ONG que luta contra novas PCHs na região celebra decisão da autarquia

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) decidiu arquivar os processos de licenciamento ambiental para a construção de duas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no Rio Itabapoana: a PCH Saltinho, que ficaria na Cachoeira da Fumaça, entre Bom Jesus do Itabapoana (norte do Rio de Janeiro) e São José do Calçado (sul do Espírito Santo); e a PCH Bom Jesus, que seria instalada nas Corredeiras do Santa Rosa e Alcestes, entre Bom Jesus do Itabapoana e Bom Jesus do Norte (na região sul capixaba).
As decisões de arquivamento são do fim do ano passado, mas a Organização Não Governamental (ONG) Restauração e Ecodesenvolvimento da Bacia Hidrográfica do Itabapoana (Redi) teve acesso aos documentos somente recentemente, e fez a divulgação. A entidade lutava contra a instalação das PCHs devido aos impactos na Bacia Hidrográfica do Rio Itabapoana, já bastante afetada por outras hidrelétricas.
Os pedidos de licenciamento foram protocolados em 2009. A Monex Geração, holding (empresa que controla outras empresas) especializada em investimentos no setor elétrico, obteve a licença prévia da PCH Bom Jesus em 2014, e em 2018, conseguiu a licença da PCH Saltinho.
Uma das justificativas para o arquivamento dos dois processos é de que as “condições socioambientais atuais diferem significativamente daquela presente nos estudos”. Também foram levadas em consideração as manifestações da sociedade civil e do poder público dos municípios, contrárias às intervenções. Além disso, as próprias licenças prévias já estavam vencidas.
Outra questão considerada foi o patrimônio natural, que seria diretamente afetado pelas hidrelétricas. Em 2020, a Cachoeira da Fumaça foi tombada como Patrimônio Histórico, Cultural, Turístico, Paisagístico e Natural do Município de Bom Jesus do Itapaboana. Em 2022, outra lei de Bom Jesus do Itabapoana criou a Unidade de Preservação de Proteção Integral Monumento Municipal das Cachoeiras e Corredeiras do Rio Itabapoana (MNCI).
“A decisão do Ibama é uma vitória para toda a população, que tem travado uma luta de anos contra a implantação dos empreendimentos. A Redi, desde 2020, atua em prol desta causa, nossa origem está nesta causa, porque acreditamos que não cabe mais esse tipo de uso das águas do Itabapoana. Comunidades inteiras foram marginalizadas e sistemas socioecológicos seriamente afetados desde o início da construção da UHE [Usina Hidrelétrica] Rosal, primeiro grande empreendimento no rio. Desde então, outros cinco empreendimentos se instalaram”, comenta Antônio Paulo França, coordenador-geral da Redi.
Antônio afirma que ainda é preciso manter a vigilância, pois sempre há o risco de novos processos de licenciamento, mas a decisão representa um alívio. “Temos a esperança de que uma página foi virada. Agora, focaremos mais energias para diminuir as injustiças socioambientais causadas pelas barragens já instaladas. Acreditamos que ainda veremos um rio com menos barragens do que o que temos hoje. Um rio que tenha sua piracema restituída e sua pesca novamente abundante. Um rio que permita de fato o uso múltiplo e equilibrado, justo para todos os seres que dele dependem”, completa.
Em outra entrevista para Século Diário, de 2023, Antônio Paulo França já havia destacado que as cidades onde as hidrelétricas estão instaladas ao longo do Itabapoana não são beneficiadas com a energia gerada. Ao contrário: para os cidadãos da região, o que sobra são os impactos ecológicos, sociais, culturais e econômicos decorrentes das barragens.
“A região não recebe essa energia diretamente. Ela é comprada e vai para outros lugares. A energia da Usina Hidrelétrica Rosal, por exemplo, vai para Cachoeiro de Itapemirim. Só a hidrelétrica Franco Amaral, que foi criada na década de 1960, na época realmente proporcionou o acesso à energia e levou desenvolvimento para os municípios”, explicou.
A Bacia Hidrográfica do Rio Itabapoana possui uma área de drenagem de 4.875 quilômetros quadrados e inclui 18 municípios do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Em território capixaba, abrange totalmente as cidades de Divino de São Lourenço, Guaçuí, São José do Calçado, Bom Jesus do Norte, Apiacá e Mimoso do Sul, e parcialmente, Dores do Rio Preto, Muqui e Presidente Kennedy – todas na região sul do Estado.