Encontro de travestis e transexuais negras e negros, em Vitória, irá debater demandas desse segmento
Há pouco mais de um ano, Século Diário buscou respostas sobre que é ser trans e travesti em uma sociedade transfóbica. A proximidade do VIII Encontro Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros, que começa nesta segunda-feira (22) e termina na sexta-feira (26), na Casa dos Direitos, Centro de Vitória, traz a provocação sobre a necessidade de afunilar o recorte dessa pergunta. Dessa vez, com a questão: o que é ser trans e travesti negra em uma sociedade transfóbica e racista?
A auxiliar pedagógica e educadora social Fell’s Kenstein afirma que é uma atitude de “muita resistência e coragem”. “É ter a certeza de sair de casa, mas não de voltar com vida. A gente convive com olhares de assédio, violência, exclusão. Também há os comentários que muitos dizem ser inocentes, mas sabemos que não são. Esses dias uma pessoa me questionou se tenho curso superior para ocupar a função que ocupo onde trabalho”, relata.
Fell’s Kenstein afirma que se ela apontar transfobia nesse tipo de atitude, vai ouvir de muitas pessoas que isso é “mimimi”, além de escutar um pedido de que “procure entender o lado do outro”. “Mas nunca querem entender o nosso lado, vêm com afirmações como ‘ah, dá um desconto, porque talvez no dia a dia essa pessoa não conviva com travestis'”, diz a auxiliar pedagógica e educadora social, que aponta que a hipersexualização das travestis e do corpo negro faz com que as travestis negras sejam vistas apenas como objeto sexual, e não para serem amadas.
“É como se a gente só servisse para uma noite de prazer, dificilmente uma pessoa vai querer sair com a gente para um restaurante, por exemplo, para expor um relacionamento publicamente”, diz.
Fell’s Kenstein trabalha no terceiro setor, em uma organização que existe há 24 anos, mas que somente 23 anos após sua criação contratou uma travesti, que é ela. A auxiliar pedagógica e educadora social afirma acreditar que, se errar, dificilmente uma porta se abrirá para outra travesti, o que não acontece se alguma pessoa cis errar, pois sempre haverá portas abertas.
Mas nem todo espaço é igual. Ury relata que, em um parque em Vitória, foi utilizar o banheiro feminino e duas mulheres a encurralaram e começaram a dizer “coisas absurdas”. “Se sentiram incomodadas com a minha presença e disseram que Deus me fez de um jeito e eu deveria aceitar”, conta Ury, recordando ainda do aniversário de um amigo, no qual ela e outras travestis foram chamadas no pronome masculino por um grupo de homens brancos de forma proposital. Elas questionaram o comportamento deles, que tentaram falar mais alto.
Ury afirma que uma travesti branca tem mais facilidade de ter traços considerados femininos, como rosto fino. Por isso, com as negras, a transfobia é ainda maior. “Insistem mais ainda em dizer que não podemos ser quem somos, por termos traços considerados masculinos”, pontua.
O que é ser trans e travesti em uma sociedade transfóbica?
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