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Câmara aprova regulamentar mototáxi e transporte alternativo em Cachoeiro

Especialistas e movimentos apresentam opiniões divergentes sobre o tema

CMCI

A Câmara de Cachoeiro de Itapemirim, no sul do Estado, aprovou por unanimidade, em sessão ordinária dessa terça-feira (22), o Projeto de lei nº 26/2025, que regulamenta “serviço complementar de transporte de passageiros em coletivo com capacidade entre cinco e dezesseis pessoas e o Serviço de Mototáxi no Município”. A proposta é de autoria do vereador João Machado (PDT), que se propôs a entrar em um tema cercado de controvérsias.

O projeto – que agora segue para sanção do prefeito Theodorico Ferraço (PP) – apresenta critérios para operação dos serviços em Cachoeiro. No caso do “serviço complementar de transporte”, as regras incluem: capacidade mínima de cinco passageiros e máxima de 16; regularização nos setores de trânsito e transportes do município; vistoria periódica obrigatória dos veículos; cumprimento das normas de acessibilidade e segurança; e identificação visual padronizada.

Os condutores também precisam ter Carteira Nacional de Habilitação (CNH) categoria “D”; passar por curso de formação específico para transporte coletivo; estar cadastrados no órgão municipal competente; e apresentar certidões negativas criminais atualizadas.

Já os mototaxistas deverão possuir CNH categoria “A”, com no mínimo dois anos de experiência; passar por curso específico de capacitação para condução de passageiros em motocicletas; usar colete de identificação padronizado e capacete com viseira ou óculos de proteção, ambos com número de registro visível; além de apresentar certidões negativas criminais e manter cadastro atualizado no órgão municipal responsável.

Também há regras para as motocicletas a serem utilizadas: ter no máximo oito anos de fabricação; ser vistoriadas periodicamente; estar devidamente registradas no órgão municipal; e apresentar identificação visual específica para mototáxi.

Na justificativa do projeto, João Machado argumenta que os dois tipos de serviço se apresentam como alternativas mais ágeis e acessíveis do que o transporte coletivo tradicional, “especialmente para bairros mais afastados e regiões de difícil acesso”. Ainda de acordo com o vereador, “a formalização desse serviço permitirá maior controle sobre a qualidade dos veículos e a segurança dos passageiros, combatendo a clandestinidade e promovendo a profissionalização dos condutores”.

Em alguns municípios do Brasil, esse tipo de regulamentação foi considerada inconstitucional, por invadir a competência exclusiva da União e do Poder Executivo. No caso de Cachoeiro, a Procuradoria Legislativa opinou pela constitucionalidade, tendo em vista que a Lei Federal nº 12.009/2009 garantiu a competência dos municípios para regulamentarem a matéria. Além disso, a Lei Orgânica Municipal (LOM), segundo a Procuradoria, não estabelece reserva exclusiva ao prefeito para legislar sobre o tema.

Apesar disso, a Procuradoria deu parecer contrário a dois artigos do projeto que considerou invadir a competência do Executivo. Um deles permitia a prestação dos serviços “em quaisquer rotas e trechos no âmbito do município”, e o outro estabelecia prazo de 90 dias para regulamentação da lei pelo prefeito. Os dois dispositivos foram suprimidos pelo vereador.

Críticas

Para passageiros, mototáxis e veículos de pequeno e médio porte têm sido vistos como alternativas à má qualidade e ao encarecimento do transporte coletivo tradicional. Entretanto, especialistas no tema e movimentos sociais apontam esse tipo de alternativa como responsável pelo piora nas condições de mobilidade urbana e aumento das mortes no trânsito no Brasil.

O assunto tem ganhado especial repercussão nos últimos meses na cidade de São Paulo. A prefeitura proíbe a veiculação de mototáxis nas cidades, de acordo com decreto de 2023, e tem apreendido motocicletas, com a justificativa de aumento de acidentes.

Apesar disso, empresas como Uber e 99 mantêm a oferta, por entenderem que a proibição não se aplica aos aplicativos de transporte, e fazem lobby pesado contra a proibição, com campanhas publicitárias pela cidade. O assunto foi parar na Justiça, que, por enquanto, deu ganho de causa à prefeitura – e mesmo assim, os mototaxistas continuam em atividade.

Agência Brasil

Em entrevista concedida ao portal Migalhas em fevereiro passado, Antônio Clóvis Ferraz, doutor em Engenharia Civil e professor da Universidade de São Paulo (USP), opinou que é melhor regulamentar o serviço do que proibir. Ele apontou vantagens do mototáxi, como o fato de ser mais acessível para camadas mais pobres da população, além de outros fatores atrativos – como no caso de mulheres que voltam do trabalho à noite, que conseguem ficar na porta de casa com as motos e fugir da violência.

Já a Associação Paulista de Medicina (APM) se declarou contrária à regulamentação, devido ao risco elevado de acidentes. Movimentos sociais também defendem que esse tipo de alternativa de transporte só piora o problema da mobilidade urbana, que deve ser resolvido com transporte gratuito e de qualidade, e atende aos interesses das empresas de aplicativo, em um contexto de precarização do trabalho.

“Será que as companhias fariam toda essa campanha se fosse obrigatório por lei cobrir todas as corridas com seguro de vida, auxílio funerário, oferecendo plano de saúde aos motoristas? Será que essa campanha não é uma forma de lucrar com o sangue dos trabalhadores de moto, numa cidade com o trânsito tão caótico, em que os corpos no IML tem cor e profissão muito bem marcadas? Eles sabem que é muito fácil ser a favor de mototáxi quando o ônibus não chega no seu bairro direito e o mais próximo leva horas pra chegar na estação de metrô – custando caro, ainda por cima”, afirmou, em um vídeo divulgado nas redes sociais, a influenciadora digital e educadora popular Bebel Ecologia.

Precarização capixaba

No Espírito Santo, os serviços de mototáxi e transporte complementar não são regulamentados na Grande Vitória. De acordo com o Observatório de Segurança Pública do Espírito Santo, o número de vítimas fatais no trânsito cresceu 17,6% no Espírito Santo de 2023 (547) para 2024 (643). As motos respondem por 50,1% dessas vítimas, e houve um aumento de 21,5% nos óbitos de motociclistas no mesmo período. Cachoeiro ficou em sétimo lugar no ranking de mortos no trânsito entre as cidades capixabas – o número de óbitos no município subiu de 21 para 26 (24%).

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Leonardo Sá

Entretanto, diante da ausência de políticas que de fato promovam o acesso a transporte público de qualidade, a população se vê à mercê das alternativas colocadas. Em Cachoeiro, o valor da passagem de ônibus subiu de R$ 4,70 para R$ 5,10 em fevereiro – apesar do subsídio da prefeitura ao consórcio Novotrans, que já chegou a R$ 14,2 milhões em 8 anos.

Na Grande Vitória, a tarifa do Transcol aplicada de segunda a sábado subiu de R$ 4,70 para R$ 4,90, em janeiro deste ano. Na ocasião, movimentos sociais fizeram protesto em frente ao Departamento de Edificações e Rodovias do Espírito Santo (DER-ES), na Ilha de Santa Maria, em Vitória.

Em outubro passado, moradores dos bairros Campo Verde, Morada Bethânia e Tanque, em Viana, na região metropolitana do Estado, também realizaram um protesto contra uma redução na oferta de transporte coletivo para as comunidades.

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