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‘Tem que respeitar o Compesca!’, afirmam pescador e pesquisador

Gestão de Pazolini publicou decreto e portaria sobre pesca assistida sem considerar estudos técnicos já elaborados

Reprodução

“A pesca em Camburi é de cardume, a gente cerca os cardumes. A profundidade é de três a nove metros de profundidade. A tainha é um peixe difícil de pegar. Não é capturado no anzol, é na rede. Se você lança uma rede de quatro metros de altura, não consegue pegar. Se colocar no fundo, ela passa por cima, se colocar boiado, ela passa por baixo. Dificilmente a pessoa vai pegar tainha com rede de quatro metros de altura”.

A descrição é do pescador artesanal Valquírio Sampaio Loureiro, um dos mais antigos e experientes de Vitória e que atuou diretamente nos estudos que durante três anos embasaram a minuta de normativa para a pesca assistida nas baías de Vitória e do Espírito Santo, na Capital capixaba, no âmbito do Comitê Estadual de Gestão Compartilhada para o Desenvolvimento Sustentável da Pesca (Compesca), que reúne quase trinta instituições públicas e privadas relacionadas com a pesca artesanal no Espírito Santo, incluindo órgãos federais, prefeituras e associações e colônias de pesca.

Em sua fala sobre a pesca da tainha em Camburi, Valquírio expõe a falta de conexão com a realidade do Decreto nº 22.742, publicado pelo prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) no Diário Oficial desta terça-feira (29), na mesma edição em que foi publicada também a Lei n° 9.959/2023, que “altera dispositivos da Lei nº 9.077, de 9 de janeiro de 2017, que proíbe a pesca com rede nas baías do Espírito Santo e baía de Vitória”.

A publicação oficial, no entanto, informa que o Decreto 22.742 “regulamenta a Lei Municipal nº 9.077, de 9 de janeiro de 2017, acerca da pesca assistida no Município de Vitória e dá outras providências”, e a divulgação oficial do evento realizado na manhã de terça-feira no Píer da Praia do Suá informa apenas sobre a publicação da lei, acrescentando que a regulamentação ainda seria elaborada: “a construção do decreto pelo município possibilitará a realização de conversas, que ocorrerão entre a equipe técnica da Prefeitura de Vitória e representantes dos pescadores”, sem qualquer menção ao Compesca.

Outro ponto que Valquírio aponta como falho no decreto é sobre o tamanho da rede. “Esses 400 metros serviriam se fossem esticados, mas como é uma rede de cerco, ela praticamente não vai ser nada, porque nesse cerco a gente costuma criar dois ganchos e cada gancho costuma comer 80 metros. [Com a rede de 400 metros], vai ter que fazer gancho com 50 metros”.

Há também uma falta de compromisso técnico ao impor que cada pescador só poderá cadastrar um tipo de rede. “A tainha dá durante três meses lá em Camburi, depois desaparece. Aí chega a pescadinha, depois desaparece. Depois chega a sarda. Cada tipo de peixe é uma malha diferente”, explica.

A decepção é enorme. “Não olharam nada que foi feito no Compesca. Tem que respeitar o Compesca! Tem que pedir informação ao Compesca, ao pescador, a quem realmente sabe! Não adianta ficar atrás de uma mesa escrevendo sem saber o que é”, afirma. “Fizeram o decreto sem ninguém saber de nada. O secretario de meio ambiente [Tarcísio Foeger] não entende nada de pesca, só quer saber de fiscalização de qualquer jeito e só em cima do pescador, que é o mínimo do que acontece na baía de Vitória. Tem que ver o que a cidade tá precisando de verdade, a poluição, o assoreamento”.

Secretário-executivo do Compesca, o analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Nilamon de Oliveira Leite Junior, que esteve à frente dos estudos para a elaboração da minuta de normativa, concorda com o posicionamento de Valquírio, acrescentando o ponto de vista da legislação federal e das unidades de conservação que existem na cidade, que precisam dialogar com as normativas municipais, conforme o Compesca vinha fazendo.

“O decreto aprovado não é o mesmo projeto discutido no Compesca. Na prática, eles liberaram a pesca com redes de espera, o que só vai valer para algumas áreas da baía de Vitória, fora dos canais de navegação. Nas outras áreas e na baía do Espírito Santo, a legislação federal continua proibindo a pesca. Outra coisa é que continua valendo a proibição para a pesca de rede dentro de unidades de conservação, que estão na Lei 9077 [de 2017]. Ou seja, na baía do Espírito Santo e em áreas da baía de Vitória, como Lameirão”.

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