Rafael Pacheco, secretário da Sejus, afirma que MPES impôs processo
Até o próximo mês de março, 300 monitores de ressocialização prisional deverão deixar seus empregos no Espírito Santo para serem substituídos por inspetores penitenciários concursados. O processo faz parte de um termo acordado entre o Ministério Público do Estado (MPES) e a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus) para a realização de concurso público. Ainda assim, os monitores criticam a forma como a questão está sendo implementada e o direcionamento exclusivo das vagas para policiais penais.
Os monitores de ressocialização atuam nas unidades carcerárias do Estado desde 2006. Nesses quase 20 anos, foram realizados processos seletivos simplificados para preencher as vagas, sempre como profissionais de Designação Temporária (DT). O último edital para cadastro de reserva foi lançado em fevereiro de 2024, e o prazo de vigência foi prorrogado por mais 12 meses no último dia 23.
Entretanto, o MPES iniciou um inquérito civil para apurar o edital 001/2021 para inspetor penitenciário, por considerar que houve valorização excessiva na prova de títulos, que favoreceria quem já ocupou a mesma função na Sejus. Em novembro de 2021, a 27ª Promotoria Cível de Vitória expediu notificação recomendatória para que o Estado se abstivesse de realizar novas contratações temporárias para a função.
Como resultado, em outubro de 2023, foi assinado um acordo em que a Sejus se comprometia a gradativamente colocar concursados para cumprirem o cargo de inspetor judiciário. O Estado dispõe de 3.654 vagas para servidores efetivos no cargo, sendo que 1.917 estavam ocupadas até 2023.
Pelos termos do acordo inicial, a Sejus deveria prover 600 vagas por concurso público até 2024; 500, até 2025; 520, até 2026; e 521, finalizando em 2027. Em novembro passado, foi assinado um aditivo para revisar os termos do acordo, alterando o quantitativo para 300 em 2024 e 800 em 2025.
Polícia Penal
Dentro desse processo de transição, os concursos públicos para preencher as funções antes exercidas pelos monitores de ressocialização estão sendo direcionados aos policiais penais. Em dezembro de 2023, foi aprovado na Assembleia Legislativa (Ales), o Projeto de Lei Complementar (PLC) nº 58/2023, que regulamenta a Polícia Penal (PP); e o PLC nº 59/2023, que trata da tabela de subsídio.
Entretanto, os atuais monitores, além de temerem o processo de demissão em massa, também criticam o Estado por não ter dado a devida valorização para a categoria nesses quase 20 anos. Avaliam, ainda, que não é o mais adequado colocar policiais para atuar diretamente no processo de ressocialização das pessoas encarceradas.
“O policial penal não é ressocializador. A imagem que ele passa é de opressor, ele não está ali para ressocializar. O efetivo não tem comunicação, o que ele quer usar é a arma. É tiro, bomba e gás, e por isso as ocorrências estão crescendo nas unidades prisionais”, afirma um representante dos monitores, que prefere não se identificar por medo de represálias.
Um grupo de monitores está elaborando uma carta direcionada ao governador Renato Casagrande (PSB), para dialogar sobre o suposto “descaso” com a categoria e defender que os profissionais atuais possuem a qualificação necessária para atuar no processo de ressocialização.
“Não se sustenta”
Em contato com Século Diário, o secretário de Estado de Justiça, Rafael Pacheco, defendeu que os policiais penais possuem, sim, a qualificação necessária para atuar na ressocialização, e descartou que algum tipo de visão ligada repressão e militarização possa influenciar no trabalho. “Eles são civis, não são militares. Então, essa crítica já começa com esse erro de diagnóstico”, comenta.
“É parte do universo da Polícia Penal a ressocialização. A Subsecretaria de Ressocialização é comandada por um policial penal [Marcelo de Araújo Gouvea]. Nós temos inúmeros projetos premiados nesse quesito dos Direitos Humanos conduzidos por policiais penais. As polícias têm suas atribuições, e uma das atribuições da Polícia Penal é ser ente transformador do ser humano. É um debate que pode ser levantado se a Polícia Penal deveria ou não exercer essa função, mas eles estão lá junto com os monitores e conduzem esses projetos de ressocialização, então não se sustenta esse argumento”, complementa.
Sobre a substituição dos DTs, Rafael Pacheco lamenta pelos monitores que terão que deixar seus empregos, mas ressalta que o Estado foi obrigado a cumprir a determinação do Ministério Público, e que não é de hoje que o processo está caminhando.
“Eu consigo entender, como muita tranquilidade, o momento de angústia dessas pessoas. Ficar desempregado numa economia delicada como a do Brasil é angustiante. Eu venho tratando dessa questão publicamente com eles há mais de um ano. Já fui à Assembleia Legislativa mais de três vezes, com mais de 500 deles presentes, mas o momento chegou. Na verdade, havia uma expectativa de que isso não fosse acontecer, mas aconteceu”, comenta.
“Era para os 300 funcionários saírem em dezembro”, continua o secretário, “mas eu aleguei para a Promotoria que os policiais precisavam de treinamento, o que está acontecendo agora, e consegui a compreensão do Ministério Público para manter os monitores por mais três meses. Eu fico triste, são profissionais brilhantes, mas é o mandamento legal”.