O Ministério Público Federal no Espírito Santo (MPF/ES) obteve na Justiça a condenação do empresário João Carlos Rodrigues Neto, administrador legal da Ilha da Baleia, também conhecida como Ilha da Xuxa, localizada próxima ao Farol de Santa Luzia, em Vila Velha. Com a decisão, ele fica proibido de impedir que a população utilize a praia situada no local, sob pena de multa. Além disso, deverá retirar as boias de sinalização instaladas de forma irregular no mar, que inibem a aproximação de embarcações.
Embora não seja proprietário da ilha, o empresário detém o título de foreiro de boa parte do terreno de marinha e do interior, o que lhe dá o direito de usufruir e administrar o local. No entanto, segundo a sentença da 4ª Vara Cível da Justiça Federal em Vitória, ficou comprovado na ação do MPF que ele utiliza métodos ilegais de intimidação para impedir a livre circulação da população na praia, o que é proibido pela legislação brasileira. Isso inclui a instalação de boias irregulares no mar, ameaças feitas por funcionários, uso de cachorros, entre outras técnicas.
Ao acolher o pedido do Ministério Público, a Justiça determinou que o foreiro não poderá mais praticar qualquer tipo de ação ou omissão que dificulte o livre acesso e o usufruto da praia por banhistas, esportistas e a população em geral. Pela decisão, ele está proibido de atear fogo ou realizar fogueira em qualquer local da Ilha da Baleia, incluindo a queima de lixo. Isso porque ficou comprovado que o método vinha sendo usado para afastar os banhistas. Além disso, a queima de lixo é proibida pela Lei de Crimes Ambientais.
O empresário também não poderá mais circular com seus cães ou permitir que eles transitem sozinhos na praia. O trânsito de cachorros pela areia das praias de Vila Velha é vedado pela Lei 3.052/95. Além de ilegal, a prática vinha sendo usada para amedrontar os visitantes e colocar em risco a população, conforme destaca a sentença. Em caso de descumprimento de qualquer uma das obrigações, a Justiça acolheu o pedido do MPF para que seja aplicada multa no valor de R$ 10 mil por infração constatada.
De acordo com a decisão, João Carlos Rodrigues Neto devia abster-se de praticar qualquer ação ou omissão que impedisse o acesso livre, a circulação e o usufruto da praia localizada na Ilha da Baleia pela população. A ação civil pública (nº: 5026757-14.2022.4.02.5001) do caso foi ajuizada em setembro de 2022, com decisão liminar da Justiça no mesmo mês. O Ministério Público ficou ciente da situação por meio de diversas denúncias recebidas pelo órgão, como em fevereiro de 2021, quando representações recebidas davam indícios do comportamento irregular do foreiro, inclusive com famílias informando que “o impedimento era feito com a utilização de cães da raça Rottweiler e ameaças verbais” do proprietário.
Em uma delas, foi relatado que “o dono utiliza dois seguranças agressivos que intimidam as pessoas, até mesmo com armas de fogo; soltam dois cachorros Rottweilers em cima das pessoas para expulsar da praia; e colocam fogo em folhas para que a fumaça incomode embarcações que eventualmente ancorem próximo da margem da praia dessa ilha. Foram colocadas irregularmente por ele boias para que nem sequer embarcações possam ancorar na frente da ilha e aqueles que ancoram o segurança pega um barco e vai intimidar as pessoas, passa a mão na cintura indicando estar armado e manda sair da frente da Ilha”.
Também foram realizadas diligências no local, com a presença do MPF, quando constatou-se que boias sinalizadoras continuavam no mar, gerando empecilhos à população que desejava desembarcar na praia. Um funcionário do empresário disse, na ocasião, que não havia sido autorizado pelo foreiro a apresentar a documentação que permitia que as boias estivessem ali. Ainda afirmou que abordava banhistas quando “entendia que estes estavam tendo comportamento que considerasse inadequado” e chegou a dizer que, “quando os banhistas estavam ouvindo músicas em volume alto, ‘soltava’ os cachorros para que o som se encerrasse e, assim, conseguisse dormir”.
Para o MPF, o histórico das diligências realizadas demonstra claramente que o empresário não cessou as intimidações, ameaças e obstruções de acesso à praia. O proprietário chegou a ser autuado administrativamente pela Capitania dos Portos, o que também não foi suficiente para garantir à população o acesso e uso pacífico da praia, até mesmo porque “nem a própria multa aplicada administrativamente pela Marinha demoveu o réu de continuar na conduta ilícita, multa, aliás, que nem mesmo foi paga por ele”.
De acordo com o procurador da República Carlos Vinicius Cabeleira, autor da ação, as praias são caracterizadas como bens públicos de uso comum do povo e, para tanto, devem possuir acesso livre e franco a elas e ao mar, em qualquer direção ou sentido. “A gratuidade decorre da própria generalidade de seu uso, pois, caso fosse oneroso, haveria discriminação daqueles que podem ou não utilizar o bem”, ressalta na ação.
Ainda de acordo com ele, “é inaceitável que o réu se comporte como proprietário da praia, utilizando métodos muitas vezes violentos contra as pessoas que se aproximam dela, impedindo o livre acesso à praia, bem de uso comum do povo, em total afronta à legislação vigente”.