Agerh autorizou Cesan a captar 26 mil litros/dia. Moradores lutam contra várias ameaças a lagoas e APPs
“Vão secar essa lagoa, como secaram a Lagoa Feia, perto do Morro do Moreno”. O aviso vem de balneário Ponta da Fruta, em Vila Velha, onde a Agência Estadual de Recursos Hídricos (Ageth) permitiu a captação, pela Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan), de 26 mil litros de água por dia de uma lagoa protegida pelos moradores.
Em ofício enviado ao Ministério Público Estadual (MPES) e à Ouvidoria do Governo do Estado, a presidente da Associação de Moradores do Bairro Balneário Ponta da Fruta (AMBPF), Evelyn Luciane Neto, pede que a autorização – Certidão de Dispensa de Outorga nº 325/23, emitida em 5 de abril – “seja revista”.
Ela chama atenção para o fato de que a captação está sendo feito por meio de uma rampa construída em cima da Área de Preservação Permanente (APP) da lagoa. O requerimento explica ainda que a lagoa não é abastecida por nenhum rio ou nascentes e acrescenta registros fotográficos, que permitem observar que “a lagoa está secando”.
O motivo, aponta, é que, além da captação, há uma série de fatores preocupantes: “as chuvas não têm sido suficientes para encher o corpo d’água; e a lagoa não recebe água diretamente de fontes permanentes e foi dividida em várias partes após aterro de ruas do loteamento irregular, e hoje conta apenas com um ladrão que visa o transbordamento da água excedente”.
Associado à condição fisicamente frágil da lagoa, a associação expõe questões de gestão: “existem outras fontes de água com mais capacidade de oferta que a nossa; a água não está sendo utilizada na nossa comunidade; a finalidade da água captada é desconhecida; e a Cesan possui água potável para suprir todas suas necessidades e possíveis obras”.
Localizada na Rua Francisco Rodrigues Pinto, a lagoa é cercada por uma APP, ambas cuidada pelos moradores. “A vizinhança tem lutado para preservar, enquanto vemos por parte dos órgãos competentes ações que vão de encontro ao que estamos tentando preservar”, repudia a entidade.
APA Lagoa Grande
Além da Agerh e Cesan, a líder comunitária lembra que as lagoas e APPs do bairro possuem outros agressores, tendo inclusive havido situações de ameaça de morte a ela, felizmente cessada após denúncia do caso em Século Diário.
O bairro está dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) Lagoa Grande, mas sofre com ameaças a seus bens naturais desde a criação do loteamento que lhe deu origem, em 1978, conforme consta no parecer da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Mobilidade (Semdu) e em uma ação civil pública movida em 2018 pelo Ministério Público Estadual (MPES).
“Esse loteamento foi projetado sem levar em conta a topografia e os acidentes naturais da região”, afirma o parecer, citando curvas de nível, matas, vales, ravinas, lagoas e grotas. O descaso “impediu a perfeita implantação da malha viária, em alguns casos tornando impossível a abertura de ruas a demarcação de lotes, pois foram localizados no meio de lagoas e em encostas de grande declividade”, aponta o documento, que menciona, como consequências, “falta de segurança pública, precariedade de circulação viária e dificuldade de acesso e transportes”.
A olhos nus, Evelyn conta que é possível flagrar agressões graves, como ruas que atravessam lagoas e muros que interrompem brejos. “Tem uma lagoa gigante que fazia um S, mas ela foi separada por ruas e se dividiu em quatro lagoas menores “, exemplifica.