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Municípios contestam pedido de suspensão de ações contra mineradoras no exterior

Supremo vai analisar petição que pode afetar ações judiciais do crime Samarco/Vale-BHP

Leonardo Sá

O Consórcio Público para a Defesa da Revitalização do Rio Doce (Coridoce), que representa 52 prefeituras atingidas pelo crime da Samarco/Vale-BHP, incluindo sete municípios capixabas, manifestou-se contrário à nova petição do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) ao Supremo Tribunal Federal (STF), que requer a suspensão dos contratos firmados entre os municípios e escritórios de advocacia que representam ações judiciais contra as mineradoras no exterior, e a proibição de cláusulas que garantem pagamentos a esses escritórios em caso de acordos nacionais.

O consórcio argumenta que essa medida visa forçar as prefeituras a aderirem ao acordo de repactuação no Brasil, homologado pela Suprema Corte, cuja adesão deve ser voluntária. “A narrativa de que os municípios estão reféns de seus contratos com o escritório de advocacia não impediu que sete municípios autores de ações no exterior aderissem ao acordo”, acrescenta. Além disso, diversas prefeituras já declararam publicamente que não aceitarão a repactuação nos termos atuais, pois alegam que os valores oferecidos são significativamente inferiores ao que de fato lhes é devido.

As prefeituras têm até o próximo dia 6 para aderirem ao acordo de repactuação. Até o momento, quatro municípios desistiram de participar da ação na Inglaterra devido às condições impostas pelo acordo: Conceição da Barra e São Mateus, no norte do Estado, e Córrego Novo e Sobrália, em Minas Gerais.

O Coridoce é integrado por 45 municípios de Minas Gerais e sete do Espírito Santo: Anchieta, Aracruz, Baixo Guandu, Colatina, Linhares, Marilândia e São Mateus. O coordenador jurídico do consórcio, Samuel Lomas Santos, afirmou que os municípios decidiram em conjunto, em reunião recente do Fórum Permanente de Prefeitos, pela não adesão ao acordo. “O principal motivo, além do valor, é a condição de pagamento”, explica. Na ocasião, 23 prefeitos de municípios atingidos assinaram um manifesto que reforçou a insatisfação dos gestores com as condições da repactuação, considerada insuficiente e com previsão de quitação em duas décadas.

Segundo o advogado, os municípios reivindicam uma proposta baseada no acordo de Brumadinho (MG), que representava 11% dos valores globais de R$ 170 bilhões. “Isso daria cerca de R$ 19 bilhões, o que é equivalente ao que foi repassado aos municípios atingidos em Brumadinho. No entanto, a proposta atual é de apenas R$ 6,1 bilhões, pagos em parcelas crescentes ao longo de 20 anos, o que é inaceitável”, conclui.

Para Santos, o Ibram está sendo usado pela mineradora BHP Billiton para impedir uma indenização justa. “Eles querem impedir que a jurisdição seja exercida corretamente no exterior”, considera. A decisão sobre a petição segue para o STF e os municípios aguardam um posicionamento que garanta sua autonomia na busca por justiça e reparo adequado pelos danos sofridos há quase dez anos.

Firmado em R$ 132 bilhões, o acordo de repactuação é criticado pelos atingidos, que denunciam insuficiências e violações de direitos no processo de negociação, conduzido em sigilo pelos governos federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo. Antes da homologação do documento, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e a Associação Nacional dos Atingidos por Barragens (Anab) encaminharam uma petição ao Supremo pedindo revisão de cláusulas que excluem grupos de atingidos, e em especial a exigência de quitação definitiva, que impede outras ações judiciais reparatórias.

As organizações apontam violações às Política Nacional de Atingidos por Barragens (PNAB), à Política Estadual de Atingidos por Barragens do Estado de Minas Gerais (PEAB) e à Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e reivindicavam a inclusão de atingidos em territórios no sul da Bahia e no Espírito Santo, e criação de comitês locais para acompanhar a implementação das medidas de reparação. Contudo, o pedido foi recusado.

O rompimento da barragem de rejeitos da Samarco, controlada pela Vale e BHP, em 5 de novembro de 2015, resultou na liberação de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, matando 19 pessoas e impactando mais de 2,5 milhões de pessoas em três estados. Os rejeitos percorreram 684 km do Rio Doce até alcançarem o mar em Regência, em Linhares. Até hoje, os atingidos sofrem com a desestruturação social e política, além das perdas ambientais e econômicas.

Nenhum dos réus envolvidos no crime da Samarco/Vale-BHP foi punido criminalmente. Dos 26 acusados inicialmente, 15 foram excluídos da ação penal, e a lentidão do processo pode levar à prescrição dos crimes. Enquanto isso, os julgamentos internacionais na Holanda e na Inglaterra surgem como uma esperança para a responsabilização das empresas.

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