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Eleição do DCE da Ufes termina com protestos e denúncias

Chapa 1 foi declarada reeleita nessa segunda; votos do CCHN foram anulados

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Leonardo Sá

A eleição para o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) terminou com protestos, denúncias de manipulação e intervenção da Polícia Militar após o resultado divulgado nessa segunda-feira (17). A votação, que ocorreu nos últimos dias 11 e 12, resultou na vitória da “Chapa 1”, “Pra Fazer Valer”, hoje à frente do diretório, contra a “Chapa 2″, “Na Luta é Que a Gente Se Encontra”.

A chapa vencedora é composta por membros do Levante Popular da Juventude, União da Juventude do PT (JPT) e Movimento Participa (ligado a JSB, juventude do PSB), e a “Chapa 2″ reuniu movimentos como Fogo do Pavio (juventude do MTST e Brigadas Populares, ligada ao Psol), Juventude Comunista (UJC, do PCB) e Movimento Correnteza (Unidade Popular).  

O embate entre as forças, que se estendeu mesmo após o resultado divulgado em publicação que impedia comentários nas redes sociais do DCE, também foi representado na Comissão Eleitoral (COE), composta por três membros mais alinhados à atual gestão e dois que militavam em movimentos mais próximos da oposição, relata um dos membros, Pietro Sarnaglia, militante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que contesta o resultado do pleito.  

Ele denuncia uma série de irregularidades que, segundo ele, comprometeram a transparência e a credibilidade do processo eleitoral, sendo contundente ao apontar o que considerou um “processo completamente viciado”, além de relatar inconsistências nas decisões tomadas pela COE, com mudanças de posicionamento e comunicação confusa. “De uma maneira geral, tantas inconsistências, tantas incongruências, só servem para descredibilizar o movimento estudantil”, considera. 

Um dos episódios mais críticos relatado por Pietro aconteceu durante a fase de proibição das campanhas eleitorais. “Às cinco da manhã, eu peguei um carro para poder acompanhar em São Mateus. Durante a trajetória, fiquei sem acesso à internet. Quando eu tive acesso à internet de novo, a decisão que foi divulgada foi diferente da decisão que foi tomada dentro da COE”, revelou, evidenciando o que considera uma manipulação da comunicação do processo. Ele questionou a proibição de apenas a “
Chapa 2″ fazer campanha no primeiro dia de votação, em uma decisão que aponta como unilateral e sem votação formal. 

Outro ponto que gerou protestos foi a questão das urnas. Pietro destacou que houve uma tentativa de manipulação da contagem dos votos, com impugnações sem justificativa plausível. “Todas as urnas tiveram alguma inconsistência, então foi analisado ata, lista de votação, voto e assinatura atrás do voto. Quando chegou no final da apuração, a votação estava bem próxima, a decisão da COE foi de impugnar apenas as urnas do Centro de Ciências Humanas e Naturais (CCHN), sem que os votos fossem contabilizados. A Comissão Eleitoral votou, mas os favoráveis à “Chapa 1″ eram maioria. Isso foi objeto de diversos recursos”, afirma.

A decisão pela anulação das urnas dos prédios IC2 e IC3 do Centro de Ciências Humanas e Naturais foi classificada como um ataque à democracia e à representação estudantil, já que as urnas representavam um dos maiores centros acadêmicos da universidade, como destaca nota de repúdio assinada por seis dos oito Centros e Diretórios Acadêmicos do Centro de Ciências Humanas e Naturais. Os estudantes também contestaram a impugnação em um abaixo-assinado com mais de 460 assinaturas, que acusava que a anulação não teve base legal e violou os direitos dos votantes. 

Maria Isabel Cardoso, também integrante da Comissão Eleitoral e militante do coletivo “Para Todos” e Juventude do PT discorda. Ela defende a legitimidade do processo eleitoral e afirma que o resultado atendeu rigorosamente o regimento, e com a presença de fiscais de ambas as chapas. “O processo de apuração das urnas foi totalmente legítimo, com a participação de todos os grupos e diretores da UNE [União Nacional dos Estudantes].

A estudante relata que, durante a apuração, houve irregularidades nas urnas, especialmente no CCHN, que apresentavam “problemas nas atas” e “circulação de listas sem controle”. “Havia uma falta de clareza sobre quem estava manipulando as listas e quais votos eram legítimos”, explicou, justificando a decisão de não considerar os votos dessas urnas como válidos.  

Maria Isabel descreve, ainda, que a eleição foi marcada por um clima de “violência” e “intolerância”, e que a situação ultrapassou os limites do debate político e afetou diretamente a saúde mental dos envolvidos. “Foi um alto nível de xingamento, de tensão, que deixou as pessoas fragilizadas. Nunca vi uma eleição num nível tão baixo assim, no sentido de ataques pessoais”, afirmou. 

Um dos momentos mais tensos do processo ocorreu quando a situação na sala de apuração escalou para o ponto de chamar a Polícia Militar para intervir no conflito. Após a publicação da decisão final da apuração, a “Chapa 2” realizou uma plenária com representantes de centros acadêmicos e estudantes independentes para discutir os rumos do movimento estudantil e a necessidade de revisão do processo eleitoral. 

De acordo com a representante do grupo, Letícia Sá, estudantes do curso de Ciências Sociais que não tinham ligação política com os grupos em disputa, entraram na sala de apuração, em um ato de desconfiança no processo, o que resultou na chegada da Polícia Militar após uma solicitação de membros da Chapa 1. Ela descreveu a ação policial como “um absurdo” e condenou o uso de força militar para conter estudantes, questionando os riscos da abordagem e o que poderia ter acontecido naquele contexto. Também criticou a falta de transparência do processo eleitoral e a desigualdade de condições entre as chapas, afirmando que todo o processo foi conduzido de forma ilegítima.  

Para Pietro, o episódio representou uma “violência simbólica”. “Chamar a polícia para resolver um atrito dentro da universidade é um erro básico”, afirmou. Segundo ele, a atitude visava amedrontar os estudantes que entraram na sala para contar os votos das urnas anuladas, o que estava sendo transmitido em live para mais de cem pessoas na segunda-feira.  “Eram majoritariamente pessoas negras e trans, que são historicamente alvos da violência policial”, denuncia.   

Os membros da comissão não souberam explicar como ocorreu a entrada não autorizada de estudantes na sala de apuração, mas estudantes entendem que a publicação do resultado intensificou o clima de polarização e frustração. A contagem total registrou uma diferença de 274 votos para a chapa vencedora – 1.492 votos contra 1.218.

No entanto, Pietro enfatiza que a situação prejudicou gravemente a imagem do movimento estudantil. Para ele, o processo eleitoral não foi conduzido de forma democrática e transparente, o que gerou revolta e aumentou as tensões entre os estudantes. “Estão tentando dirigir a entidade sem ouvir as bases”, concluiu.

Apesar das tensões e conflitos, Maria Isabel considera que o momento deve servir de reflexão para a construção de uma nova cultura política na universidade. “Saímos desse processo eleitoral com a perspectiva de que é hora de pensar uma nova cultura política para a nossa universidade, que seja baseada no diálogo, no acolhimento dos estudantes, e não os afaste”, avaliou.

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