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Jogos Tradicionais Indígenas terão terceira edição em Aracruz

Evento começa dia 15 de novembro, com oito modalidades e apresentações culturais

Arco e flecha, zarabatana ao alvo, arremesso de lança, bodoque ao alvo, corrida com tora, corrida livre, luta corporal e cabo de guerra. Estas oito modalidades fazem parte dos Jogos Tradicionais Indígenas do Espírito Santo, cuja terceira edição ocorrerá entre os próximos dias 15 e 17, na aldeia Caieiras Velha, em Aracruz, no norte. A programação oficial ainda será divulgada na página dos Jogos no Instagram.

Aberto ao público, o evento inclui, além da competição nas modalidades, outras atividades como debates, apresentações culturais, desfile de moda ancestral, exposições de fotos e artefatos e comercialização de artesanatos. “Os jogos são um momento de encontro entre as comunidades. Claro que existe competição, mas na verdade é um momento de celebração, de brincadeira, de zoação. É quando os amigos se encontram, é uma celebração da vida mesmo”, conta Jocelino Tupinikim, um dos idealizadores e coordenador dos Jogos Tradicionais, criados a partir dos Instituto Indígena Cocar e agora realizados pela Associação Indígena Tupinikim e Guarani (AITG).

Jocelino Tupinikim, idealizador e coordenador dos Jogos Tradicionais Indígenas. Foto: Divulgação

“A gente tem relatos de memórias de atividade que já aconteceram, recupera esses vínculos, vai se construindo enquanto comunidade tradicional, e aprende uns com o outros”, avalia Jocelino, que lembra que o evento reúne participantes das 12 aldeias existentes no Território Indígena Tupinikim e Guarani. Além dessas duas etnias, também marcam presença famílias Pataxó e Pancararu, que vivem no território, além de convite a visitantes de outras comunidades que lutam pelo reconhecimento étnico por parte do Estado, em locais com Areal (Linhares), Itaúnas (Conceição da Barra) e Chapada do A (Anchieta).

Muitas das modalidades estão ligadas a fazeres e ofícios do cotidiano das comunidades tradicionais, com caça, pesca e busca de lenha para cozinhar. O bodoque, por exemplo, instrumento que atira pedras e era usado pelos mais antigos para caça, era pouco conhecido pelos jovens e agora vem sendo retomado por meio do esporte.

Protagonismo jovem

Nos Jogos Tradicionais Indígenas do Espírito Santo, os competidores precisam ter ao menos 15 anos, com exceção das modalidades de corrida com tora e luta corporal, em que o mínimo é de 17 anos, mediante autorização dos pais para os menores de 18, devido ao maior risco de lesão.

São justamente os jovens os principais mobilizados e mobilizadores em torno dos jogos. Alguns deles se reuniram no coletivo Taba Oiepengatu (Aldeia Unida), com o propósito de levar treinos dos esportes culturais até as comunidades para incentivar os moradores a se exercitarem ao mesmo tempo em que o projeto ajuda a fortalecer a cultura local. “Jovens que nunca estiveram envolvidos nessa parte mais tradicional começaram a se conectar por meio dessas atividades que os jogos promovem, é jovem incentivando jovem, um puxando o outro”, relata Jocelino. Com os treinamentos, a participação das mulheres também vem sendo estimulada e promete crescer ainda mais nesta terceira edição.

Iran Santana, do coletivo Taba Oipengatu, realiza treinamentos nas comunidades como preparivos para os Jogos. Foto: Renata Apolinario

O clima de brincadeira prevalece, mas na hora da competição, os atletas levam com muita seriedade e responsabilidade. Não há grandes premiações, apenas brindes oferecidos por patrocinadores e, é claro troféus e medalhas, feitos por Augusto Vaz, artesão da etnia Guarani que mora no território.

Uma novidade deste ano é o incentivo à disputa coletiva nas modalidades, além da competição individual, que permanece. Assim, a rivalidade saudável entre grupos e aldeias deve surgir e aumentar a cada edição.

Jocelino também vislumbra a possibilidade de formação de atletas olímpicos a partir dos jogos e dos territórios, já que muitas modalidades tradicionais se assemelham a esportes praticados nos Jogos Olímpicos, como o arco e flecha, a corrida livre, a luta corporal, que lembra o judô, e a luta greco-romana, ou o arremesso de lança, com fácil alusão ao arremesso de dardo. “É preciso apoiar para que as escolas possam realizar os jogos da rede com essas modalidades. Ajuda a empoderar as juventudes, tirando elas das margens da criminalidade. Estamos em locais totalmente impactados por indústrias, contextos em que crescem crimes como o tráfico de drogas”, avalia.

Histórico dos Jogos

A primeira edição do evento aconteceu no ano de 2018, com a proposta de ser bianual. Em 2020, porém, a pandemia de Covid-19 impediu a realização dos Jogos, que foram postergados para 2022. A comoção causada pelo terrível atentado em escolas de Coqueiral, no município de Aracruz, próximo à data prevista para as atividades, levou ao cancelamento do evento, que só foi realizado em 2023. Pra retomar as datas em anos pares, os jogos voltam a acontecer em 2024.

Desde o início, a proposta é posicionar os jogos dentro do calendário estadual e buscar reconhecimento e apoio para que as atividades possam acontecer com regularidade. Pela segunda vez o evento terá dentro da programação um seminário, que trará como tema “Os jogos tradicionais indígenas como potencializador cultural, esportivo, recreativo, econômico e turístico”, buscando um diálogo intersetorial da comunidade com diversos espaços governamentais.

Debate com autoridades faz parte da programação, buscando consolidar os Jogos no Espírito Santo. Foto: Renata Apolinario

A Lei 11461/2021, de autoria da deputada estadual Iriny Lopes (PT), aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada pelo governador Renato Casagrande (PSB), reconhece os Jogos Tradicionais dos Povos Indígenas Tupinikim e Guarani do Estado do Espírito Santo, prevendo sua realização a cada dois anos , e jogos locais em cada aldeia nos anos em que a competição geral não acontece. Porém, o desafio de fazer valer políticas que de fato garantam as realizações das atividades ainda existe, motivo pelo qual o evento segue realizando este tipo de debate. Há intenção também de mobilizar um público maior para além das comunidades, o que garante maior visibilidade a nível cultural e maior geração de renda no território, já que as aldeias se mobilizam para levar seus produtos durante as atividades.

Há ainda ambição de atividades maiores para o futuro, como o sonho de realizar em Aracruz jogos regionais. “Se conseguirmos trazer povos do Rio de Janeiro, do norte de São Paulo, do leste de Minas Gerais e do sul da Bahia para ficar nas regiões mais próximas, conseguirmos juntar uns 15 ou 16 povos indígenas, poderíamos ter uma semana de jogos, com apresentações culturais, mesas de debate, culminando em uma data de feriado, que possibilitaria um grande público”, comenta Jocelino Tupinikim.

“Mas será que a nível municipal estamos preparados turisticamente para receber esses jogos regionais com gente de vários lugares do país?”, questiona. “Precisamos trabalhar junto com secretarias de Turismo, Desenvolvimento, Cultura, Esporte, do município e do Estado, para trazer uma estrutura maior que possibilite isso”, avalia o coordenador dos jogos.

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