MAB participa de audiência na Câmara dos Deputados com prefeitos e escritório britânico
A ação movida contra a Vale e a BHP Billiton por mais de 700 mil atingidos na Justiça britânica é tema de uma audiência pública na Câmara dos Deputados na próxima quarta-feira (20). A realização é da Comissão Externa para Fiscalização dos Rompimentos de Barragens e Repactuação, que tem como relator o deputado federal Helder Salomão (PT) e como presidente, Rogério Correa (PT-MG).
O parlamentar mineiro foi quem acolheu o pedido para realização da audiência, feito no início do mês pelo escritório internacional Pogust Goodhead, responsável pela ação em Londres. O CEO da empresa de advocacia, Thomas Goodhead, é um dos nomes já confirmados para a audiência. Também confirmaram presença o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e o coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Joceli Andreoli.
Para o MAB, a ação em Londres é fundamental para forçar um avanço em benefício dos atingidos por parte do Judiciário brasileiro e do processo de repactuação. “Precisamos fazer o debate sobre a ação em Londres, que tem um peso fundamental para pressionar as empresas e de fato garantir os direitos dos atingidos no Brasil. Participamos da audiência no Tribunal inglês [no início de agosto, que negou recurso da Vale para não ser julgada na Inglaterra] e temos expectativa que o Judiciário brasileiro acelere seu passo.
A gente sabe dos vínculos das empresas com o Judiciário brasileiro. Oito anos depois, elas não tomaram as medidas adequadas de reparação e compensação”, expõe Joceli Andreoli.
O coordenador do MAB acrescenta ainda a necessidade se combater a desinformação sobre a ação britânica. “Que a comissão externa da Câmara faça um bom debate. Tem sido criado um factoide de que essa ação ameaça a soberania nacional. Isso precisa ser esclarecido junto à sociedade brasileira, acabar com essa fake news. Essa ação pode ser fundamental para termos uma repactuação mais avançada”.
Últimas decisões
Duas das últimas decisões judiciais no Brasil indicam uma possível tendência de mudança de rumo do Judiciário brasileiro em direção aos direitos dos atingidos: a confirmação, pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6) da ilegalidade das comissões de atingidos criadas a partir de fevereiro de 2021 por um grupo de advogados de Baixo Guandu, sob condução do então juiz responsável pelo caso, Mario de Paula Franco Junior, e que vinham negociando indenizações com valores baixos e condicionadas à ilegal cláusula da quitação geral de danos; e a sentença emitida pela 4ª Vara Federal de Belo Horizonte, no mérito, determinando a inclusão de dezenas de comunidades costeiras capixabas nos programas de compensação e reparação de danos da Fundação Renova, conforme estabelece a Resolução 58 do Comitê Interfederativo (CIF).
Participação popular
A repactuação foi iniciada em junho de 2021, sob coordenação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas em setembro de 2022 foi suspensa por decisão dos órgãos de justiça e dos estados do Espírito Santo e Minas Gerais, que entenderam a impossibilidade de um acordo justo, diante da intransigência das empresas criminosas, conforme expuseram em comunicado público.
O processo foi retomado após a eleição do presidente Lula, sob promessa de maior foco nos direitos dos atingidos, protagonismo, no entanto, que continua em suspenso, sem haver sequer a garantia de uma cadeira para representantes diretos dos atingidos na mesa, hoje ocupada pelo Judiciário, as empresas e os estados. A participação popular é o foco da pauta de reivindicações entregue ao governo federal durante ato no final de agosto, em Minas Gerais.
Maior ação de alcance coletivo do mundo
O processo foi impetrado em 2018 e hoje representa mais de 700 mil atingidos no Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro, incluindo indivíduos, empresas, municípios, comunidades indígenas e instituições religiosas, vítimas do crime de novembro de 2015 cometido na Bacia do Rio Doce pelas mineradoras Samarco, Vale e BHP.
O valor atualizado da ação está em £ 36 bilhões (US$ 44 bilhões ou R$ 230 bilhões) e é considerada a maior compensação paga no mundo por uma empresa relativa a um crime ambiental, superando os US$ 15 bilhões da Volkswagen no escândalo do Dieselgate nos Estados Unidos em 2016 e os US$ 20,8 bilhões pela BP no derramamento de óleo da Deepwater Horizon em 2015. O valor também é muito superior aos £ 2,8 bilhões/US$ 3,4 bilhões que a BHP aprovisionou para cobrir sua responsabilidade pelo crime, levando a questionamentos sobre potencial negligência da mineradora frente aos seus investidores.