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Guarda de Vila Velha enfrenta conflito judicial entre agente e comandante

Heber Felipe Lacerda acusa Landa Marques de assédio moral; ela entrou com processo por perseguição

Heber Felipe Lacerda

A Guarda Municipal de Vila Velha (GMVV) vivencia um grave conflito entre sua comandante e um de seus agentes. O guarda Heber Felipe Lacerda acusa a subsecretária Landa Carretero Nunes Marques Sartori de assédio moral. Landa, por sua vez, alega perseguição e registrou Boletim de Ocorrência (BO) na Polícia Civil, iniciando uma ação contra seu subordinado. Um processo administrativo contra o agente também foi instaurado em abril.

Heber ficou impedido judicialmente, por seis meses, de se aproximar de Landa, inclusive no ambiente de trabalho. Entretanto, a medida cautelar foi revogada na última terça-feira (8), pela juíza Fabrícia Gonçalves Calhau Novaretti, do 1º Juizado Especial Criminal e Fazenda Pública de Vila Velha, acolhendo entendimento do Ministério Público do Estado (MPES) de que não foi configurada a perseguição.

Na última sexta-feira (11), Heber pendurou uma faixa de protesto contra a sua chefe em frente à base da Guarda Municipal, no bairro Novo México. A faixa dizia: “Landa, comandante da Guarda, chega de assédio moral! Prefeito [Arnaldinho Borgo, do Podemos], tome providência!!!”. Um vídeo compartilhado pelo agente nas redes sociais mostra Landa retirando a faixa, sob protesto de Heber, que fala em “liberdade de expressão”. Um outro guarda também aparece filmando a situação.

Apesar de ser a figura mais crítica à comandante, Heber afirma que muitos guardas têm as mesmas reclamações e não se manifestam por medo de represálias. Landa é subsecretária da GMVV desde 2021, e queixas contra ela teriam começado a surgir nos últimos dois anos e meio. Entre as reclamações dos agentes está a proibição de se alimentar e de se sentar para descansar durante as escalas de trabalho.

“Ela não aceita nenhuma crítica. São críticas legais, fundamentadas. A liberdade de expressão é um direito humano previsto no inciso 4º do artigo 5º da Constituição. Ela simplesmente não aceita que um cidadão exerça a cidadania. O assédio moral que ela pratica é sempre velado, por baixos dos panos”, comenta Heber.

Em decisão do último dia 25 de abril, a juíza Mariana Lisboa Cruz determinou, cautelarmente, que Heber fosse impedido de frequentar os mesmos espaços que Landa, incluindo os de trabalho. Houve solicitação para a decretação de prisão do guarda, o que foi descartado pela magistrada, que também indeferiu pedido de suspensão do porte de arma de fogo.

No dia 17 de maio, o juiz Idelson Santos Rodrigues reformou parte da decisão judicial anterior, passando a permitir que Heber pudesse frequentar os ambientes de trabalho – mas com a condição de se “limitar ao trajeto da porta de entrada da base da GMVV até a sua sala/viatura, sem manter contato com a suposta vítima, mesmo que de forma indireta, permanecendo a uma distância mínima de 200 metros”.

Apesar disso, Heber Felipe afirma que foi afastado do trabalho por quatro meses, seu salário foi diminuído à metade, e também teve o porte de arma retirado – ele ainda está desarmado, porque não conseguiu renovar o registro durante o período de afastamento. “A comandante me afastou com base em leis administrativas do município. Ou seja, como ela não conseguiu isso na Justiça, usou o poder dela para manejar as leis que estão ao seu alcance”, afirma.

Século Diário não localizou, em pesquisas no Diário Oficial de Vila Velha, registros do afastamento de Heber Felipe. Mas os dados do Portal da Transparência da prefeitura apontam que ele teve, de fato, diminuição da remuneração. Isso porque, além do salário efetivo, existem as verbas relativas a gratificações e escalas extras.

