Projeto do governo institui cargo de nível superior socioeducativo, abrangendo cinco profissões
A Assembleia Legislativa aprovou, em sessão extraordinária nesta terça-feira (23), o Projeto de Lei Complementar 5/2024, que unifica diversos cargos do Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases). A proposta é vista pelos servidores como uma possibilidade de precarização dos serviços e, consequentemente, um prejuízo para a ressocialização dos socioeducandos.
O PLC, de autoria da gestão do governador Renato Casagrande (PSB), foi aprovado em regime de urgência. Apenas três deputadas estaduais votaram contra: Camila Valadão (Psol), Iriny Lopes e Janete de Sá (PSB).
De acordo com a proposta governista, que altera a Lei Complementar 706/2013, será criado o cargo de técnico superior de nível superior socioeducativo, que unificará os cargos de nutricionista socioeducativo, pedagogo socioeducativo, psicólogo socioeducativo, assistente social socioeducativo e terapeuta ocupacional socioeducativo.
Em sua justificativa, a gestão estadual argumenta que a proposta é uma “inovadora remodelagem feita nas carreiras com padrão remuneratório idêntico”, e que a unificação possibilitará “o ingresso de servidores com diversas formações profissionais para o desenvolvimento das atividades socioeducativas. Das 253 vagas ora existentes foram acrescidas 31 vagas, fruto da necessidade de suprir a carência de profissionais da área de Direito”.
No período de discussão do projeto, a deputada Camila Valadão afirmou que, de fato, o Iases precisa de um novo concurso. Entretanto, a proposta não contemplava a expectativa dos servidores, que a rejeitaram de forma unânime em assembleia do Sindicato dos Servidores Públicos do Estado (Sindipúblicos). Camila também acusou o governo de descumprir um acordo para retomar a mesa de diálogo com o funcionalismo antes de encaminhar o a proposta.
“Ao fazer a junção de todas as carreiras em um único cargo, unificando inclusive atribuições, a Seger [Secretaria de Estado de Gestão e Recursos Humanos] desconsidera as atribuições e competências profissionais estabelecidas em cada categoria. E isso, obviamente, tem impacto para a socioeducação”, discursou.
Janete de Sá também afirmou que foi procurada por assistentes sociais que estavam preocupados com a unificação de cargos, tendo em vista que essa categoria teve conquistas nos últimos anos. Para a deputada, ao colocar “todo mundo no bolo”, haveria o risco de desrespeitar legislações específicas de cada profissão. Ela pediu para que o assunto fosse esclarecido junto ao governo do Estado antes de a votação ser iniciada, o que não aconteceu.
Já o vice-líder do Governo, Tyago Hoffmann (PSB), defendeu que “não estão sendo abandonadas as habilitações específicas”, mesmo com a unificação. Sobre a questão das normas específicas de cada profissão, admitiu que não saberia dizer como a situação estava sendo tratada, mas rejeitou o pedido para adiar a votação por alguns minutos, por considerar que a matéria já estava “madura” e que eventuais emendas poderiam ser feitas posteriormente.
Manifestação contrária
No mês passado, os servidores estaduais divulgaram um documento destacando a contrariedade com a possibilidade de mudança nos cargos do Iases. O documento aponta a falta de diálogo com a categoria e a possibilidade de precarização dos serviços.
O texto também aponta para a possibilidade de descumprimento do que prevê o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), bem como o Protocolo de Intenções nº 03/2023 – celebrado para superar as irregulares vigentes e fortalecer a política socioeducativa, em compromisso do governo do Estado com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e órgãos estaduais de Justiça, como o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), a Defensoria Pública (DPES) e o Ministério Público (MPES).
O documento afirma ainda considerar a Resolução nº 119/2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que “dispõe sobre o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – Sinase e apresenta atribuições peculiares por categoria profissional, no âmbito do planejamento, formulação, gestão, execução e avaliação da política de socioeducação”.
Além disso, destaca que normativas relacionadas à Doutrina da Proteção Integral, instituída pela Lei 8.069/1990, do Estatuto da Criança e do Adolescente, e tratativas internacionais referentes à justiça juvenil das quais o Brasil é signatário, “reconhecem a importância da distinção dos diversos saberes e práticas que compõem a equipe técnica multidisciplinar”.
Teletrabalho
Na mesma sessão extraordinária, também foi aprovado por ampla maioria o Projeto de Lei Complementar 7/2024, que altera regras para o regime de teletrabalho no âmbito da administração estadual. Trata-se de mais uma proposta criticada pelo Sindipúblicos, que lançou um abaixo-assinado a respeito do tema.
Dentre os pontos negativos apontados estão a ampla autonomia, sem critérios objetivos e transparentes, para os gestores definirem quem poderá ou não atuar em teletrabalho; a exclusão dos servidores em estágio probatório; a alteração da idade mínima dos filhos de 12 para seis anos para os servidores obterem prioridade na seleção do teletrabalho; e a vedação da possibilidade do servidor com filho autista ou deficiente e beneficiário da redução da carga horária poder trabalhar no regime de teletrabalho.
Outro ponto levantado pelos servidores foi impedir o recebimento de abono, apesar de o servidor em teletrabalho cumprir o mesmo horário do funcionário em regime presencial. Além disso, a proposta exclui doenças crônicas para a requisição do regime de trabalho remoto.
Camila Valadão, que criticou a proposta no plenário, apresentou emenda para possibilitar que servidores em teletrabalho que tenham filhos com deficiência mantenham a redução de 30% na jornada de trabalho, da mesma forma que os funcionários atuando presencialmente. Iriny Lopes também apresentou emenda visando impedir que um servidor que tenha saído do teletrabalho a pedido da chefia, só tenha a possibilidade de pleitear novamente esse regime de emprego após dois anos, por considerar que isso poderá causar perseguições no serviço público.
Entretanto, nenhuma das duas emendas foram acatadas. Camila Valadão e Iriny Lopes foram as únicas que votaram contra o PLC.