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Secretário de Cultura é sabatinado por vereadores sobre contratações irregulares

Luciano Gagno tentou se esquivar de perguntas, gerando discussão entre ele e o vereador Anderson Goggi

O secretário de Cultura de Vitória, Luciano Gagno, foi sabatinado na reunião da Comissão de Cultura desta segunda-feira (3), após convocação para prestar esclarecimentos sobre contratações irregulares na pasta. A iniciativa é resultado de denúncia protocolada pelo vereador André Moreira (Psol), que já havia feito uma representação em face do gestor no Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES). Outras pessoas envolvidas no caso também terão que comparecer à Câmara.

A reunião começou com a abertura de fala para o gestor para esclarecer as denúncias. No entanto, ele se limitou a apontar o aumento no valor dos investimentos em cultura durante a administração do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos), que, de acordo com ele, passou, de 2021 para 2022, de cerca de R$ 2 milhões para uma média de R$ 8 milhões, sendo que no primeiro semestre deste ano “o investimento feito até então já alcançou a cifra do ano anterior”.

Também exaltou as formações artísticas culturais realizadas por meio de instrutores do Museu Capixaba do Negro (Mucane) e da Fafi; a retomada da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Vitória Rubem Braga; do Femusquim, no Morro do Alagoano; e do que chamou de “democratização do acesso à cultura”, que são apresentações culturais nas comunidades.

Como não tocou no assunto das supostas irregularidades nas contratações durante sua fala inicial, o presidente da Comissão de Cultura, Anderson Goggi (PP), passou a fazer perguntas mais diretas. A primeira foi se conhece Glaucia Regina Barcelos Dias, proprietária da Arty Serviços e Eventos Eireli, mãe de Ulisses Barcellos Dias, proprietário da UBD. Ulisses, por sua vez, é pai de Renato Lucas Ferrari Dias, proprietário da Luca Serviços e Eventos Eireli, algumas das empresas prestadoras de serviços para a Secretaria Municipal de Cultura.
Visivelmente desconfortável, Gagno questionou se o procedimento adotado por Goggi, de levantar questões de forma fracionada, era regimental. “Se não quer depor, diga que não quer depor”, refutou o presidente da Comissão, que teve apoio de André Moreira. “Quem determina o sentido do regimento é a Casa”, disse. Goggi se pronunciou novamente dizendo que as perguntas seriam feitas. “Se você vai se sentir no direito de responder ou não, aí já é problema seu”, sentenciou, explicando, em seguida, que fazer as perguntas de forma fracionada “dá mais clareza”.
Diante da resistência de Gagno, Goggi perguntou se o gestor conhece Regina Dias, João Vilas Boas Filho, Renato Lucas Ferreira Dias e Ulisses Barcellos Dias. Entretanto, percebeu que Gagno não anotava os questionamentos e destacou que, assim, o secretário não iria lembrar dos nomes, por isso, voltou a defender que as perguntas fossem feitas de forma fracionada, causando alvoroço em uma verdadeira torcida organizada de Gagno que se encontrava na Câmara. “Se os apadrinhados do secretário não se comportarem aqui, vou solicitar à segurança que esvazie o plenário”, disse, interrompendo a reunião temporariamente em seguida.
No retorno, o debate girou em torno da empresa Vitória Show Eireli, uma das prestadoras de serviço. Goggi perguntou se ela atendia as demandas da secretaria, se cumpriu todo o contrato, a forma de contratação e se a gestão municipal adere a licitações ou outras formas de contratação. Em seguida, o assunto foi o show do cantor Roberto Carlos, ocorrido em abril deste ano na Praça do Papa. Os questionamentos foram se o show foi público ou privado. No caso de ter sido privado, se o município tem intenção de fazer aporte, qual a finalidade disso, e o que traria de ganho para a cidade.
Também foi questionado se o ex-servidor da pasta, Ben Hur Henrique Sarandy Carneiro de Paula, apontado na representação ao TCE como uma das testemunhas das contratações irregulares, gerenciava as contratações. Gagno afirmou não se recordar se já havia conversado com as pessoas citadas e que a Vitória Show Eireli prestou o serviço “a contento”, além de dizer que não tem conhecimento de algum tipo de contratação terceirizada por parte da empresa. Disse, ainda, que Bem Hur fazia as fiscalizações e que a lei impõe, dependendo da situação, as seguintes formas de contratação: licitação ou contratação direta.
Quanto ao show do Roberto Carlos, afirmou que o patrocínio da prefeitura foi no sentido de vincular sua marca “ao maior artista brasileiro de todos os tempos, que é o rei”. Acrescentou que a atração musical fomentou não somente a cadeia cultural, mas também outras, como o setor hoteleiro e o de logística. Neste último, apontou procuras por alternativas de mobilidade, como Uber e Táxi.
Em relação à Vitória Show Eireli, Goggi colocou em dúvida a resposta do secretário apontando que, embora o gestor tenha dito que a empresa prestou seu serviço a contento, o contrato, previsto para findar em março de 2023, foi rescindido em novembro de 2022. Quanto ao show na Praça do Papa, afirmou que o aporte foi feito para o Convention Bureau, e não para o realizador do evento. “Será que chegou na ponta mesmo? Será que chegou no evento?”, questionou. Gagno, que por sua vez, garantiu que o contrato com a Vitória Show Eireli foi cumprido integralmente.
Quem também fez perguntas ao gestor foi André Moreira, que questionou se o secretário conhece Hudson Cribari Lyra, cuja empresa se encontra no mesmo endereço da UBD Produções e Eventos Ltda, em um imóvel residencial, e não comercial. Conforme consta na representação do vereador ao TCE, um artista ou banda local só consegue ser contratado pelo município de Vitória caso tenha contrato de exclusividade com uma das empresas citadas no documento, com o agenciamento de Hudson.
André também perguntou se as contratações são feitas por meio do empresário ou diretamente com o artista, e se Gagno havia passado contato do Bem Hur para Hudson, com o objetivo de atender as determinações desse último.

