Entram em cena os super-heróis e heroínas
A escola há muito deixou de ser o lugar de aprendizado técnico do mundo, para ser o para-choque das grandes contradições sociais. As pessoas que se propõem a trabalhar nela, em especial no exercício da docência, após um mínimo de 16 anos de estudo, se encontram preparadas para o desempenho da função na área de conhecimento que escolheu, mas ao chegarem à escola, defrontam-se com necessidades de conhecimento e habilidades muito além do que previa a licenciatura e especialização que cursou.
É no ambiente da escola que todas as contradições da sociedade desembocam. Desde a educação, vulgarmente chamada “modos”, relativa à convivência social com a ética da comunidade em que a criança está inserida, até aquela que forma o cidadão, enfrentando uma tensão relativa ao distanciamento do papel teórico do Estado ao que ele ali exerce, identificado no chão da escola e comunidade onde ela é estabelecida.
A criança chega à escola com seus conhecimentos, aqueles apreendidos na convivência familiar e com a comunidade. Estes sempre podem estar em desacordo com a moral e até com o mundo, porque a ética não é mais que a construção do modo de viver de um povo em um lugar e seu natural pertencimento a ela.
Na maioria das vezes, a incompetência do Estado em sua função permite o estabelecimento de éticas locais em desacordo até com a moral, aí a escola se torna um para-choque dessas contradições. Situação muito comum nas periferias, onde as leis são próprias e o Estado inoperante e insignificante para o modo de vida daquelas pessoas.
Para o professorado o problema é enorme, pois tendo que cumprir sua função de trazer as verdades da vida e ali representar o Estado, esbarra numa realidade que faz com que as verdades por eles apresentadas pareçam estranhas e, acima de tudo, contrárias às realidades vividas.
Como se não bastasse, a escola ainda enfrenta os patrulheiros do moralismo (ismo de patologia), que se veem no direito, muitas vezes, de invadir o ambiente da educação com seus preconceitos racistas, fundamentalistas ou ideológicos contraditos no processo educativo.
Assim sendo, educadoras e educadores são vítimas, pode-se dizer, do patrão e do cliente. O patrão os explora com baixa remuneração, contratos temporários de vínculos precários e exigindo muito mais que seu dever. Já o cliente, em sentido lato a sociedade, lhe exige uma função de trapezista, que representando um Estado deficiente e extremamente inoperante nos territórios de periferia ensina cidadania, respeito às leis e luta pelos direitos.
O resultado de tudo isso é um altíssimo índice de adoecimento, principalmente mental, dos profissionais da educação, e um enorme desânimo dos estudantes, revelado nos altos índices de evasão.
Tic, tac, tic, tac….
À parte a qualidade intrínseca dos educadores e educadoras de super-heróis e heroínas, alguma coisa precisa ser feita, com urgência, para salvar a educação!
Everaldo Barreto é professor de Filosofia