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Pesquisadores e educadores decidem judicializar luta contra o TAG

Com o tema “TAG é retrocesso”, mesa-redonda na Ufes expôs deficiências do acordo proposto pelo Tribunal de Contas

Davi Abarca

O enfrentamento ao Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) proposto pelo Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCE-ES) às redes de ensino estadual e municipais vai ser judicializado. A decisão foi um dos encaminhamentos da mesa-redonda realizada nessa terça-feira (2) pelo Comitê Capixaba da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e o Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (CE-Ufes).

Com o tema “O TAG é retrocesso na educação capixaba”, o evento reuniu educadores de diversos coletivos do campo e da cidade, incluindo o Comitê de Educação do Campo do Espírito Santo (Comeces), que lidera o enfrentamento, desde 2020; os fóruns estaduais de Educação Infantil e de Educação de Jovens e Adultos (EJA); a União Nacional dos Conselheiros Municipais de Educação (Uncme-ES); além de estudantes, parlamentares, como a deputada estadual Camila Valadão (Psol) e o vereador de Vitória André Moreira (Psol), e o Ministério Público Estadual (MPES).

Outros encaminhamentos importantes foram a solicitação de uma audiência pública a ser feita à Comissão de Educação da Assembleia Legislativa e formação de uma comissão de trabalho que irá definir a melhor via judicial a ser impetrada contra o TAG, se uma Ação Civil Pública (ACP) ou uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).

As quatro horas de programação contaram com palestra da professora doutora Gilda Cardoso, coordenadora do Laboratório de Gestão da Educação Básica do Espírito Santo (Lagebes-Ufes), que mediou o debate com os presentes, juntamente com o professor Swami Cordeiro Bergamo, pelo Comitê Capixaba da Campanha, e com o diretor do CE-Ufes, Reginaldo Célio Sobrinho.

“Foi muito bom assistir a palestra da professora Gilda, porque ela trata ponto por ponto do relatório que o Tribunal de Contas usou como base para elaborar o TAG. Mostrou como a pesquisa que eles fizeram é muito ruim, porque os dados não foram coletados corretamente, o que prejudica todo o resultado das análises. E deixou claro que não houve diálogo com a academia”, pondera Maria Geovana Mellin Ferreira, representante do Fórum EJA no Comeces.

Davi Abarca

A educadora também ressalta que a palestra e todo o debate posterior explicitaram que as propostas do TAG, além de mal formuladas, apesar do objetivo de melhorar a gestão da educação capixaba, não são da alçada da Corte que, por sua vez, peca em não fiscalizar questões primordiais que são de sua competência. 

“Não é competência do Tribunal de Contas fazer esse tipo de proposição, de gestão. Enquanto há muita omissão dos conselheiros, que não fiscalizam o uso correto do dinheiro público, que leva tantas escolas a situações precárias”, pontua. “Fortaleceu ainda mais os nossos argumentos para derrubada do TAG como um todo. Ele não serve para ninguém, nem para o campo, nem para a cidade”, assevera.

‘Pontuações não foram acatadas’

Representando o Centro de Apoio Operacional de Implementação das Políticas de Educação do Ministério Público Estadual (Caope-MPES), coordenada pela procuradora Maria Cristina Rocha Pimentel, a pedagoga Camila Moreira reforçou o entendimento sobre a falta de diálogo horizontal do Tribunal de Contas com entes fundamentais. Apesar do órgão ministerial ter participado das tratativas prévias à redação do TAG, ela conta que o texto final não contemplou essa participação. “Nossas pontuações não foram acatadas”, afirmou.

Para exemplificar, citou a forma como o relatório calculou as distâncias entre as escolas do campo, traçando linhas retas em um mapa sobre a mesa e não medindo efetivamente a distância percorrida em campo, considerando as curvas e ladeiras reais. “Nós conhecemos a dificuldade do trajeto do transporte escolar, sabemos que não podemos falar em quilometragem, nas estradas do interior, em linha reta, sabemos dos terrenos acidentados”.

