Medida da gestão de Balestrassi seria de um “pagamento indevido” do piso de 2023
O magistério da rede de ensino de Colatina, no noroeste do Estado, ganhou um presente de Natal nada agradável. Nessa segunda-feira (23), ao receber o contracheque, os professores se depararam com um desconto, o primeiro de três. A gestão do prefeito Guerino Balestrassi (MDB) não havia, no entanto, comunicado a categoria sobre a medida, que foi pega de surpresa.
O diretor jurídico do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Colatina e Governador Lindemberg (Sispmc), Décio Rezende, relata que a entidade solicitou explicações ao secretário municipal de Educação, Cidimar Andreatta, mas o gestor afirmou desconhecer a motivação do desconto. Ao questionar o departamento de Recursos Humanos (RH), o sindicato teve como resposta que trata-se de um pagamento indevido do piso salarial de 2023, mas não entrou em detalhes.
Décio afirma que os valores dos descontos variam, havendo professores que sofreram desconto de cerca de R$ 300,00, R$ 700,00 e até mais de R$ 1 mil. Na rubrica do desconto consta o processo administrativo nº 027007/2024, cuja cópia integral foi requerida pelo sindicato. “Salienta-se que tal solicitação se justifica no sentido que os descontos sofridos não foram autorizados pelos professores, tampouco os mesmos e nem a entidade sindical representativa têm conhecimento sobre as motivações que levaram a tal desconto”, diz o ofício protocolado na prefeitura.
O vereador Angelo Stelzer Neto (PSD) também encaminhou requerimento para a gestão municipal, no qual questiona qual foi a metodologia de cálculo do desconto e origem, além de solicitar o envio do processo na íntegra. “Enviamos a mesma por solicitação dos colaboradores, que foram pegos de surpresa com o desconto”, reforça o documento.
A situação, segundo Décio, é de revolta. “É a segunda ação golpista do prefeito, que encerra seu mandato perseguindo os servidores de Colatina. Essa é pior, pois na outra os servidores souberam um pouco antes, deu tempo de fazer assembleia e se posicionar dizendo que não vai assinar o acordo”, enfatiza.
Décio se refere à cobrança da gestão de Guerino Balestrassi para que 527 servidores devolvam o Adicional por Tempo de Serviço (ATS) referente ao período de junho a novembro de 2024, alegando que o valor, que totaliza cerca de R$ 70 mil, também foi pago indevidamente. O anúncio foi feito durante uma audiência no Ministério Público do Trabalho (MPT), realizada no dia 16 de dezembro, da qual também participou o sindicato representativo, que não aceitou assinar o acordo de devolução.
A situação fez com que a entidade sindical realizasse, na última quinta (19), uma assembleia com a categoria, na qual ficou deliberado que deveria manter a postura de não assinar. Décio explicou, na ocasião, que o pedido de devolução é devido a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) movida pela gestão municipal no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), na qual a Justiça deu ganho de causa à prefeitura e declarou inconstitucional a Lei municipal 3.608/90.
A lei regulamentou vários direitos dos servidores, que até então eram celetistas, como abono-aniversário, ATS e licença sem vencimento. Em 2005, na primeira gestão de Guerino Balestrassi, foi criado um novo regime, o estatutário, portanto, a partir dali o concurso não mais seria para celetistas. Décio relatou que em 2023, na atual gestão, a prefeitura moveu a Adin pedindo a inconstitucionalidade da Lei municipal 3.608/90, alegando que não é competência da Câmara Municipal legislar sobre a CLT.
A liminar, segundo Décio, foi indeferida, mas sua inconstitucionalidade foi julgada, dando ganho de causa à gestão municipal. A ação transitou em julgado em maio de 2024. Portanto, a partir de junho deste ano, os servidores celetistas não teriam mais garantidos os direitos previstos na Lei 3.608/90. Entretanto, afirmou Décio, o sindicato não sabia de toda essa situação, já que a administração municipal não comunicou aos servidores.
A entidade descobriu somente em outubro último, ao acompanhar o pedido de licença sem vencimento de um servidor, que foi indeferido por não ter previsão legal, já que esse direito havia sido perdido. A descoberta, informa Décio, foi comunicada à categoria em uma assembleia realizada em novembro. O diretor jurídico do sindicato relata que Guerino, durante a audiência no MPT, fez uma “chantagem”. “Ele falou que a prefeitura parcelaria o valor em 12 vezes, caso o sindicato assinasse o acordo. Se não assinasse, o desconto seria de uma vez só”.
“Se a gente assinasse o acordo, nossas pernas estariam quebradas no sentido de reaver esses direitos, a gente estaria concordando com a retirada de direitos”, ressaltou Décio. O dirigente sindical informa que o sindicato vai tomar as medidas judiciais cabíveis.
Nessa sexta-feira (20), o Sispmc protocolou ofício no MPT, na Prefeitura Municipal de Colatina (PMC) e na Câmara Municipal relatando a deliberação da assembleia. No documento, é destacado que a Adin “tramitou sem conhecimento dos servidores, pois os mesmos não faziam parte da referida ação, como também não tiveram oportunidade de habilitação legal para conhecimento, pois não foi dado divulgação pelo prefeito da referida ação ajuizada”.
Consta, ainda, que a direção do sindicato e dos servidores “se manifestaram no sentido de que houve omissão por parte do chefe do executivo em informar aos servidores da existência da inconstitucionalidade da Lei 3.608/90”. Assim, diz o documento, a categoria acredita que “a omissão se perpetuou pelo fato da questão eleitoral, porque o prefeito era candidato à reeleição e não queria suportar com desgastes provenientes do ingresso da Adin pelo mesmo, sem qualquer diálogo ou comunicação aos servidores”.
Os servidores também fazem referência ao Tema 1009 do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que considera que “os pagamentos indevidos aos servidores públicos decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, estão sujeitos à devolução, ressalvadas as hipóteses em que o servidor, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.”