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Livro aborda impacto de jornal na luta contra ditadura militar 

Elaine Dal Gobbo resgata atuação do jornal popular Ferramenta no Espírito Santo 

A comunicação popular desempenhou um papel crucial durante a ditadura militar no Brasil para mobilizar trabalhadores em busca de melhores condições de vida em um contexto de repressão e cerceamento de direitos. Esse é o fio condutor do livro Jornal Ferramenta – a comunicação popular na luta contra a ditadura no Espírito Santo”, da escritora e repórter do Século Diário Elaine Dal Gobbo, lançado nesta quinta-feira (5), no Rio de Janeiro, durante o 30º Curso Anual do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC).  No Espírito Santo, o lançamento está previsto para o primeiro semestre de 2025. 

“Feito pelos trabalhadores, com os trabalhadores para os trabalhadores, o Jornal Ferramenta foi um importante instrumento de mobilização durante a ditadura. Naquele contexto, conseguiu colocar em suas páginas a realidade do trabalhador capixaba, e ao mesmo tempo fazer com que essas pessoas, refletindo sobre ela, pudessem buscar formas de transformá-la”, explica a autora.  

Mário Camargo

Ela destaca que o trabalho de comunicação não se limitava à produção e distribuição do jornal, mas incluía leituras e discussões coletivas nas quais eram encaminhadas estratégias e ações de enfrentamento aos problemas retratados nas páginas do jornal, como a criação de associações de moradores e chapas de oposição para retomada de sindicatos que estavam sob controle dos patrões. “Um exemplo disso é a construção civil, o sindicato dos trabalhadores fez a primeira grande greve do período ditatorial”, relata. 

Elaine apresenta um estudo inédito sobre o Jornal Ferramenta, fruto de sua pesquisa de mestrado no programa de Comunicação e Territorialidades (PosCom) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), defendida em 2018. Criado em 1977 pela Pastoral Operária da Arquidiocese de Vitória, o veículo encerrou suas atividades em 1985, ano que coincide com o fim de quase 21 anos do regime empresarial militar, marcando o início da transição para um regime liberal-democrático no Brasil.  

Dividido em quatro capítulos, a obra percorre desde os antecedentes e os impactos do golpe de 1964 até o encerramento da ditadura, destacando o papel do jornal na conscientização e organização de trabalhadores e a atuação da Pastoral Operária na formação de chapas sindicais opositoras ao governo e aos patrões. O capítulo final traz uma análise sobre o enfraquecimento da Pastoral na atualidade, diante de desafios impostos pela transformação da Igreja Católica em um contexto marcado pelo domínio do neoliberalismo, com impactos na perspectiva espiritual, que passa a ser mais orientado ao individualismo. 

Além de resgatar a experiência da iniciativa de comunicação, a autora aborda o contexto de repressão, a organização dos trabalhadores e o papel da Igreja Católica, por meio da Teologia da Libertação e ao incentivar a organização em Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), na articulação de lutas sociais durante o regime empresarial militar. 

Elaine relata que escolheu estudar o Jornal Ferramenta porque, apesar do papel importante que desempenhou na mobilização dos trabalhadores capixabas durante a ditadura, o veículo ficou esquecido ao longo do tempo.

Segundo ela, a reflexão contribui para a compreensão de que muitos direitos garantidos hoje são resultado direto dessas mobilizações históricas. Resgatar essa memória é uma forma de lembrar as atrocidades daquele período e reforçar a importância de não deixar que eventos semelhantes se repitam, ressalta a autora.  

O livro também recupera a trajetória de lutas e conquistas dos trabalhadores e apresenta o Ferramenta como uma experiência de comunicação popular com potencial de ser referência e inspirar outras iniciativas de jornalismo com viés emancipatório. 

“O Ferramenta deixa como lição que a nossa luta enquanto trabalhadores não é isolada. Não temos tem que lutar somente por interesses específicos da categoria que estamos inseridos. Nós, classe trabalhadora, temos problemas em comum e alguns recortes”, pontou. Ela relata que, com o passar do tempo e o surgimento de movimentos sociais, o jornal também pautou o antirracismo e várias lutas consideradas específicas. 

O evento de lançamento da obra contou com a mesa “60 anos do golpe militar: homenagem a Frei Tito, comunicação e educação popular hoje”, com a participação da autora, a representante do Fórum Grita Baixada, Adriano de Araújo, e a representante da Rede Jubileu Sul, Sandra Quintela.

Divulgação

Outras obras 

Além de Jornal Ferramenta – a comunicação popular na luta contra a ditadura no Espírito Santo, Elaine Dal Gobbo é autora de dois livros que abordam questões sociais e culturais. Em Agridoce, publicada pela Editora Maré neste ano, ela traz crônicas sobre o universo feminino, discutindo temas como patriarcado, divisão sexual do trabalho, violência doméstica, gordofobia e a força coletiva das mulheres para subverter as injustiças de gênero. Em Trânsitos de Alma, Elaine explora o ato de viajar, com textos inéditos que refletem sobre locais como a zona rural de Cariacica, Cuba e Salvador, passando por temas como espiritualidade, cultura e política. 

Elaine Dal Gobbo também contribuiu, junto a outros autores, para a organização de obras coletivas, como Sobre jovens e adultos, com textos de uma oficina para jovens e adultos de Cariacica; Debaixo do pé de manga, com escritos de usuários do Centro POP de Cariacica; e Um lugar de (e que) fala, fruto de uma oficina com mulheres do sistema prisional. 

Serviço

Livro Jornal Ferramenta: a comunicação popular na luta contra a ditadura no Espírito Santo, de Elaine Dal Gobbo 
R$ 30,00 – comercialização da obra por telefone (27 99977-4521) 

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