Outra pergunta feita foi no que o secretário se baseou para mudar o resultado final do Edital Edital 004/2021, da Lei Aldir Blanc, voltado para uma proposta de Intervenção Artístico-Urbana na Capital. De acordo com as denúncias, uma equipe com 39 artistas foi a vencedora inicial do certame, mas teria sido colocada em segundo lugar após uma avaliação do secretário de Cultura. Além de estar fora dos objetivos do edital, a equipe escolhida por Gagno, a Cores que Acolhem, também teria se inscrito fora do prazo previsto. 

Gagno respondeu que sua relação com Hudson é profissional, por causa das contratações de artistas feitas pela prefeitura, que são feitas de maneira direta por inexigibilidade, prática que afirma ser comum nas prefeituras e praticada há tempos na de Vitória.
O secretário disse não se recordar se passou para Hudson o contato de Ben Hur, a quem aponta como uma pessoa que se posiciona contra ele “por razões políticas, ideológicas e partidárias”, usando como prova  dessa afirmação o fato de o servidor ter assumido um cargo na gestão de Renato Casagrande (PSB) após sair da de Pazolini, desafeto político do governador. Falou também que Hudson pode ter pego o contato de Ben Hur diretamente com o próprio.

A resposta sobre a alteração do resultado do edital foi de que a comissão que avaliou os projetos atribuiu nota zero ao portfólio de artistas do Cores que Acolhem. Um desses artistas, relata, possui reconhecimento internacional. “Como autoridade hierarquicamente superior, competente para a análise do recurso, a nota zero para aquele artista não tinha razoabilidade nenhuma”, argumentou. 


