Estruturas do Terminal de Regência que seriam utilizadas no campus da Foz do Rio Doce têm sido demolidas
“É a maldição do petróleo”. A frase amarga resume o sentimento de profunda consternação com a atitude da Petrobras de demolir as estruturas do Terminal de Regência (TEREG), que seriam utilizadas no futuro campus do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) da Foz do Rio Doce.
Na avaliação do coordenador nacional do Centro Tamar do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (Tamar/ICMBio), Joca Thomé, destruir as estruturas é um desperdício de dinheiro público e uma falta de respeito com a população local, que anseia há muito tempo pela utilização pública daquelas edificações.
“A comunidade toda está esperando por isso há anos, mas a Petrobras sai sem deixar nenhum legado na região, depois de 40 anos de atividade. Nada, nem estrada, nem estruturas, nada. Só os impactos”, observa, em consonância com os múltiplos relatos feitos ao longo das décadas por moradores e ambientalistas sobre a tragédia do petróleo na região e o legado de graves problemas ambientais e sociais.
A demolição da casa principal do TEREG foi iniciada nessa terça-feira (12) e surpreendeu ao Tamar e aos moradores que acompanham o projeto. “Paredes grossas, feita na década de 1970, sem nenhuma rachadura. É um absurdo demolir estruturas que serão utilizadas. Gasto de dinheiro à toa, tanto pela Petrobras quanto pelo governo”, reforça o coordenador do Centro Tamar/ICMBio.
O gestor relata que a demolição teve início no Carnaval, mas com operações que atendiam ao projeto do futuro Ifes. “Retiraram as bases dos tanques [de armazenamento de petróleo], o que era para ser feito mesmo. Fizemos contato diretamente com a Petrobras, pessoalmente, com as pessoas envolvidas nessa operação, mas a informação era sempre de que a decisão de destruir tudo vinha da direção nacional”.
Ação civil pública
Joca Thomé explica que a proposta de aproveitamento do TEREG vem desde 2010, quatro anos depois que as operações com petróleo no terminal foram paralisadas. Em 2012, uma ação civil pública movida pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual (MPF e MPES) levou à paralisação total das atividades da empresa.
O TEREG se situa a cerca de 2 km da vila de Regência, no caminho até a Reserva Biológica (Rebio) de Comboios, unidade de conservação gerida pelo ICMBio. A princípio, o projeto previa um Centro de Ciência e Educação, depois evoluiu especificamente para um campus do Ifes. As conversas, conta, foram avançando, com total apoio do superintendente, Jadir Pela, e acompanhamento do diretor-geral do Ifes de Piúma, Marcelo Polese. “O projeto já foi para o Ministério da Educação e sua implantação deve ser anunciada pelo presidente Lula na próxima ‘leva’ de novos campi no País”, explana.
Doação do terreno
Em novembro passado, o governo do Estado oficializou a transferência do terreno para o ICMBio, depois de anos no processo de reconhecimento formal das terras como devolutas do Estado. Ocorre que, quando finalmente essa regularização do terreno foi finalizada, a Petrobras passou a pressionar pela destruição de toda as edificações.
O argumento, pontua o gestor do Tamar, é de que estaria atendendo a uma determinação da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Brasil (ANP), o que aponta não se sustentar. “A própria norma da ANP diz que as edificações e estruturas podem ser mantidas, desde que devidamente justificadas”, afirma, citando o Anexo I da Resolução ANP 817/2020.
Buscando exatamente essa justificação, o ICMBio emitiu parecer solicitando a manutenção das edificações, bem como o Centro Tamar e a Rebio de Comboios. “O parecer da Rebio é vinculante, ou seja, a Petrobras é obrigada a atender”, alerta o coordenador, que chama atenção para a postura também do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). “O Iema também está descumprindo o parecer da Rebio e do ICMBio. Temos tentado um diálogo desde que ele emitiu a licença para a demolição, no dia 24 de janeiro, mas somente hoje [quarta-feira (13)] o Alaimar Fiuza [diretor[presidente] vai nos receber”.
Segundo Joca Thomé, ainda é possível conservar algumas estruturas, como a escada que o projeto do campus pretende transformar em mirante, e o piso de paralelepípedo antigo. “É possível salvar algumas coisas e esperamos ter o apoio do Iema para isso”.