Arquiteta que participou da elaboração do projeto de restauro denuncia abandono do patrimônio
As ruínas da antiga Igreja de Nossa Senhora da Conceição, patrimônio histórico localizado em Guarapari, na região metropolitana do Estado, estão sob sério risco estrutural. O local também não conta com manutenção mínima, como ações de limpeza e capina.
A denúncia é da arquiteta Viviane Pimentel, que esteve no espaço nessa quarta-feira (6) junto de seus alunos do curso de Arquitetura e Urbanismo. Viviane participou da elaboração de um projeto de restauro das ruínas há dez anos, que nunca foi implementado.
A antiga Igreja de Nossa Senhora da Conceição fica no Centro de Guarapari, no Morro da Matriz. Ela foi erguida em 1677, por ordem do então donatário da capitania do que hoje é o Estado do Espírito Santo, Franciso Gil de Araújo. Naquela época, a outra Igreja de Nossa Senhora da Conceição, erguida pelos jesuítas em 1585, estava abandonada.
Segundo Viviane, existem boatos de que a igreja nunca foi concluída devido a um incêndio. Mas, durante a pesquisa histórica do projeto de restauro, foi encontrado o relato de um bispo que esteve em Guarapari em 1821, no qual dizia não entender porque a construção estava sendo destelhada para que as telhas fossem colocadas na igreja jesuítica.
Hoje, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição construída pelos jesuítas em 1585 está preservada, tendo sido tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Próximo a ela, as ruínas da igreja de 1677, da qual restaram algumas paredes e uma torre sineira, também foram tombadas pela resolução número 11/1989, do Conselho Estadual de Cultura (CEC).
Em 2013, moradores das proximidades das ruínas acionaram o Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), porque estavam preocupados de a torre cair em cima da calçada e ocorrer algum acidente. O MPES, então, exigiu da Prefeitura de Guarapari – naquele ano, o então prefeito Orly Gomes (DEM) iniciava seu mandato – a contratação de um projeto de restauro.
Após um processo licitatório, foi contratado o escritório Perini Muniz Arquitetura, e Viviane Pimentel entrou no trabalho de elaboração do projeto de restauro. A proposta final, encaminhada para a administração municipal entre 2014 e 2015, foi de consolidar as ruínas, mantendo o aspecto atual, porém sem o risco de mais perdas. O projeto prevê, também, a instalação de rampas para visitantes.
“Em 2013, nós fomos até o local para medir e avaliar. Entre a nossa ida e o nosso retorno, um mês depois, uma parede da torre sineira ruiu, e permanece assim até hoje, porque existe uma árvore que cresce e desestabiliza a construção. E o que a ruína tem de mais íntegro é a torre sineira. Se cair essa torre, com a cúpula e alguns ornamentos que existem na parede, ficarão só as quatro paredes externas da igreja, porque o frontão também já ruiu”, alerta Viviane.
Mesmo com o projeto pronto, ele nunca foi implementado, com a justificativa de falta de recursos. No início de 2023, já sob a gestão de Edson Magalhães (PSDB), a prefeitura pediu novamente o projeto ao escritório responsável pela elaboração, uma vez que a documentação não era mais encontrada internamente. Surgiu, naquele momento, a informação de que haveria uma verba do Departamento de Edificações e Rodovias do Espírito Santo (DER-ES) para, enfim, colocar a proposta em prática.
Viviane Pimentel relata ainda que, também no ano passado, o projeto foi apresentado em uma reunião do Conselho Municipal de Turismo de Guarapari. Entretanto, passados vários meses, não há novas notícias sobre o andamento dos processos.
Durante a visita ao espaço nesta semana, a arquiteta verificou que as ruínas estão em estado de abandono. Ela relata que o local está cheio de mato, pessoas em situação de rua têm ocupado a edificação, e há fezes pelo entorno. Duas árvores cresceram novamente por cima de uma das paredes, e as raízes entram e desestabilizam totalmente a edificação.
“Não sei em que pé está a execução do projeto. Sei que demora essa burocracia nos órgãos públicos, mas o projeto está todo pronto há muito tempo. E essa situação da igreja é muito delicada. Para além de não executar o projeto, ainda não dão manutenção nenhuma, a igreja está abandonada”, denuncia Viviane Pimentel.
Projeto será devolvido
O DER-ES informou, em nota, que “avaliou o documento e vai devolvê-lo para a Prefeitura de Guarapari sugerindo a contratação de um projeto de estabilização e restauro, por se tratar de uma edificação histórica. O órgão afirma que o Poder Executivo Municipal deve assumir os custos dessa obra, tendo em vista que ela necessita de especialistas em restauração de edificações e monumentos históricos”.
Século Diário também procurou a Prefeitura de Guarapari para comentar o assunto, mas não recebeu retorno até o fechamento desta reportagem.
‘Política estadual de preservação do patrimônio é frágil’
https://www.seculodiario.com.br/cultura/politica-estadual-de-preservacao-do-patrimonio-e-fragil