Governo atua contra o desenvolvimento ambiental e social
Participei da audiência pública de iniciativa da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa em Itaúnas, Conceição da Barra, no norte do Estado, para tratar do projeto de concessão dos parques estaduais capixabas. De iniciativa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e estabelecido em 2020, a proposta tem como objetivo “aprimorar a qualidade dos serviços prestados e melhorar a experiência dos visitantes nos parques estaduais”. Poderia ser um alento para as Unidades de Conservação (UCs) do nosso Estado, que pouca atenção tem tido por parte das instituições responsáveis, mas o Governo Casagrande está na contramão do desenvolvimento ambiental e social.
Os parques estaduais estão abandonados e carecem de investimentos em pessoal técnico especializado, regularização fundiária, fiscalização, planejamento e infraestrutura adequada para atender aos seus objetivos. Vale dizer que, de acordo com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), o objetivo primordial dos parques é “a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, e possibilita a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.”
Portanto, o turismo ecológico como instrumento de conscientização ambiental é uma atividade importante a ser desenvolvida nos parques e que merece a devida estrutura para atendimento aos visitantes. Porém, o Programa Estadual de Desenvolvimento Sustentável das Unidades de Conservação (Peduc) do governo do Estado parece não ser condizente com esses objetivos.
Me surpreende que toda informação que a população capixaba tem a respeito foi apresentada de forma superficial pela imprensa. É preciso enfatizar a falta de transparência na condução do processo. Acreditei que a audiência pública iria iniciar com a apresentação dos avanços do programa pelos representantes do poder público presentes na reunião, mas isso não aconteceu. Chama a atenção o alto custo pago à multinacional Ernest & Young, cujo processo licitatório requerido por lei, não contemplou as diversas empresas de consultoria ambiental do Estado.
Estas empresas, com o devido conhecimento da realidade local, certamente teriam uma proposta mais responsável, respeitando as características ecológicas e culturais dos parques estaduais. Além disso, este processo vem sendo conduzido de forma arcaica, sem a participação dos atores interessados, enquanto poderia ter sido um processo de construção coletiva, mais coerente com os tempos atuais.
Outra questão a ser enfatizada é a não consideração dos planos de manejo, nos quais constam os locais destinados ao uso público e a intensidade de uso a ser implementada nas unidades de conservação. Estudos de capacidade de carga, que são utilizados para evitar impactos nas áreas que se quer conservar, não têm sido mencionados, mas o incremento irresponsável da quantidade de turistas, sim.
Esse é um projeto com fortes características de empreendedorismo e, nesta área, projetos inovadores têm adotado as práticas ESG, sigla que traduzidas para o português inclui o ambiental, o social e a governança corporativa. Essa última trata de transparência e responsabilidade, e vem acompanhada do termo em inglês “compliance”, que tem a ver com a conformidade e cumprimento das regras e normas estabelecidas.
Mais um aspecto muito importante a ser considerado é o contexto das unidades de conservação do Espírito Santo. Estamos falando de áreas muito limitadas em seus territórios, são distantes umas das outras, e carecem de conectividade entre elas para garantir a conservação a longo prazo. Os seis parques estaduais, que são foco deste projeto, juntos somam apenas 8 mil hectares do território estadual, e já contam com forte pressão antrópica do entorno que limitam seus objetivos de conservação.
Em plena década da restauração ambiental, o governo do Estado querer promover o uso intensivo dentro das poucas áreas destinadas à conservação, mostra que está na contramão do atual contexto de emergência climática e das metas globais de proteção e conservação ambiental. Os parques estaduais precisam sim, de muitos investimentos, mas esse não é o desenvolvimento que queremos.
Maria da Penha Padovan é bióloga e atuou como chefe do Departamento de Unidades de Conservação da Seama e como gerente do Parque Estadual de Itaúnas.