Ministério da Educação oficializa diretrizes curriculares da Pedagogia da Alternância, após três anos de espera
A luta contra a ameaça de fechamento de escolas oriunda do Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) proposto pelo Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCE) recebeu um importante reforço a partir do Ministério da Educação (MEC), que formalizou, após quase três anos de espera, as Diretrizes Curriculares da Pedagogia da Alternância.
O ato se deu ao final da Marcha das Margaridas, quando o ministro da Educação, Camilo Santana, homologou a Resolução nº 1/2023 do Conselho Nacional de Educação (CNE). Assinada pelo presidente do colegiado, Luiz Roberto Liza Curi, a resolução refere-se ao Parecer nº 22/2020, emitido em dezembro de 2020, pelo mesmo CNE, atendendo a uma demanda apresentada pela União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas (Unefab), que representa os Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFA).
A Resolução entra em vigor a partir do dia 1º de setembro e “define princípios e valores para o ensino e aprendizagem, formação docente (inicial e continuada), referenciais pedagógicos e metodológicos para a execução da Pedagogia da Alternância nas modalidades da Educação Básica e da Educação Superior”.
“Para nós, do movimento da Educação do Campo, do Comitê Estadual e da Raceffaes, [Regional das Associações dos CEFFAs do Espírito Santo], é uma vitória da educação do campo em geral e de todo movimento de consolidação dos marcos legais para garantia do direito, das famílias camponesas de estudarem no lugar onde estão. Fortalece também aqui no Estado a luta contra o TAG, que vem na direção de novamente passarmos por um processo de fechamento de escolas nos municípios”, afirma o professor Chiquinho, representante da Raceffaes no Comitê de Educação do Campo do Espírito Santo (Comeces).
Satisfação semelhante é compartilhada pelo Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (Mepes), entidade que trouxe a Pedagogia da Alternância da França para o Brasil, instalando-a primeiramente em Anchieta, no sul do Estado, em 1969, e hoje é responsável por 18 Escolas Família Agrícola (EFAs) e quatro Centros de Educação Infantil em município de norte a sul do Estado, além de um hospital e maternidade em Anchieta.
“O Mepes, como integrante do Movimento da Pedagogia da Alternância do Brasil, articulado pela Unefab, celebra a conquista da homologação feita pela MEC. Ela é fruto da luta e resistência da Educação do Campo com a Pedagogia da Alternância e está no escopo de ampliar o acesso dos sujeitos do campo, águas e florestas e, demais biomas, às políticas públicas, através dos marcos regulatórios”, afirma Joel Duarte Benísio, gerente pedagógico do Mepes. “Outrossim, permanece a luta pelo financiamento pleno, acesso às demais políticas públicas vinculadas as matrículas do Fundeb, na compreensão do caráter público da oferta e gestão comunitária das escolas da Pedagogia da Alternância”, reivindica.
O Mepes, ressalta Chiquinho, faz parte de um grupo de trabalho que discute a resolução estadual da Pedagogia da Alternância, do qual participam também a Raceffaes, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e as superintendências e municípios que têm escolas com Pedagogia da Alternância, seja na educação básica ou no ensino superior, por meio das Licenciaturas em Educação do Campo (Ledoc). “A resolução nacional vai fortalecer a estadual. Se nós temos esse marco legal em nível nacional, podemos utilizar como elemento para mostrar aos municípios que educação do campo é um direito”, avalia. “Vai ser uma ferramenta para enfrentar as consequências que possam ter em relação ao TAG”, reforça.
A resolução, acrescenta, acontece num contexto político de resgate de espaços de luta pela educação do campo. “Também participamos do Fonec, o Fórum Nacional de Educação do Campo, que está discutindo o terceiro congresso nacional de educação do campo. Estamos numa nova etapa, num novo momento de mobilização. Temos que aproveitar esse momento histórico para novamente fortalecermos a Educação do Campo a nível nacional e também aqui no Espírito Santo”.
Parecer
No parecer de dezembro de 2020, o CNE fornece um histórico da Pedagogia da Alternância na França e no Brasil, elencando experiências diversas que a implementam, para além das EFAs, Mepes e Ledoc, como as Casas Familiares Rurais (CFR), as Escolas Comunitárias Rurais (Ecor), a Educação do Campo, a Educação Escolar Indígena, a Educação Quilombola, os cursos financiados pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) e os cursos de Pedagogia da Terra e de Licenciaturas Interculturais Indígenas.
Em 2020, informa o parecer, a Rede de CEFFAs “se espraia por cerca de 473 Centros em 22 unidades federativas”, sendo articulada a partir da Unefab e do Instituto Nacional das Casas Familiares, que integra as Associações Regionais das Casas Familiares Rurais (Arcafar), congregando EFAs, CFRs e Ecors.
Princípios e valores
Em seu artigo 5º, a Resolução afirma, entre os princípios e valores da Pedagogia da Alternância: o ensino e aprendizagem interligando conhecimento científico e tecnológico a saberes populares e tradicionais; e o compartilhamento da gestão administrativa e pedagógica entre estudantes, famílias, docentes e comunidades envolvidas.
O artigo 6º aborda as “dinâmicas pedagógicas que envolvem períodos de estudos letivos alternados entre Tempo Escola e Tempo Comunidade na Educação Básica, e Tempo Universidade na Educação Superior”.
E o artigo 7º pontua os “elementos estruturantes do projeto pedagógico na perspectiva da Pedagogia da Alternância: Mediações pedagógicas; Tema Gerador, Integrador ou Contextual; Plano de Estudo, Caderno da realidade, Caderno de Acompanhamento; Intervenção Externa; Visita, viagem de Estudo. Experiências Agroecológicas; Atividades de Retorno; Estágio, Projeto Profissional; Relatórios de Pesquisa, Trabalhos Interdisciplinares, Trabalho de Conclusão de Curso; Práticas de Ensino, Tutoria, Auto-organização; Encontros de Tempo Comunidade, Visita às Famílias; e Caderno Didático, Avaliação Coletiva, Avaliação por Ciclo Formativo, Avaliação de Habilidade e Convivência, Avaliação Institucional e Participativa.
Afirma ainda que “o currículo deve observar: o fortalecimento da agroecologia e das tecnologias sustentáveis, a convivência humana em diferentes biomas e climas, a economia solidária e a sustentabilidade da gestão territorial como parte dos processos formativos”.
Outras ações
Conforme informa o MEC, outras ações voltadas à melhoria da Educação do Campo no atual governo envolvem a recriação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi), que conta com a Diretoria de Políticas de Educação do Campo e Educação Escolar Indígena e uma coordenação-geral dedicada às políticas de educação do campo. Entre as atividades em andamento, estão “a retomada da participação social por meio da recriação das comissões nacionais de Educação do Campo, Educação Escolar Indígena, Educação de Jovens e Adultos, Educação Escolar Quilombola, entre outras”.