MP é contra a normativa; principal defensor, André Moreira, não foi reeleito
O julgamento no Tribunal de Justiça do Estado (TJES) sobre a constitucionalidade da Lei da Qualidade do Ar de Vitória, que propõe padrões mais restritivos de controle da poluição atmosférica na Capital do Estado, deverá ocorrer entre 27 e 31 de janeiro próximos, de acordo com a pauta publicada no Diário Oficial de Justiça. A nova legislação foi suspensa por conta de uma liminar do desembargador Fernando Zardini Antonio.
As perspectivas para a manutenção da legislação não são boas. O Ministério Público do Estado (MPES) se manifestou contrariamente à constitucionalidade, fazendo coro à Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), que moveu a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Na visão do MPES, o município não tem competência para legislar sobre essa matéria, apenas os entes estadual e federal.
Para o o agora ex-vereador André Moreira (Psol), “essa posição é muito antiquada, muito atrasada do ponto de vista do constitucionalismo. Sempre há possibilidade de legislação local e, em matéria de direito ambiental e direito à saúde, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou decisões indicando que o município pode contrariar legislação federal e estadual se for mais protetivo, que é o nosso caso”.
Moreira é o autor da proposição inicial da lei, sancionada em dezembro de 2023, e era, até dezembro último, o principal ativista contra a poluição atmosférica dentro da Câmara de Vitória. Entretanto, ele não conseguiu se eleger para um novo mandato, apesar de ter recebido 2,6 mil votos, deixando a pauta à espera de outro parlamentar que a abrace. Ana Paula Rocha ocupa uma cadeira pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol) na Câmara a partir deste mês.
Durante a prestação de contas do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos), realizada no último dia 20 de dezembro, André Moreira reforçou o pedido de providências sobre a poluição atmosférica. Ele ressaltou os danos causados à saúde da população, revelando que 26 mil casos de doenças respiratórias foram registrados apenas na rede pública de Vitória entre julho e dezembro de 2023, período marcado por diversas ultrapassagens aos limites de poluentes estipulados pelo Decreto Estadual nº 3.463-R/2013, considerados extremamente altos e em desacordo com os padrões da Organização Mundial de Saúde (OMS) para a regulação da qualidade do ar.
CPI ficou pelo caminho
Nos primeiros meses de 2024, foi instalada a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Qualidade do Ar de Vitória na Câmara de Vereadores, por iniciativa de André Moreira, para apurar o aumento dos índices de poluição atmosférica na Grande Vitória.
Entretanto, desde o início, vereadores da base de Lorenzo Pazolini atuaram para esvaziar a CPI, que não teve trabalho conclusivo. A comissão era formada por Leonardo Monjardim (Novo) como presidente; André Moreira como vice; Duda Brasil (União), como relator; e Davi Esmael (Republicanos) e Vinicius Simões (PSB) como membros. Apenas Moreira e Simões eram de oposição – os dois não se reelegeram em 2024, assim como Duda Brasil.
Entre as pessoas que prestaram depoimento na CPI estiveram Alaimar Fiúza, ex-diretor-presidente do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema-ES); o secretário de Meio Ambiente de Vitória, Tarcísio Föeger; Eraylton Moreschi; e servidores de carreira do Iema.
Felipe Rigoni (União) era esperado na reunião da CPI realizada de abril, mas recusou a convocação. O secretário estadual de Meio Ambiente alegou que não está sujeito aos poderes de fiscalização ou de investigação do legislativo municipal, tendo em vista que ocupa cargo na gestão estadual. A questão foi encaminhada ao setor jurídico da Câmara de Vereadores.
Também foram realizadas inspeções na Vale e na ArcelorMittal, empresas poluidoras localizadas no Complexo de Tubarão, e uma audiência pública na Praça Mário Elias da Silva (Praça da Igreja), no bairro Jardim Camburi.
Sem metas específicas
Em abril deste ano, o governador Renato Casagrande (PSB) sancionou a nova política de qualidade do ar, que transfere a gestão para a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), enquanto o Iema mantém o papel de órgão fiscalizador e o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema) torna-se órgão consultivo.
Aprovada na Assembleia Legislativa em março, sem discussão com a sociedade civil, a legislação não atualiza os limites máximos permitidos de concentração de poluentes atmosféricos e indica que serão regulamentados por meio de decreto. Enquanto isso, os valores continuam sendo os definidos pelo Decreto 3.463-R, de 2013, considerados defasados por especialistas.
Durante reunião realizada pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa em outubro último, os novos parâmetros propostos pelo governo estadual foram apresentados: limite de 14 gramas por metro quadrado em 30 dias, até dezembro; de 12g, a partir de janeiro de 2025; de 10g, a partir de janeiro de 2033; de 8g, a partir de 2044; e um número final ainda a ser estabelecido. A proposta foi classificada como “indecorosa” pela Juntos SOS ES Ambiental.
Na mesma reunião, representantes do Iema, da Vale e ArcelorMittal afirmaram que os compromissos assumidos nos Termos de Compromisso Ambiental (TCAs) estariam plenamente cumpridos até a data limite de 31 de dezembro deste ano, mas a maioria das metas foi descumprida pelas empresas poluidoras.
O Ministério Público de Contas (MPC-ES) também se manifestou sobre o tema em setembro deste ano, apontando falta de controle e negligência por parte dos órgãos ambientais responsáveis pela gestão da qualidade do ar e fiscalização dos compromissos ambientais firmados pela Vale e ArcelorMittal há quase seis anos.