Pesquisa que apontou prisões arbitrárias e situação de “semi-servidão” será apresenta em Brasília
Representantes de povos indígenas Guarani e Tupinikim que vivem em Aracruz, no norte do Espírito Santo, realizam uma vaquinha para conseguirem viajar para Brasília, onde haverá o Seminário Cultura e Justiça de Transição Indígena na próxima segunda e terça-feira (11 e 12). Durante o evento, promovido pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI), haverá a entrega do relatório de uma pesquisa sobre os crimes cometidos durante o processo de implantação da Aracruz Celulose (atual Suzano), na década de 1960.
A ideia inicial era levar uma van até a Brasília, mas, devido aos gastos, que seriam elevados, decidiu-se que viajarão apenas um representante Tupinikim e outro Guarani. As doações podem ser feitas diretamente para a conta da Associação Indígena Tupiniquim de Areal, em Aracruz, através dos seguintes dados bancários: Banco Banestes; Agência: 165; Conta Corrente: 2725859-9; Pix/CNPJ: 19.266.784.0001-22.
“É mais que urgente a denúncia das violações de direitos daqueles que viveram durante a ditadura empresarial-militar brasileira, causadas pelo Grupo Aracruz Celulose S/A, com apoio do Estado ditatorial. Ajude essa campanha! O tempo é curto! Precisamos levar duas lideranças para testemunhar as violências que viveram neste período de terror do Estado”, diz o texto da campanha feita pela Associação Indígena Tupiniquim de Areal.
Coordenado pela professora Joana D’Arc Fernandes Ferraz, o projeto “A responsabilidade de empresas por violações de direitos durante a ditadura” reuniu 55 pesquisadores, sob a condução da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), através do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (Caaf), em parceria com o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP).
O estudo, que serviu de base para uma reportagem da Agência Pública, aponta que mais de 30 aldeias teriam desaparecido após a instalação da Aracruz Celulose no Espírito Santo, em 1967, e que cerca de 10 mil famílias quilombolas teriam sido expulsas do Território Tradicional do Sapê do Norte, entre São Mateus e Conceição da Barra.
O processo de implantação da empresa, segundo a pesquisa e também denunciado há décadas por movimentos sociais do Espírito Santo e Século Diário, envolveu prisões arbitrárias, emprego de trabalhadores em situação de “semi-servidão”, ameaças e expulsões executadas por seguranças armados, além de fraudes em documentos de posse de terras – tudo com a cumplicidade dos governos durante a ditadura militar.
A reportagem da Agência Pública descreve ainda a atuação dos seguranças nos territórios. “Armados, com revólveres à mostra e caminhando como se fossem xerifes. Em Aracruz, no Espírito Santo, essas cenas foram protagonizadas por um grupo de segurança que teria ligação com a Aracruz Celulose — multinacional produtora de celulose e eucalipto”.
“A gente sabe que as violações contra os povos nativos daqui foram imensas. Mas eu acredito que o Estado, as instituições de justiça e os próprios indígenas ainda não deram conta de mensurar a dimensão dessas violações. Essa pesquisa traz à tona que ainda existem reparações a serem feitas. Por mais que a gente tenha recuperado boa parte do nosso território tradicional, ele foi devolvido todo devastado, cheio de tocos de eucalipto, e o que tinha antes era uma diversidade imensa”, comenta o vice-cacique Maynõ Guarani, da aldeia Nova Esperança.