O juiz Ubirajara Paixão Pinheiro, da 5ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente e Saúde de Vitória, determinou que “o município de Vitória passe a custear os gastos em favor dos seus munícipes soropositivos (portadores de HIV), inerentes ao transporte público, para fins específicos de tratamento devidamente comprovado, nos termos da Lei Municipal nº 8.144/2011, desde que o munícipe também venha a preencher os requisitos inerentes à hipossuficiência previstos no art. 7° da LC 213/2001”.
A decisão é resposta à ação civil pública (ACP) movida pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), que pleiteou que a Companhia Estadual de Transportes Coletivos de Passageiros do Estado do Espírito Santo (Ceturb) “conceda o benefício da gratuidade do transporte coletivo às pessoas soropositivas e outras doenças crônicas imediatamente, às custas do município de Vitória, aos habitantes do município de Vitória que façam jus aos requisitos discriminados pela Lei Ordinária nº 8.144/2011, desde que para fins de tratamento devidamente comprovado que se adequem à hipossuficiência prevista no art. 7° da LC 213/2001”.
Na sentença, o magistrado aponta que por meio da Lei 8.144/2011, o município estabelece a gratuidade. “Desse modo, mesmo que não esteja mais gerenciando o transporte público, tem a obrigatoriedade de custear aos seus munícipes, portadores de HIV e doenças crônicas, em razão da execução da citada”. O juiz menciona, ainda, que a norma estadual LC nº 213/2001 “não estendeu o benefício da gratuidade para os portadores de HIV, mas apenas aos portadores de doença crônica”.
“À luz da Constituição Estadual, observo que não existe imposição de gratuidade dos transportes coletivos urbanos a todos portadores de quaisquer doenças ou deficiências (artigo 229 CE). Portanto, as hipóteses específicas, no que se refere à isenção tarifária no âmbito estadual, será regulamentada pela legislação local, aqui representada pela Lei Complementar nº 213/2001, a qual, convenhamos, não incluiu como deficiência os portadores de HIV, razão pela qual rejeito o pedido de chamamento do Estado do Espírito Santo para compor a lide”, diz a sentença.
O texto acrescenta que “o fato de ter havido a transferência da gestão do serviço e revogação dos dispositivos contrários não faz com que tenha ocorrido a revogação da Lei Municipal nº 8.144/2011, notadamente quando a garantia de gratuidade no serviço de transporte público aos portadores de doenças crônicas não ostenta caráter conflitante com o regramento estadual, mas sim garantia específica aos munícipes de Vitória/ES”.
Assim, “como apenas a legislação local do Município de Vitória que dispõe acerca da gratuidade dos portadores de HIV, apenas o Ente Municipal tem a obrigação de custear, aos seus munícipes, a gratuidade de transporte público para fins de tratamento devidamente comprovado, nos termos da Lei 8.144/2011, somando-se aos requisitos da hipossuficiência previstos no art. 7° da LC 213/2001”.
Em junho último, o desembargador Raphael Americano Câmara, da 2ª Câmara Cível de Vitória, indeferiu o recurso de agravo de instrumento, interposto pela prefeitura em face da decisão da 5ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Municipal, que determinou o cumprimento da Lei 8.144/2011.
No recurso, o município alegou que houve “completa e integral absorção do Sistema Municipal ao Sistema Transcol”, assim, “os termos antes firmados com as empresas permissionárias foram rescindidos”. “Dessa forma, argumenta que a Lei Municipal nº 8.144/2011, no que diz respeito à concessão de qualquer tipo de gratuidade de transporte pelo Município, perdeu a eficácia, diante da total transferência do sistema de transporte coletivo para o Estado”.
No entanto, a 2ª Câmara Cível afirma que “em primeira análise, parece claro que o fato de o transporte público encontrar-se sob administração do Estado do Espírito Santo não afasta a obrigação de que o Município de Vitória custeie a gratuidade legalmente prevista aos portadores de HIV e demais doenças crônicas, nos termos da Lei nº 8.144/2011”. Diz também que “ainda que a legislação estadual não possua previsão de gratuidade de transporte público para os portadores de HIV, esta deve ser garantida efetivamente pelo Município de Vitória/ES, uma vez que tal obrigação decorre justamente de norma local específica sobre o tema”.
Na decisão consta ainda que “o simples fato de ter havido a transferência da gestão do serviço e revogação dos dispositivos contrários não faz com que tenha ocorrido a revogação da malfadada lei municipal, notadamente quando a garantia de gratuidade no serviço de transporte público aos portadores de doenças crônicas não ostenta caráter conflitante com o regramento estadual, mas garantia específica aos munícipes de Vitória/ES”.