Entre abril e maio deste ano, seu salário efetivo passou de R$ 2,5 mil para pouco mais de R$ 2,6 mil. Mas a remuneração por escalas extras de trabalho desapareceu nesse período. Assim, a remuneração líquida de R$ 9,2 mil em abril caiu para R$ 5,7 mil em maio, R$ 3,8 mil em junho, R$ 4,4 mil em julho, R$ 4,1 mil em agosto, e o mesmo valor em setembro. Heber relata que precisou da ajuda de colegas para equilibrar as contas nesse período.

Em julho, Landa alegou que Heber Felipe descumpriu a medida cautelar e solicitou a decretação da prisão preventiva dele, o seu afastamento das atividades funcionais e a decretação do sigilo dos autos. Entretanto, a juíza Mariana Lisboa Cruz determinou apenas o sigilo do processo, impedindo o guarda de compartilhar documentos nas redes sociais e em aplicativos de mensagem.

Posição do MP

No último dia 13 de setembro, o promotor de Justiça Jorge Zagotto manifestou-se pelo arquivamento do processo, sendo acatado pela juíza Fabrícia Gonçalves no mês seguinte. O integrante do Ministério Público afirmou “inexistir qualquer conduta delituosa, mas sim uma forma de Heber Felipe se mostrar contrário à atuação de Landa como subsecretária, irresignação esta que poderia ser destinada a qualquer outro que estivesse em tal posição”.

Jorge Zagotto cita um episódio em que Heber Felipe colocou para tocar a música “Hino da Vitória”, da cantora gospel Cassiane, nas dependências da GMVV, e a comandante entendeu como uma manifestação contra ela. De acordo com o promotor, o registro do episódio mostra apenas o guarda filmando a si mesmo enquanto escuta a música, sem nenhuma palavra ou reação contra a chefe. Heber argumentou, em contato com Século Diário, que estava apenas escutando um “louvor” na ocasião, sem indiretas para a sua chefe.

Além disso, o promotor argumentou, baseado em prints de conversas de um grupo de WhatsApp dos guardas, que a insatisfação com a postura de Landa era compartilhada por outros guardas, e as mensagens de Heber não apresentavam tom de ameaça ou de qualquer outra conduta criminosa.

O promotor relatou, ainda, que os depoimentos das testemunhas mostraram uma dicotomia entre partidários de Landa e de Heber Felipe, o que considerou normal naquele contexto. Contudo, destacou que “há relatos preocupantes como, por exemplo, de represálias para com aqueles que questionam atos da chefia, de grande quantitativo de agentes afastados por sobrecarga de trabalho e por abalo da saúde mental, etc”.

A manifestação de Jorge Zagotto destaca, por fim, que “qualquer posição de liderança está fadada a desagrados, seja na esfera pública ou privada, e o caso em testilha demonstra claramente tal fato, onde alguns Guardas Municipais, discordando da atuação de sua Chefia como, por exemplo, não poderem se alimentar durante a escala de trabalho ou não poderem sentar para descansar quando estiverem em patrulhamento, passam a questionar, reclamar e buscar meios para serem ouvidos e atendidos, podendo chegar a usar seu tempo de descanso para reivindicações, como Heber Felipe fez”.

Em outro caso, em 2019, um processo administrativo foi instaurado contra Landa Marques, por ter sido flagrada dando chutes no rosto do advogado Guilherme Pereira Butkowski. O advogado foi pego dirigindo bêbado, mas já estava contido por outros dois Guardas Municipais quando a agressão teria ocorrido. O caso também tramitou na Justiça estadual, mas a subsecretária foi absolvida em 2022, porque o juiz entendeu que o crime havia prescrevido.

Século Diário questionou a Prefeitura de Vila Velha sobre a situação na Guarda Municipal e as sanções aplicadas a Heber Felipe Lacerda, colocando-se também à disposição para ouvir as argumentações de Landa Marques em separado. Não houve retorno até o fechamento desta reportagem.

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