Familiares da vítima acompanharam o julgamento, que terminou quase à meia-noite. Tiago Aranha vai poder recorrer em liberdade
O músico Tiago Passos Viana, o “Aranha”, assassino do professor de capoeira Cuarassy Pedro Medeiros Del Nery, foi condenado por homicídio simples no júri popular ocorrido nessa quarta-feira (5), em Conceição da Barra, norte do Espírito Santo. Tiago cometeu o crime em dezembro de 2020, na vila de Itaúnas, onde assassinou Cuarassy a tiros dentro de uma pousada. O assassino foi condenado a nove anos de prisão, não tendo sua alegação de legítima defesa reconhecida pelo júri. Porém, a pena foi reduzida pelo juiz Marcelo Loureiro para sete anos e seis meses, por atenuantes como ter confessado o crime, ser reú primário e ter se apresentado à polícia.
Os disparos que vitimaram fatalmente Cuarassy foram feitos dentro da pousada Bem-Te-Vi. Foram escutadas sete testemunhas durante o julgamento. A maioria confirmou que foram mais de três tiros desferidos contra a vítima.
Prestaram depoimento três moradores de Itaúnas, o Miguel, que gravou o vídeo no qual Tiago aparece na loja onde a vítima trabalhava, dando início a uma discussão entre eles e mostrando apenas dois segundos até os disparos; Lucas, um funcionário da pousada onde o crime aconteceu; e Ismael, um pedreiro que trabalhava na loja. A proprietária desse estabelecimento, Silvana Araújo, também depôs, assim como a ex-namorada do assassino, Dandara Loureiro, que solicitou depoimento a portas fechadas. As outras testemunhas foram Tiago, arrendatário da Pousada Cumbucá, ao lado da Bem-Te-Vi, e Alex Rodrigo Pereira, hóspede da Cumbucá.
O depoimento de Alex, que viu o crime do segundo andar da pousada onde estava hospedado, escancarou que a tese de legítima defesa, apresentada pelo assassino, não era verídica. Conforme relatou, após disparar os tiros, Tiago deu duas cadeiradas em Cuarassy, já caído no chão, o que foi confirmado em imagens da perícia apresentadas pela acusação, que apontaram hematomas na cabeça da vítima.
O assassino, por já ter cumprido três anos em prisão preventiva, ou seja, 1/3 da pena, vai poder aguardar em liberdade o trânsito em julgado do processo. Ainda cabe recurso. Depois, terá que se apresentar para cumprir o regime semiaberto até completar a pena.
Contudo, a sentença foi considerada uma vitória pela acusação e por familiares, pois a tese de legítima defesa foi derrubada e a “verdade dos fatos prevaleceu”. Além disso, a defesa de Tiago tentou reduzir a pena, sem êxito.
Antes da realização do júri, o advogado que atuou como auxiliar do Ministério Público Estadual (MPES), Israel Domingos Jorio, já havia avaliado que havia “grandes possibilidades de condenação do réu”, uma vez que o crime “não foi legítima defesa, e sim um assassinato frio”. “A vida de um jovem foi tirada de modo estúpido, é algo que não se pode deixar passar em branco”, enfatizou o advogado.
Tiago foi a júri popular após dois anos da sentença proferida pelo juiz Leandro Cunha Bernardes da Silveira, que também não acatou a tese de legítima defesa. Na decisão, o magistrado afirmou que há “provas suficientes nos autos para levar o acusado ao Tribunal do Júri, considerando os depoimentos prestados, laudo pericial, mídia anexada e o próprio interrogatório do réu”. Na fase inicial, foram ouvidas 11 testemunhas.
Quanto à tese de legítima defesa, o magistrado destacou que não foi “amplamente comprovado nos autos”, por não preencher integralmente os requisitos do artigo 25 do Código Penal, pois “foram desferidos ao menos três disparos de arma de fogo contra a vítima, caindo por terra a tese de uso ‘moderado’ dos meios”. O juiz concluiu dizendo que entende “imperiosa a pronúncia do acusado”, por não haver “provas a justificar a absolvição sumária” e por existir “indícios de autoria delitiva dos crimes narrados, bem como prova da materialidade do delito”.
Cuarassy tinha 39 anos e deixou dois filhos. Ele frequentava Itaúnas desde criança. O crime gerou comoção e revolta na comunidade, ganhando ampla repercussão. O professor de capoeira foi enterrado sob homenagens no Cemitério Santo Antônio, em Vitória, com sucessivas cobranças pela rápida elucidação dos fatos e a prisão de Tiago Aranha, que passou quase seis meses foragido. Guará ensinava o esporte para crianças em várias escolas de Vitória.
Tiago jogou a arma em um rio para impedir a perícia, dificultando as investigações e a produção de provas, como apontou a denúncia do Ministério Público Estadual (MPES). O assassino fugiu do local do crime, apresentando-se à Delegacia Regional de São Mateus somente no dia seguinte. Em depoimento à Polícia, afirmou que adquiriu a arma, sem registro, cinco dias antes, e passou a andar com o armamento em local público.
“A vítima trabalhava em uma loja. Na ocasião, o denunciado chegou, os dois iniciaram uma discussão e entraram em luta corporal. Mesmo com moradores pedindo que o acusado se afastasse, ele foi ao interior de uma pousada e, após pegar uma arma de fogo, atirou contra a vítima, que morreu no local”, relatou o Ministério Público na fase inicial do processo.
Tiago chegou a ser preso no mesmo mês em que cometeu o crime em São Mateus, mas foi libertado em janeiro de 2021, por ato do juiz Diego Franco de Santanna, que alegou excesso de prazo previsto para a conclusão do inquérito policial e sua entrega espontânea à Polícia. O magistrado não considerou, porém, o período de dez dias em que ele deixou de se apresentar após a decisão judicial que determinou sua prisão, publicada um dia após o crime e amplamente divulgada pela imprensa capixaba. Em fevereiro de 2021, o mesmo juiz decretou a prisão preventiva de Tiago, que após meses foragido da Justiça, foi preso em julho do mesmo ano, em Colatina, noroeste do Espírito Santo.
‘Não foi legítima defesa, e sim um assassinato frio’
https://www.seculodiario.com.br/justica/nao-foi-legitima-defesa-e-sim-um-assassinato-frio
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