domingo, novembro 24, 2024
23.3 C
Vitória
domingo, novembro 24, 2024
domingo, novembro 24, 2024

Leia Também:

Como proteger a abelha nativa do ES e livrá-la do risco de extinção?

Cientistas e meliponicultores se unem para criar metodologia de reintrodução da Melipona capixaba na natureza

Divulgação

Cientistas, meliponicultores e servidores de instituições públicas do Espírito Santo e Minas Gerais estão unidas em um projeto de pesquisa científica para estudar a área de ocorrência, variabilidade genética, saúde, alimentação e impactos da poluição ambiental que incidem sobre a Uruçu capixaba (Melipona capixaba), para criar uma metodologia que permita reintroduzi-la na natureza e afastá-la do risco de extinção que está submetida atualmente.

O projeto “Uruçu Capixaba: uma estratégia multidisciplinar para conservar a abelha do Espírito Santo” foi selecionado pelo Fundo Nacional de Biodiversidade (Funbio). O objetivo central é “entender a atual distribuição geográfica e a variabilidade genética da Melipona capixaba, considerando a região afetada pelos rejeitos de lama na Bacia do Rio Doce, a fim de desenvolver ações para a preservação da espécie”.

Serão três anos de atuação, nos seguintes municípios: Afonso Cláudio, Águia Branca, Alegre, Brejetuba, Castelo, Colatina, Domingos Martins, Ibitirama, Itaguaçu, Itarana, Pancas, Santa Maria de Jetibá, Santa Teresa, Vargem Alta e Venda Nova do Imigrante.

As atividades são organizadas a partir de seis objetivos específicos: reavaliar a área de distribuição da espécie no Estado; revisar as principais coleções científicas do Brasil quanto a presença de registros da uruçu capixaba; avaliar os efeitos de poluentes sobre a biologia da espécie e sobre os produtos de seus ninhos (mel, pólen, geopropolis); avaliar a estrutura genética das populações amostradas; criar um programa de reintrodução da espécie em áreas protegidas localizadas em sua área de ocorrência natural; e desenvolver ações de educação ambiental de apoio à conservação da espécie.

A coordenação no Espírito Santo está a cargo do professor da Universidade Federal do Estado (Ufes) de São Mateus Vander Calmon Tosta e a coordenação mineira, com o professor Gustavo Martins, da UFV. O coordenador capixaba ressalta que o intuito é criar uma rede colaborativa entre as diversas entidades científicas tecnológicas capixabas e mineiras, que possa continuar promovendo a conservação da Melipona capixaba e avaliar os efeitos dos rejeitos contidos na lama que atingiu a bacia do Rio Doce sobre a espécie, em decorrência do crime da Samarco/Vale-BHP.

A reintrodução da abelha nativa capixaba na natureza, ampliando sua área de ocorrência atual, está prevista para acontecer no terceiro e último ano do projeto. “O professor Gustavo Martins tem ressaltado que essa é uma iniciativa pioneira no mundo: fazer a reintrodução de abelhas em áreas de preservação da natureza. Para isso, vamos conversar com gestores dos parques, como Pedra Azul, Forno Grande, Mata das Flores, Goiapaba-açú e Reserva Augusto Ruschi”, explana Vander. O objetivo é selecionar duas unidades de conservação para fazer a reintrodução. Tudo isso com a participação essencial dos meliponicultores.

A iniciativa precisa acontecer ao final do projeto, pois dependerá das ações e dados levantados nas fases anteriores. “Além da identificação de ninhos, pretendemos realizar análises sobre as características ambientais que são importantes para o estabelecimento e manutenção da espécie em determinada área geográfica e como o rompimento da barragem interferiu sobre essas características. Como as abelhas sem ferrão utilizam recursos hídricos para a manutenção das colônias, a presença e quantidade dos rejeitos liberados podem ter afetado direta ou indiretamente suas populações”, enfatiza. 

Vander acrescenta que, neste contexto, a expectativa é avaliar os impactos causados pelos poluentes da barragem no desenvolvimento, morfologia externa, microbiota intestinal e comportamento da espécie. “Analisar os efeitos destes resíduos sobre a biologia das colônias de Melipona capixaba é importante na tomada de decisões sobre a conservação e recuperação de suas populações”, explicam os pesquisadores, no material institucional do projeto.

“Pretendemos avaliar também os impactos destes resíduos nos produtos obtidos de ninhos (geoprópolis, cera, mel e pólen) localizados em regiões atingidas e não atingidas pelos rejeitos de lama. As abelhas podem entrar em contato com poluentes ao coletarem recursos na natureza, como pólen, néctar e matéria-prima para a construção dos ninhos. Neste sentido, larvas podem ser intoxicadas ao ingerirem pólen e néctar contaminados ou terem contato físico com partes do ninho contaminado. Estas vias de contaminação por xenobióticos são uma das responsáveis pelo declínio de abelhas nas últimas décadas”, pontuam.

O projeto é gerido pela Fundação Espírito-Santense de Tecnologia (Fest) da Ufes, com apoio da Universidade Federal de Viçosa (UFV); do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes); de autarquias estaduais, como os instituto estaduais de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) e de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper); de órgãos federais, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); e entidades da sociedade civil, como a Associação de Meliponicultores do Espírito Santo (AME-ES) e o Instituto Abelhas Nativas (IAN).

União dos setores

O trabalho em conjunto de meliponicultores, servidores públicos, pesquisadores e cientistas é um caminho promissor para proteger as abelhas nativas sem ferrão do Espírito Santo, no Brasil e no mundo, como bem destacou o doutor Carlos Gustavo Nunes da Silva, cientista e consultor do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), integrante da equipe do projeto Global bee

“A meliponicultura faz a reposição das espécies na natureza e promove o intercâmbio genéticos entre os grupos e espécies, todo um trabalho de diversificação do plantel de abelhas entre as espécies do mesmo bioma. As abelhas entre Domingos Martins e Alegre, por exemplo, na região das montanhas capixabas. Se as matas estivessem interligadas, um dia, naturalmente, elas se encontrariam e se beneficiariam dessa biodiversidade de uma e outa. Hoje a degradação ambiental não permite. Os meliponicultores é que fazem esse trabalho (…) Concordo muito com a ciência feita com o produtor. Com a ciência e os produtores unidos, todos saem ganhando”, expôs, em dezembro passado, ao divulgar os dados já levantados pelo projeto e as parcerias estabelecidas no Espírito Santo.

Mais Lidas