André trouxe à tona o artigo 25 da Lei Municipal 8606, que trata das licitações, explicando que nela é previsto que o artista deve ser representado por empresa exclusiva. “Quando Hudson faz intermédio de artistas de outras empresas, há violação do dispositivo”, destacou.
Já finalizando a reunião, Vinícius Simões (Cidadania) afirmou que servidores do alto escalão da prefeitura tem parentesco com fornecedores, inclusive da Secretaria de Cultura, e perguntou se Gagno tinha ciência disso. O secretário afirmou não saber e disse que “só é problemático aquilo que é vedado pela lei”. 
Postagens e denúncias
No final de março, a juíza do 1º Juizado Especial Cível, Patrícia Leal de Oliveira, determinou que André e a integrante do Grito da Cultura, Karlili Trindade, excluíssem, no prazo de 24 horas, “as publicações referentes ao autor Luciano Picoli Gagno, ainda que de forma indireta à sua pessoa (particularmente considerada ou ocupante de cargo público, sobre os questionamentos relacionados à secretaria de cultura municipal de Vitória, até ulterior deliberação, sob pena de multa diária imputada a cada demandado, de R$ 2 mil, até o limite de R$ 10 mil em caso de descumprimento, sem prejuízo de majoração, conversão em perdas e danos ou revogação, devido à reversibilidade da medida”.
A determinação se referiu às postagens feitas pelo Grito da Cultura que diziam respeito a denúncias anônimas feitas ao MPES contra Luciano Gagno, envolvendo dois processos (n° 2022.0023.4984-00 e n° 2022.0025.2710-65, que tratavam de uma suposta atuação dele em um esquema de corrupção que envolveria contratações por inexigibilidade na Secretaria de Cultura e Secretaria de Direitos Humanos, além de um relato da operação de um suposto esquema.
O Grito da Cultura divulgou que o suposto esquema teria usado cinco empresas laranjas para diversificar as contratações, que teriam chegado a um valor de R$ 832 mil, somando 140 shows sem licitação. A denúncia, destacou o Grito, apontava que a influência aconteceria também nas contratações da Secretaria de Cidadania, Direitos Humanos e Trabalho, em eventos através do Procon Municipal, e que a cada contratação com o cachê básico da prefeitura, que é de R$ 5 mil, o secretário de Cultura receberia R$ 1 mil. Além disso, artistas com cachê no valor de R$ 50 mil e R$ 60 mil teriam sido contratados por R$ 120 mil.
A denúncia aponta o suposto esquema de desvios na contratação de empresas para serviços de locação de estrutura de gerador, iluminação e sonorização; de atestar como concluídas obras que não aconteceram, com “vista grossa” para subcontratações feitas proibidas pelo contrato; além do suposto recebimento de R$ 25 mil por parte do gestor para que modificasse as notas do edital 004/2021 da Lei Aldir Blanc e da contratação de uma empresa de entretenimento em julho de 2022 por R$ 5 mil para realização de um festival por ordem de Gagno, mas três meses depois, a empresa teria sido contratada por R$ 60 mil para duas apresentações, portanto, um aumento de 600%, que teria gerado R$ 8 mil para Gagno.
Na ocasião, Luciano Gagno foi procurado por Século Diário para se pronunciar a respeito das denúncias, mas não retornou. O Grito reivindicou apuração e, caso fosse confirmada a veracidade, a punição dos envolvidos. O gestor move uma ação de indenização por danos morais contra André e Karlili. Ele requer a condenação da ativista ao pagamento do valor de R$ 30 mil pela postagem e, no caso de André, de R$ 10 mil, pelo compartilhamento da publicação em suas redes.
Durante a reunião da Comissão de Cultura nesta segunda, Gagno falou sobre as denúncias feitas ao MPES, ironizando o fato de que as sete denúncias foram feitas no mesmo dia, no intervalo de cerca de sete minutos cada, portanto era “alguém se divertindo”, e que quatro já foram arquivadas, assim como a representação ao TCE.

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