Comissão de vereadores, famílias e professores levanta dados sobre impossibilidade do município cumprir o TAG
A comunidade de Vinhático, em Montanha, no noroeste do Estado, está unida contra a municipalização da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Padre Manoel da Nóbrega. Desde a assinatura do Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) do Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCE-ES), a comunidade escolar se colocou em alerta e formou uma comissão com objetivo de levantar os estudos necessários para impedir a municipalização.
O prefeito, André Sampaio (PSB), foi um dos 55 que assinou o acordo no último dia 15, contrariando o posicionamento das comunidades, que temem pelo fechamento das unidades municipalizadas.
É o caso da EEEFM Padre Manoel da Nóbrega, conforme relata a vereadora Maine Brito (PSB). Ex-aluna da unidade escolar, a parlamentar é uma das lideranças do movimento contra a municipalização. Ela conta que a comissão é formada por estudantes, professores, familiares de alunos, todos os vereadores e o prefeito de Montanha. Na terça-feira (20), quando foi constituída, após uma manifestação pública de repúdio ao TAG, o prefeito admitiu perante todos os presentes a impossibilidade de assumir a escola. “Ele falou sobre as muitas dificuldades que a prefeitura vai ter para manter a escola e entendemos que o fechamento é um risco real”, comenta Maine Brito.
“Ele disse que se sentiu obrigado a assinar o TAG, vendo seu nome e seu CPF no documento do Tribunal de Contas, mas que não tem condições de manter a escola”, relata a parlamentar, destacando a excelente infraestrutura conquistada após reforma recente, que inclui ar condicionado e televisão nas salas, sistema de monitoramento de segurança com câmeras e uma cozinha com capacidade para preparar mil refeições por dia.
“São cerca de 170 alunos e 40 funcionários. A escola está perfeita. Não podemos perdê-la, como já perdemos tanta coisa para Montanha. Muitos alunos já têm que acordar às 4h para poder chegar na escola, porque muitas escolas das comunidades rurais já foram fechadas. Vão ter que percorrer mais 15km quando a escola fechar?”, questiona.
A comunidade de Vinhático, afirma, apesar de sua importância cultural e econômica para o município, por meio de sua tradição de agricultura familiar, tem sofrido seguidas perdas para o centro da cidade, como hospital, caixa rápido e destacamento da Polícia Militar.
“O objetivo da Comissão é comprovar para o Tribunal de Contas que o município não pode assumir a escola Padre Manoel da Nóbrega. Temos até dezembro para entregar esse estudo e o plano de ação”, afirma.
Fechar escolas é a solução?
Em âmbito estadual, a proteção das escolas do campo vem sendo reiteradas vezes solicitada à Corte de Contas. Requerimentos protocolados nos órgãos, protestos públicos e reuniões já foram realizados, sob liderança do Comitê de Educação do Campo (Comeces) e seus movimentos sociais integrantes. Mas até o momento apenas as escolas de assentamentos da reforma agrária foram atendidas.
Na solenidade de assinatura do TAG, o temor das comunidades pelo fechamento de suas escolas do campo se mostrou absolutamente embasado na realidade que os conselheiros da Corte negam, mas que foi saudada como exemplo de sucesso pelos gestores municipais nordestinos que foram convidados a palestrar para os presentes.
Em Sobral, no Ceará, e Oeiras, no Piauí, mais da metade das escolas foi fechada, seguindo o receituário que é imitado pelo TAG do Tribunal de Contas.
Entre os 23 municípios que se recusaram a assinar o TAG, o caso de Santa Maria de Jetibá, na região serrana, é emblemático por mostrar a força que a mobilização comunitária tem. Inicialmente apta a assinar o acordo, a prefeitura voltou atrás, produziu um estudo detalhado das redes municipal e estadual atual, e declarou a impossibilidade de assumir as escolas dentro de um prazo menor do que seis anos.
A não adesão de cerca de um terço dos municípios é uma das conquistas da mobilização liderada pelo Comeces há um ano, avalia a integrante da coordenação colegiada do Comitê, Maria Geovana Melin. Outro avanço importante foi a prorrogação do prazo para implementação do termo, pois nem todos precisam se comprometer com a municipalização já em 2024, já que é o plano de ação de cada município que vai apontar essa data.
Luta é ampliada
A luta agora, sublinha, é pelo fortalecimento dos conselhos municipais de educação e de educação do campo, para que as comunidades possam proteger suas respectivas escolas da ameaça de fechamento.
Há também um movimento nacional de luta, visto que o modelo de Sobral e do TCE já está sendo apresentado em outros estados. O Fórum Nacional de Educação do Campo já está com o assunto em pauta e a Campanha Nacional pelo Direito à Educação também acompanha o debate.
Em passagem pela capital capixaba, o dirigente da Campanha e professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Daniel Cara, fortaleceu o pedido de diálogo com a Corte e a Secretaria de Estado da Educação (Sedu). “O Tribunal de Contas precisa concretamente abrir uma mesa de negociação com os movimentos e a Campanha para entender as críticas ao Termo de Ajuste de Gestão. Eu faço questão de, havendo essa abertura, trazer tanto o Comitê Capixaba quanto a coordenação geral da Campanha para dialogar com o Estado do Espirito Santo. Até pela influência que tem no país”, declarou.
O caminho que o Brasil precisa seguir, afirma, é fazer com que a gestão da educação seja entregue para educadores. “A gestão da saúde foi entregue para sanitaristas durante a pandemia, foi orientada pelas ciências da saúde. As políticas de educação também têm que ser orientadas pelas ciências da educação e feita por educadores e educadoras. Hoje quem faz a gestão não parte da ciência da educação, tampouco conhece a realidade das escolas públicas”.