Castelo Branco, Médici e Rubem Ludwig podem ter títulos cassados nesta quinta-feira
Será votada nesta quinta-feira (27), na sessão do Conselho Universitário da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), a cassação dos títulos de Doutor Honoris Causa concedidos aos ex-presidentes Humberto de Alencar Castelo Branco e Emílio Garrastazu Médici, alçados ao poder pelo regime militar, e ao general Rubem Carlos Ludwig. Este último foi ministro da Educação no governo de João Batista Figueiredo, também na ditadura militar.
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O relatório será apresentado por Maurício Abdalla, professor do Departamento de Filosofia e integrante da Comissão de Assuntos Didáticos, Científicos e Culturais, que tem como uma de suas atribuições avaliar as cessões de títulos de Doutor Honoris Causa.
Maurício relata que o debate foi provocado, inicialmente, pela Comissão da Verdade da Ufes (CVUfes), que em 2017 apresentou um relatório na instituição de ensino com recomendações, uma delas, a cassação dos títulos. O professor representava a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória (CJP) no Comitê Estadual para a Prevenção e Erradicação da Tortura no Espírito Santo (Cepet), para onde levou a discussão.
O Cepet, então, com base no parecer da Comissão da Verdade, solicitou à Reitoria, que na época era comandada por Reinaldo Centoducatte, a cassação. Contudo, não houve resposta por parte da universidade. Em 2018, Maurício contatou novamente a Reitoria sobre o assunto, e permaneceu sem resposta. Contudo, em março de 2024, o Ministério Público Federal (MPF) expediu um ofício para a Reitoria, comandada na ocasião por Paulo Vargas, recomendando a revisão de homenagens e títulos concedidos pela universidade a apoiadores e autoridades da ditadura.
O assunto foi tratado na primeira sessão do Conselho Universitário daquele ano, em março. No mês seguinte, já na gestão do reitor Eustáquio de Castro, foi encaminhado um oficio ao Conselho para apreciação do tema. Como o documento do MPF fazia menção somente a Emílio Garrastazu Médici e Rubem Carlos Ludwig, Eustaquio, no ofício, incluiu o nome do marechal Humberto de Alencar Castelo Branco após uma conversa com o professor Pedro Ernesto Fagundes, membro da CVUfes, que informou que Castelo Branco também havia recebido o título. No caso da concessão do título a Castelo Branco, não há registros documentais na universidade, somente fotográficos.
A proposta a ser apresentada por Maurício na reunião da próxima quinta é que a cassação dos títulos seja feita em uma sessão solene no dia 1º de abril. “É uma correção histórica de um erro do passado que coloca ditadores como dignos de homenagens”, diz o professor, que explica que o título de Doutor Honoris Causa é a maior honraria da universidade e, segundo o estatuto da Ufes, é destinado para pessoas que contribuíram para ações da ciência, artes e cultura, e causas do país e da humanidade.
Relatos
Segundo Maurício, o ofício do MPF, com base na Comissão da Verdade, relatou diversas ações de violação de direitos humanos no âmbito da universidade durante o regime militar, contidas no relatório da Comissão da Verdade, começando em 1964, ano do golpe, quando o então reitor, Manoel Xavier Paes Barreto Filho, foi destituído. Recorda, ainda, que em 1968, no XXX Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em Ibiúna, São Paulo, no qual mais de 700 estudantes foram presos, 13 eram alunos da Ufes e da Faculdade de Farmácia.
Outra situação de violação relatada foi em março de 1971, durante o Governo Médici, quando nove pessoas foram presas e levadas para o quartel do 3º Batalhão de Caçadores, em Vila Velha, atual 38º Batalhão de Infantaria do Exército. Entre essas pessoas estavam quatro estudantes da Ufes, submetidos a torturas no DOI-CODI. Uma das estudantes, Laura Maria da Silva Coutinho, inclusive, teve um aborto por causa da violência praticada contra ela, que incluiu, por exemplo, pau de arara, palmatória, choques elétricos na vagina, nos seios e na língua.