Em sua fala, ela salientou que quer “tranquilizar os municípios”, porque “existe um setor do Ministério Público que é afeto a essa situação da Educação”. No Caope, sublinhou, “conhecemos todas as dificuldades de todas as modalidades de educação e temos sensibilidade sobre isso”.

Davi Abarca

No entanto, tentando justificar porque, apesar de não concordar com o texto final, o MPES apoia o Termo, que foi assinado pela procuradora-geral de Justiça, Luciana Andrade, Camila Moreira alegou que “a assinatura é uma formalidade institucional, pela natureza do Ministério Público, como órgão fiscalizador”, acrescentando ainda que “a concordância ou não dos termos estabelecidos vai depender do entendimento do promotor de cada comarca”. A dinâmica do MPES, explicou, faz com que “se o promotor da comarca, que é autoridade do Ministério Público no município, entender que deve se opor, vai fazer isso”.

A posição aparentemente dúbia do Caope-MPES foi abordada pela educadora Carminha Paolielo, do Comeces. “É uma situação difícil de lidar, porque são as comarcas locais as responsáveis por fazer a escuta das demandas da sociedade civil, mas nem sempre temos promotores que fazem essa escuta. Tivemos reuniões em que as comunidades chamavam o Comitê, mas as promotoras faziam a defesa do TAG”, relatou.
“A gente não sente o Ministério Público como uma entidade que tem discutido e tirado posições de uma maneira coerente e articulada. Infelizmente, porque sentimos falta disso. Mas a gente não desistiu”, reivindicou.
Carminha também questionou o fato de que, apesar de haver “comunidades escolares de norte a sul do Estado” mobilizadas no enfrentamento, apenas três municípios se levantaram contrariamente ao TAG: Santa Maria de Jetibá, na região serrana, por meio da Câmara de Vereadores, e São Gabriel da Palha e Pinheiros, no norte, por meio de seus prefeitos – Tiago Canal Rocha (PSL) e Arnóbio Pinheiro (Cidadania), respectivamente. 
A questão toca em denúncia já feita por educadores do Comeces, com base em relatos recebidos por vereadores, secretários municipais e prefeitos, que se dizem acuados a assinarem, temendo represálias por parte do Tribunal de Contas.
‘Ajustamento de Gastos’

Oriunda de Santa Maria de Jetibá, a estudante de pedagogia Tamiles Gomes Pereira, que já havia se posicionado em audiência pública na Câmara de Vereadores da cidade, apontou o autoritarismo dos conselheiros da Corte de Contas, que ignoram a posição das comunidades, e ironizou o acordo. 
Davi Abarca

“O TAG não é termo de ajustamento de gestão, não, é termo de ajustamento de gastos. Porque é só isso que ele olha. E não é coincidência que ele esteja sendo feito junto com a reforma do ensino médio. Estão juntos para destruir a educação”.

Representando o Fórum Permanente de Educação Infantil, a educadora Sumika Freitas concordou com Tamiles. “São ações coordenadas, sim”, disse, sobre a simultaneidade do TAG e o Novo Ensino Médio (NEM). 

Também concordou com os posicionamentos dos colegas sobre a falta de diálogo não só por parte do Tribunal, mas da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), que sempre se absteve sobre o TAG. “É evidente que o Estado do Espírito Santo, nos últimos anos, não tem ouvido a universidade, os pesquisadores e as comunidades. Isso é muito sério”.

O professor Swami Cordeiro reforçou esse entendimento, acrescentando que são entidades privadas que têm dialogado com muita proximidade com o Estado e a Corte, como o Movimento Espírito Santo em Ação – ONG vinculada à Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes) – e o Todos Pela Educação. “É uma racionalidade neoliberal que está esterilizando a educação. Por trás disso, tem gente ganhando muito dinheiro”, alertou.

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