cresce, pior fica. Em contrapartida, o número de mortes diminui graças aos milagres da ciência, que prolonga a vida e torna a chamada previdência social imprevisível: a meta é simplesmente parar de morrer. Ninguém quer ser idoso, mas ninguém quer abandonar o barco. Sem mencionar que existe uma velada disputa entre os países mais populosos: quanto mais gente, melhor.

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Circulando por Vitória nesse primoroso mês de abril, percebo que a cidade não tem mais para onde ir – os morros passíveis de serem escalados estão todos tomados, e nem preciso mencionar as áreas planas – sufocamos coletivamente. No entanto, o povo – esse polvo de incontáveis tentáculos – continua se multiplicando. Vamos derrubando mais casas e levantando mais arranha céus, janelas contra janelas, área de lazer coletiva. Elevador com tempo alternado – os proprietários de apartamentos com números pares usam o ascensor nas horas pares; os outros usam os outros. Fica terminantemente proibido subornar o porteiro.

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Mas nossa cidade é privilegiada, e a solução salta à vista: os morros sagrados da bela ilha de Maria Ortiz, imponentes granitos desafiando o avanço do progresso – protegidos por leis rígidas eles nos desafiam: Aqui ninguém sobe! Só os pássaros se divertem na mataria que teimosamente se equilibra nas magras nesgas de terra escondidas nas reentrâncias do granito. Lindo de ver, mas como já foi mencionado, a população cresce e não tem mais onde se infiltrar.

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Mas nem tudo está perdido: se não podemos construir na pedra nua e crua, a solução seria construir sobre ela. Gigantescos pilares seriam erguidos ao redor da montanha, sustentando um patamar acima da pedra, mas sem tocá-la – sobre esta plataforma se construiria luxuosos condomínios, com todo o conforto que o progresso e as contas bancárias permitirem, e com a esplendorosa vista das alturas – toda a cidade se esparramando até o mar. Vista privilegiada para o porto de minério, onde o pó negro flutua arrastado pela brisa amena.

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O Morro do Cruzeiro ficaria aprisionado, mas não vai mesmo a lugar nenhum. A pedra serviria ao bem comum e nada sofreria – continuaria bela e altaneira enfeitando a paisagem, respirando e purificando o ar que contaminamos diariamente – uma prisioneira entre pilares de cimento, como todos nós. Delírios de uma mente alucinada? Quem viver verá.

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