O que mais fariam as mulheres naqueles tempos?
Lucy foi uma das muitas mulheres imortalizadas pelos Beatles, mas não foi uma referência a drogas, embora flutuasse em céu de marmelada envolta em diamantes. E teve a honra de emprestar seu nome a outra mulher, que viveu cerca de três milhões e duzentos mil anos antes de John Lennon encontrar sua Yoko.
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Em um talvez ensolarado final de novembro, 1974, na Etiópia, arqueologistas encontraram os restos da primeira mulher que podia caminhar ereta, como nós andamos hoje, se a artrite ou outras complicações não se intrometessem. Nesse mesmo ano, um exército de oito mil guerreiros em terracota foi encontrado na China, obra de um sanguinário imperador louco.
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Lucy não sabia dessas sutilezas. Ela não foi a primeira mulher, porém, foi a mais importante. Mescla de humana e símia, é a prova viva, ou morta, de que Darwin estava certo. Deveria se chamar Eva, a primeira mulher – prova viva, ou morta, de que nossa gloriosa raça é bem mais velha do que pensávamos.
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Pouco sabemos sobre Lucy, se era alegre ou triste, se gostava de rabiscar figuras abstratas nas paredes de alguma caverna. Talvez dançasse… O que mais fariam as mulheres daqueles tempos? Não precisavam lavar louça nem roupa, não plantavam nem colhiam, não passavam pó de semente de urucum no rosto. Escolhiam ou esperavam ser escolhidas?
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Caçavam com os homens ou tinham a honra de preparar o alimento da família? Provavelmente viviam em bandos, por questão de segurança e não por orgulho familiar. Os ‘casamentos’ seriam também ditados por questões de seguranca – os homens mais fortes e mais hábeis eram os mais desejados. O que não difere muito de nossa modernidade, quando os machos da espécie se esmeram nas academias para adquirir massa óssea.
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Ela era baixinha, um metro de altura, com músculos fortes, indicando que andava muito, provavelmente em busca de alimentos. Tinha o cérebro menor que os nossos, porém maior que o dos macacos. E talvez pensasse – quem é esse deus silencioso que me ilumina e aquece, depois se esconde mas sempre volta?
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Imagine-se nesse mundo rudimentar, onde Lucy talvez sonhasse com outras possibilidades… Flutuar num céu de marmelada, entre essas infindáveis gotas que brilham sobre sua cabeça…Lucy no céu, muito longe dos diamantes.