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‘Colocar solo impermeável em Jacarenema é um crime sem tamanho’

Entidades criticam impacto de ponte e ciclovia em parque natural de Vila Velha

Divulgação/ PMVV

A Prefeitura de Vila Velha inaugurou, no último sábado (18), a nova Ponte da Madalena e uma via de acesso integrada com ciclovia no Parque Natural Municipal de Jacarenema, localizado na Barra do Jucu. As obras foram apresentadas pela a gestão do prefeito Arnaldinho Borgo (Podemos) como uma forma de promover a preservação ambiental e a conexão da comunidade local com a unidade de conservação. Porém a iniciativa é criticada por ambientalistas e especialistas, que questionam seus impactos ecológicos sobre a restinga, uma área de proteção permanente.

As obras, que somaram um investimento superior a R$ 11 milhões, foram realizadas como parte de uma compensação ambiental proveniente de um empreendimento privado não especificado pela gestão municipal. A nova Ponte da Madalena, com 93,41 metros de extensão, foi projetada exclusivamente para pedestres e ciclistas e equipada com dois mirantes e iluminação especial. A estrutura substitui a antiga ponte de madeira, que desabou em 2017, e integra a Barra do Jucu ao parque. A via de acesso, por sua vez, possui três quilômetros de extensão e conecta o balneário ao bairro Jockey de Itaparica, com pavimentação, drenagem e uma ciclovia.

Em nota de repúdio divulgada no dia em que a Prefeitura de Vila Velha inaugurou as novas estruturas, o Comitê Popular de Luta da Região 5, de Vila Velha, a Comissão de Luta pelo Meio Ambiente e o Fórum Popular em Defesa do Meio Ambiente e da Cidadania se posicionaram contra as intervenções realizadas e alertaram para os riscos de urbanização no parque natural.

O texto destaca que as restingas são biomas costeiros essenciais para a estabilização de dunas e manguezais, controle da erosão e como habitats para a desova de tartarugas, aves, répteis e anfíbios. Além disso, alerta para o risco de a obra abrir precedentes para o agravamento das agressões ambientais, facilitando a chegada de empreendimentos imobiliários e comerciais na região.

O oceanógrafo Nery Neto, membro do Comitê Popular de Luta da Região 5, destaca o impacto direto das obras sobre a restinga: “De repente, do dia para a noite, surge uma ciclovia no meio de um parque natural municipal. A restinga é uma área de proteção permanente e uma das grandes funções é o aprisionamento do lençol freático. Colocar solo impermeável ali é um crime sem tamanho”. Ele explica que a ciclovia e o calçadão construídos no local comprometem a infiltração de água e o equilíbrio ecológico do bioma, que depende da interação entre o solo permeável, a vegetação e o ciclo hidrológico.

A restinga, como Área de Preservação Permanente (APP), encontra-se sob a proteção da Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal) e da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais). Qualquer ação que vise à destruição ou dano à vegetação nativa nessas áreas é considerada crime ambiental.

Nery Neto destaca ainda preocupações com a iluminação da via, que pode prejudicar espécies noturnas, como corujas, cobras e tartarugas. Além disso, a ciclovia estaria localizada em uma região historicamente vulnerável à especulação imobiliária. “Nosso medo é que a ciclovia seja apenas o início. Um loteamento já foi iniciado na área, o Costa Nova, o que confirma as suspeitas de que o parque possa ser transformado em um espaço urbano, com empreendimentos que degradam ainda mais a região”, afirma Nery Neto.

Histórico de ataques

Criado em 2003, o Parque Natural Municipal de Jacarenema protege um ecossistema costeiro associado à Mata Atlântica, incluindo áreas de restinga, dunas e manguezais. Em 1979, o biólogo Augusto Ruschi já destacava a importância da região para a estabilização ambiental, sugerindo transformá-la em um jardim ecológico de restinga. O parque integra o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), que define um grau de proteção integral para essas áreas.

Desde a década de 1980, movimentos locais, como a Associação de Moradores e Amigos da Barra do Jucu, têm lutado pela proteção do parque e denunciado que tem sido alvo de crimes ambientais e ocupações irregulares. As entidades que assinam a nota de repúdio reforçam o apelo à resistência popular.

A Prefeitura de Vila Velha foi procurada por Século Diário para explicar questões relacionadas à compatibilidade das obras com o plano de manejo do parque, bem como medidas de mitigação dos impactos ambientais, porém não respondeu ao contato até o fechamento desta edição.

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